sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Modelagem Cultural - Como seu pensamento, comportamento e identidade são manipulados diariamente



Modelagem Cultural é um conceito abrangente, tem a ver com Engenharia Social Política. Requer uma visão criteriosa para perceber seus mecanismos. Recomendo que leia esse texto com muita atenção, pois ele poderá te ajudar a esclarecer o motivo de alguns conflitos sociais e consequentemente pessoais.

Vamos pensar quais são as principais ferramentas utilizadas por aqueles que praticam a Modelagem Cultural e até que ponto isso pode afetar a nossa vida.

O que é Modelagem Cultural?

Modelagem Cultural é a influência direta ou indireta sobre o maior número possível de aspectos formadores de uma cultura, com a finalidade de criar, gradualmente, e de modo quase imperceptível, uma sociedade/cultura segundo os interesses de quem mais exerce essa influência.

A forma de pensamento, orientação científica, comportamentos, a produção artística, religiosidade, os princípios éticos, etc., são os elementos alvos desse processo.

Há uma diferença entre Modelagem Cultural e Engenharia Social Política. A Modelagem Cultural é voltada para às ruas, atuando no "inconsciente coletivo", apegando-se aos detalhes da vida cotidiana, alcançando a intimidade das pessoas. Não requer medidas políticas, jurídicas ou grandes intervenções para obter sucesso, basta a capacidade e objetivos de uma única pessoa de exercer influência para que a Modelagem Cultural tenha início.

A Engenharia Social Política, por outro lado, começa de cima, está no "topo da pirâmide". Faz uso mais específico da política e medidas jurídicas para alcançar suas metas. Alinhada com grandes organizações e políticos, ela oficializa o que é o resultado da Modelagem Cultural, fazendo com que as duas atuem simultaneamente. Em outras palavras, enquanto a Modelagem Cultural atua "no povo", a Engenharia Social Política atua "nos sistemas".

Quem está por trás da Modelagem Cultural?

A sociedade gira entorno de dois grandes aspectos que precisamos compreender, são eles:

01 – Consumo

Estabelecemos historicamente uma relação de troca entre os seres humanos, sendo a compreensão que temos desse processo a grande responsável pelo que definimos ser "civilização". Atribuímos às trocas o ideal de poder, onde "maior e melhor" é o que possui mais. Consequentemente, as relações humanas se baseiam na busca por esse "poder", traduzido num pedaço de papel ou mineral chamado dinheiro.

Enquanto em épocas primitivas a relação de troca visava a subsistência, com o passar do tempo o ser humano aprendeu que apropriando-se dos recursos, poderia "dominar" e obter regalias como resultado desse domínio. Instituiu-se então uma nova relação de troca, que não é mais para subsistência, mas principalmente para -- tentar -- suprir os anseios humanos, mediante os ideais de "conforto, prazer e valorização", surgindo assim as grandes diferenças sociais.

Sob esse aspecto, a Modelagem Cultural ocorre sempre que é necessário manter ou restabelecer a relação de poder dos que tem mais sobre os que tem menos. Se o poder consiste na "riqueza" e esta baseia-se na quantidade de recursos apropriados, logo, tira-se do menos forte a chance de ter garantida a sua subsistência, criando para ele a necessidade de comprá-la.

Mas, esse menos forte não quer apenas subsistir, porque ele vê no ideal de "poder" do mais forte a riqueza que um dia almeja conquistar (para também ser visto como "forte"), por isso acredita que quanto mais comprar, se apropriará dos recursos que lhe darão o status de poder, sustentando o ciclo de produção = consumo = exclusão/inclusão.

02 – Desejos

O ser humano possui anseios capazes de direcionar a sua conduta. Não age por instintos determinantes, mas pelo significado que atribui aos objetos e dá a ele motivação específica.

A Modelagem Cultural também ocorre sempre quando temos a intenção de favorecer os nossos desejos, 
precisando criar uma cultura onde eles venham a ser saciados. O "padrão de consumo" descrito acima é o resultado de um conjunto de desejos, construídos segundo os valores (significados atribuídos) que construímos com o passar do tempo. A normatização, bem como a rejeição de comportamentos e pensamentos são, também, recursos dos desejos, todos provenientes da Modelagem Cultural.

