segunda-feira, 18 de maio de 2015

Homilética: Solenidade de Pentecostes - Ano B: “Envia teu Espírito, Senhor, e renova a face da terra”.



Celebramos hoje a festa do Pentecostes. Esta festa já existia no AT, mas tinha um sentido diferente daquele que hoje lhe damos. A palavra Pentecostes significa em grego quinquagésimo, isto é, 50 dias depois da festa da Páscoa. Os judeus chamavam-lhe, por isso, a Festa das Semanas, onde ofereciam a Deus as primeiras colheitas, como forma de agradecimento.

Mas nós, no Pentecostes, celebramos a descida do Espírito Santo cinquenta dias depois da ressurreição de Jesus. É o que nos relata a primeira leitura. Esta leitura narra o evento no dia em que os Apóstolos se encontravam reunidos em Jerusalém com Maria, Mãe de Jesus, em oração (cf. At 1, 14). De repente, ouviu-se um rumor semelhante a forte rajada de vento e apareceram uma espécie de línguas de fogo, que se iam dividindo e pousando sobre cada um deles. E todos ficaram cheios do Espírito Santo (cf. At 2, 1-5).

O Espírito Santo é fonte e força do amor mútuo. É também sinal de que estamos vivendo um novo tempo. Jesus culminou o caminho dele aqui na terra e foi glorificado por Deus Pai, mas não nos deixou sozinhos: deu-nos o mesmo Espírito que o ungiu e o animou na missão.

A missão do Espírito que nos foi dado nos leva à verdade completa, faz-nos entrar em comunhão com os seres humanos e com Deus. O Espírito é presença de Deus nos caminhos da história por meio da Igreja, que é movida por ele. Ao unir os seres humanos no amor, o Espírito nos dá a certeza do que será no final dos tempos, a comunhão plena no Reino de Deus. Por causa desse amor que nos põe em comunhão, há partilha dos bens, há oração sincera, há evangelização. Em função da comunhão, o Espírito nos faz falar e compreender todas as línguas, porque a língua universal é o amor e sem ele somos apenas “sinos que retinem” (1Cor 13,1). Por isso, crer no Espírito significa crer no futuro da vida, na renovação radical de toda a terra, no caminho do amor que supera as dificuldades deste mundo e nos dirige ao amor em plenitude.

COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

Leituras: At 2,1-11; 1Cor 12,3b-7.12-13; Jo 20,19-23

Celebramos hoje a grande festa de Pentecostes, que completa o Tempo de Páscoa, cinquenta dias depois do Domingo da Ressurreição. Esta Solenidade faz – nos recordar e reviver a efusão do Espírito Santo sobre os Apóstolos e os outros discípulos, reunidos em oração com a Virgem Maria no Cenáculo ( At 2, 1-11). Jesus, tendo ressuscitado e subido ao Céu, envia à Igreja o seu Espírito, para que cada cristão possa participar na sua mesma vida divina e tornar – se sua testemunha válida no mundo. O Espírito santo, irrompendo na História, derrota a sua aridez, abre os corações à esperança, estimula e favorece em nós a maturação na relação com Deus e com o próximo.

Pentecostes era uma das grandes festas judaicas; muitos israelitas iam nesses dias em peregrinação a Jerusalém, para adorar a Deus no Templo. A origem da festa remontava a uma antiquíssima celebração em que se davam graças a Deus pela safra do ano, em vésperas de ser colhida. Depois acrescentou-se a essa comemoração, que se celebrava cinquenta dias depois da Páscoa, a da promulgação da Lei dada por Deus no monte Sinai. Por desígnio divino, a colheita material que os judeus festejavam com tanto júbilo converteu-se, na Nova Aliança, numa festa de imensa alegria: a vinda do Espírito Santo com todos os seus dons e frutos.

Hoje é a plenitude do Mistério Pascal, com o Dom do Espírito Santo à Igreja. É o nascimento da Igreja.  Pentecostes é o cumprimento da promessa de Jesus: “… se Eu for, enviá-lo-ei” (Jo 16,7);

Na primeira leitura, os discípulos, em grande número, estavam reunidos, perseveravam em oração enquanto aguardavam a vinda de Cristo, a qual associavam com o fim dos tempos. Ali onde esperavam o julgamento divino sobre o mundo, tiveram a grata surpresa de participar de uma ação que era exatamente o contrário do que pensavam. De fato, os profetas haviam previsto um derramamento do Espírito no final dos tempos, e unido a isso aconteceria o julgamento das nações e grandes catástrofes da natureza (como está escrito em Joel 2,28-32, citado em At 2,17-21).

Reunidos em oração, estavam dispostos a enfrentar o julgamento de Deus sobre as nações e morrer num grande acontecimento cósmico que revelaria a glória de Cristo. Mas o que aconteceu com a efusão do Espírito foi a comunhão entre todos os povos e culturas, a comunicação eficaz entre as línguas diferentes. Num primeiro momento, podemos pensar que a experiência de comunhão dá-se em plano limitado, no interior da comunidade; no entanto a comunhão realizada em Pentecostes transborda as limitações religiosas e nacionais e se expande ao longo de toda a terra.