A política e as leis são criadas com base nos desejos de quem exerce maior influência. São exatamente esses "dominadores" que fazem uso da Modelagem Cultural para atingir seus objetivos.

Por exemplo: as religiões fazem Modelagem Cultural por meio do sentimento religioso humano, o qual pode ser compreendido como sendo o desejo de relacionar-se com Deus. Empresas criam e vendem seus produtos baseados nos desejos do consumidor. Adolf Hitler convenceu, por meio da modelagem cultural, exércitos e nações para atenderem seus desejos perversos. Estes são exemplos de como através dos desejos, pessoas e grupos podem fazer uso da Modelagem Cultural, tanto para o bem como para o mal.

Modelagem Cultural pode criar subculturas, bem como culturas que podem representar uma nação inteira. As grandes organizações empresariais, bancos, entidades de representação "popular" (ONGs) e grandes "pensadores" aliados à classe política, são os responsáveis pela modelagem. Eles utilizam, no entanto, ferramentas próximas do cidadão para conseguir influenciá-lo efetivamente (veremos elas adiante), num processo que tem início antes mesmo do sujeito nascer.

Para modelar é preciso eliminar!

Atualmente, com a Nova Ordem Mundial em curso, ditada pela Globalização, presenciamos uma descaracterização da identidade cultural dos povos para expansão de um modelo segundo às necessidades de desejo e consumo dos "mais fortes". Diferente do que alguns podem imaginar, não há uma valorização das diferenças humanas na intenção de preservá-las, mas sim de instrumentalizá-las culturalmente para fins de exploração econômica. Em outras palavras, a única diversidade realmente aceitável é a que não contraria os interesses de quem define a ordem.

Para o teórico cultural Stuart Hall, os recursos da pós-modernidade fez da globalização um processo de eliminação das identidades culturais. O que antes fora um acontecimento econômico, atualmente é inevitavelmente comportamental. Uma vez que economia diz respeito ao modo como o ser humano lida com o dinheiro, falamos então dos desejos, precisando intervir no sujeito desejante para que sua conduta se alinhe ao curso do que já não chama-se globalização, mas sim "globalitarismo", como descreve o geógrafo Milton Santos na obra "Por uma outra Globalização - do pensamento único à consciência universal"

As ferramentas da Modelagem Cultural 

Para fazer Modelagem Cultural primeiro é necessário "preparar o terreno", o que significa inserir, provocar ou criar nas "massas" (o povo) condições de aceitação da cultura que pretendem normatizar.

Essa condição é nada mais que a familiaridade e desejos construídos entorno do que propõe a nova cultura. O povo, uma vez "amassado" (preparado) pelos modeladores, fica pronto para receber as informações que vão influenciar poderosamente seus pensamentos e condutas. As ferramentas que preparam a massa são:

A) Oferta de Educação

Não se trata de ter ensino/educação, mas como? De qual tipo? Não tem a ver com a qualidade de infraestrutura, materiais e professores disponíveis apenas. Tem a ver com o CONTEÚDO repassado aos alunos, a capacitação dos profissionais, o tipo de orientação recebida por esses que deve ser repassada.

Diferente do que alguns imaginam, o(a) professor(a) 
não possui total liberdade para traduzir o conteúdo da disciplina que ensina. Ele é orientado a seguir as Diretrizes Curriculares que lhes são determinadas em acordo com os moldes propostos. Caso não obedeça o cronograma de ensino, poderá ser punido por não atender a demanda de ensino. A liberdade de interpretação, portanto, está restrita ao currículo escolar.

A priori, isso não é um problema se pensarmos do ponto de vista organizacional, a questão é: quem elabora as diretrizes?

A educação é a principal ferramenta de Modelagem Cultural, porque por ela podemos criar "pensadores funcionais" (pessoas que produzem não o que lhe é próprio da crítica, mas o que outros lhe fizeram absorver como sendo o "politicamente correto"), isto é: analfabetos do pensamento!

A luta de movimentos como o projeto Escola Sem Partido e de alguns setores para impedir que a discussão sobre "ideologia de gênero" seja inserida nas escolas, comprova essa realidade, devido ao fato de que temas relativos à sexualidade, política e moralidade familiar estarem sendo utilizados por alguns profissionais como forma de desconstruir normas e valores. A chamada "doutrinação", portanto, faz parte da Modelagem Cultural.

Outra evidência disso está no fato de que assim como as religiões doutrinaram a orientação escolar por séculos, sem que pudesse ser questionada, atualmente o Estado doutrina através da escola, das universidades, etc. Os que antes acreditavam cegamente terem sido criados por Deus, hoje acreditam cegamente terem evoluído do macaco! As mudanças ocorridas não foram em razão da crítica e do conhecimento, mas do interesse (conveniência) em substituir uma fé por outra no lugar de incentivar o verdadeiro pensamento crítico.

Não é por acaso que há muita divergência quando se pretende inserir nas Diretrizes de Ensino temas polêmicos, uma vez que a subjetividade desses temas requer pessoas capacitadas para tratá-los com imparcialidade (sim, a imparcialidade no ensino é plenamente possível quando o objetivo é estimular o pensamento crítico) e bom senso, algo bastante difícil.

b) Oferta de entretenimento

O ser humano é emotivo, por isso se "vicia" facilmente ao que lhe trás emoções intensas. A impressão de "positividade" nos faz esquecer (ou minimizar) alguns problemas e dificuldades que precisam ser solucionados.

Na Modelagem Cultural o entretenimento funciona como um anestésico, quase sempre enfatizado como ideal de lazer e cultura. Quanto mais barato e envolvente, melhor, pois assim alcança um número maior de pessoas sujeitas à entorpecer a sua percepção da realidade.

A razão do futebol ser mais popular que o golf, por exemplo, não é por ser melhor, necessariamente, mas porque envolve mais participantes e o custo ser menor do que a estrutura necessária para jogar golf. O show de uma banda de pagode pode ser mais acessível do que uma filarmônica, por isso envolve mais pessoas e é, por influência da maioria, mais atraente.

Em ambos os casos, tanto o futebol quanto a banda de pagode serão enfatizados como ideal de cultura e diversão. Seus maiores representantes serão elevados ao patamar de "gênios" e "deuses", modelos em que o povo deverá se espelhar, desejar e, claro, CONSUMIR (o que está associado à imagem deles)!  Quaisquer atividades de entretenimento que exijam maiores aprendizados, estimulando a crítica, reflexão ou mais individualizados, serão relegados ao esquecimento, pouca expressividade ou restritos apenas aos "círculos privilegiados". Eis o motivo pelo qual alguns dizem existir esporte de rico e esporte de pobre, cultura de rico e cultura de pobre.

O pensamento e comportamento humanos são diretamente afetados pela modelagem de entretenimento, pois ao se identificar com o ídolo, a massa absorve dele tudo o que representa, ou seja: pensamentos, costumes, preferências de modo geral. É nesse momento que entra a terceira grande ferramenta de modelagem cultural, a mídia:

c) Veículos de Comunicação

A mídia, especialmente a privada, se mantém devido ao patrocínio de grandes empresas. Estas, por sua vez, precisam vender não apenas seus produtos, como as ideias de consumo que fazem o cliente chegar ate eles. A mídia então cria cenários, personagens, literalmente "faz o ídolo" surgir às vezes de situações espúrias, apenas para servir de modelo para as massas.

Tal representação ocorre não apenas para fins econômicos, mas também ideológicos, movido por entidades, personalidades, que desejam imprimir na sociedade seu ideal de cultura.

No Brasil, talvez o maior veículo de Modelagem Cultural utilizado pela grande mídia sejam as novelas. As novelas não apenas copiam a realidade, mas traduzem segundo a percepção de autores que, por sua vez, são escolhidos pelos produtores com o objetivo de colocar na produção dramatúrgica os modelos que irão influenciar a sociedade.

A identificação com os personagens e suas experiências, vai dando ao telespectador a sensação de estar vivenciando o drama, inserido no mesmo contexto dos personagens, por isso é comum vermos pessoas citando exemplo das novelas para ilustrar determinadas situações da vida real.

Tanto as novelas como programas de auditório em especial, estão na frente do seu tempo. Ou seja, eles antecipam possíveis situações da vida real (situações que os modeladores desejam trazer para a realidade), na intenção de -- responder -- através dos personagens qual seria a melhor maneira de reagir. Assim os modeladores atingem dois objetivos:

1 - Influenciam a criação de novas tendências, sejam boas ou más;

2 - Influenciam a resposta que o público dará quando se deparar com a situação provocada pela tendência já criada.

Resultado: O até então telespectador, ao se deparar com às situações trazidas para a realidade, reagirá quase automaticamente conforme os exemplos que viu nas novelas, programas, entrevistas, filmes e até desenhos. Ele deixa de ser telespectador, para ser o principal personagem de um drama que agora toma conta da sua vida.

d) Ações Políticas

Depois que novas tendências são criadas, surge a necessidade de oficializá-las, reconhecê-las como tendo partido do público e, por isso, como sendo um desejo das massas e não dos modeladores. Nessa frente se encontram os representantes políticos das empresas, instituições religiosas, donos da mídia, ONGs, indústrias de modo geral. O povo, na prática, é representado sempre em segundo plano.

As conquistas alcançadas pela modelagem que dizem respeito ao pensamento e comportamentos, ao chegar no estágio político já possui representação organizada, defensores ávidos que emergiram do povo, não para defender a realidade do povo, mas para USAR esse povo como massa de manobra daqueles que atuam fora da política. Eles mesmos são frutos da modelagem, literalmente produzidos para serem militantes de causas que pensam serem naturalmente suas (porque um dia se identificaram com os personagens das novelas), quando na verdade não são.

A Modelagem Cultural evidenciada em laboratório

Alguns autores como Solomon Asch, Stanley Milgram e Muzafer Sharif, exemplificaram de modo reduzido, por volta das décadas de 30, 50 e 70, o que chamo de Modelagem Cultural. Um experimento realizado, por exemplo, pelo Psicólogo Stanley Milgram demonstra com precisão esse processo. Outro autor que aborda de forma semelhante o conceito de modelagem é Albert Bandura, porém, com ênfase na aprendizagem social cognitiva.

Milgram colocou numa sala fechada um voluntário, o qual foi solicitado olhar para um ponto de luz fixo na parede. Perguntado se o ponto de luz se movia, o voluntário respondia que NÃO. As perguntas se repetiram e todas as respostas foram NÃO.

Um segundo grupo de voluntários foi solicitado para entrar na sala, junto com o primeiro voluntário, a diferença é que este segundo grupo, composto por várias pessoas, foi orientado a dizer que o ponto fixo de luz na parede estava se movendo. Sem que o primeiro voluntário soubesse da armação, ao iniciar os testes o segundo grupo afirmava que SIM, o ponto de luz apesar de estar fixo na parede estava se movendo. Após algumas repetições, o primeiro voluntário que até então respondia NÃO, sob influência dos outros voluntários passou a dizer SIM.

Finalmente, o exemplo acima nos faz pensar que milhares de pessoas podem estar nesse momento dizendo SIM para diversos pensamentos, comportamentos e preferências, não por fazerem um julgamento correto da realidade, mas simplesmente porque estão sendo MODELADOS por outros sujeitos, por um contexto e amplo sistema de referências simbólicas.

Nossas concepções políticas, religiosas, comportamentais e até mesmo científicas, talvez sejam como pontos de luz fixos numa parede, movendo-se conforme o poder que os "mais fortes" exercem sobre nós. Por outro lado, temos sempre a chance de reavaliar conceitos. Utilizando a crítica podemos pensar e assim compreender melhor as impressões que temos da realidade. Esse texto é uma pequena demonstração disso que lhe serve de alerta.

Quando isso acontece emerge em nossa consciência a necessidade de falar, gritar para que todos ouçam: o ponto de luz na parede não se move, ele é FIXO! Mas, para que esse alerta não ecoe e o processo de modelagem seja interrompido, os "mais fortes" fazem o possível para silenciar isso que eles chamam de "perfil desviante" (Milgram), para que você continue, sempre, apenas uma pessoa comum se identificando com os personagens das novelas que eles criam.

Agora que você sabe como funciona a manipulação social em massa, ser modelado ou não pode ser escolha sua.


Will R. Filho
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Opinião Crítica

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