Muitas leituras atuais desse texto bíblico enfatizam a experiência com o dom de línguas. Até mesmo se denominam de pentecostais grupos e igrejas que fazem algum tipo de experiência atribuída ao Espírito Santo. Mas se lermos atentamente esse texto, veremos que se trata de um dom para a evangelização, para a missão, para a expansão da comunidade, e não para o crescimento pessoal com conotações de verticalidade na experiência espiritual. Nesse texto não se afirma que os membros da comunidade oraram em línguas (como é mencionado por Paulo com relação a uma prática da comunidade de Corinto). O texto diz que as pessoas falavam idiomas diferentes e todos se compreendiam; o oposto da narrativa sobre a torre de Babel. O enfoque no dom de línguas vem do termo “línguas estranhas”, que significa o mesmo que “línguas estrangeiras”. Além da possibilidade de evangelização do mundo inteiro, porque o Espírito Santo capacita a Igreja para proclamar o evangelho em todas as culturas e idiomas, vemos nesse texto a comunhão entre todos os seres humanos, a unidade na diversidade.

As línguas de fogo no dia de Pentecostes simbolizam a unidade da Igreja, ela falaria todas as línguas com a sua expansão; no entanto, essa que falaria todas as línguas encontra-se toda ali, unida. Essas línguas são de fogo. “O fogo simboliza a energia transformadora do Espírito Santo” (Cat. 696). Também ao Espírito Santo poderia aplicar-se o simbolismo da água, que significa “o nascimento e a fecundidade da vida dada no Espírito Santo” (Id.). Nós experimentamos a água e o fogo, ao mesmo tempo. Nascemos da água e do Espírito no nosso Batismo (cf. Jo 3,5), a partir daí o Espírito Santo começa uma ações muito especiais em nós que vai transformando-nos mais e mais. São Basílio fala-nos da importância de estar com o Espírito Santo, ou melhor, de que o Espírito Santo esteja em nós: “Por estarmos em comunhão com Ele, o Espírito Santo torna-nos espirituais, recoloca-nos no Paraíso, reconduz-nos ao Reino dos céus e à adoção filial, dá-nos a confiança de chamarmos Deus de Pai e de participarmos na graça de Cristo, de sermos chamados filhos da luz e de termos parte na vida eterna” (Liber de Sp. Sancto, 15,36, em Cat. 736).

O Espírito supera as velhas divisões entre os seres humanos. Ultrapassa as estruturas arcaicas da sociedade fundada em princípios de imposição dos mais favorecidos sobre os mais frágeis. A partir de Pentecostes, os seres humanos podem vincular-se por meio da graça de Deus, com base no dom do Espírito. A comunhão de todos os povos, que a partir de agora se realiza, é sinal e presença dos tempos escatológicos, meta da história humana que caminha para Cristo. A história humana, repleta de competições e de opressão de uns sobre os outros, realiza uma trajetória, marcada pelo Espírito do Cristo ressuscitado, para a comunhão plena de toda a humanidade num Reino de fraternidade e de paz.

O Espírito de Cristo une os seres humanos, a partir de Deus, em perdão e comunhão, por aquilo que são e não pelo que têm ou fazem (2ª leitura). Até então não tinha havido nenhuma comunhão real, mas concorrência e competição, busca de influência, enfim, divisão generalizada. Agora, e somente agora, a partir da unidade de Cristo que nos torna irmãos, filhos do mesmo Pai, começa a história da graça que une a todos no amor e na liberdade. Há distribuição de carismas, mas é o mesmo Espírito; diversidade de ministérios, mas é o mesmo Senhor; divisão de tarefas, mas é Deus que opera tudo em todos. O Espírito é um só e une todos os seres humanos numa comunidade que não se baseia na pura experiência interior, em ideias ou princípios gerais, mas na comunhão e na confiança mútua.

O Espírito congrega pessoas muito diferentes umas das outras que, em vez de fazer concorrência entre si, se servem mutuamente e são felizes em realizar isso no amor. Trata-se de uma comunhão realizada pelo próprio Deus, e não por meio de um cooperativismo à maneira de um sindicato ou clube que une pessoas pelas tradições, costumes sociais ou culturais. Como o corpo é um só e tem muitos membros, assim é Cristo. Porque todos nós fomos batizados num só Espírito, formando um só corpo.

A comunhão realizada pelo Espírito Santo não se apoia em tradições sagradas nem em laços que vinculam as pessoas por aspectos culturais, econômicos ou políticos. Os cristãos não formam uma nação, um estado. A comunidade cristã tampouco é uma associação cultural, um clube espiritual, uma ONG com fins delimitados. A comunidade cristã quer suscitar uma comunhão não governamental ou política, mas de vida entre todos os seres humanos, fundada no Cristo.

Os cristãos querem formar uma comunidade de amor universal, em gratuidade, a partir dos mais pobres e excluídos, abrindo-se a todos os povos da terra, sem empregar meios de poder político-militar ou qualquer tipo de imposição.

O texto do evangelho de hoje enfatiza desde o início o aspecto da comunhão: era o primeiro dia da semana, o dia do Senhor, e os discípulos estavam reunidos. As portas fechadas simbolizam o medo da hostilidade existente lá fora. São os inícios de uma Igreja que vive a fragilidade e as dúvidas, que necessita da presença do Senhor. Mas Cristo ressuscitado está com eles, sua presença se faz visível e ele coloca-se no centro, no meio deles.

“A paz esteja convosco!” é o início do diálogo por iniciativa do Ressuscitado. Os discípulos têm medo, e isso os deixa desconfiados. Mas Jesus os conforta com sua palavra e presença sensível, é o verdadeiro mestre que eles haviam seguido, possui as chagas que são os sinais gloriosos de sua vida terrena. Quem faz a experiência com o Ressuscitado sabe que ele não é uma fantasia.

Os discípulos estão reunidos como Igreja, e o Cristo lhes oferece o perdão e lhes envia em missão. Antes de tudo, a Igreja é a comunidade que recebe o perdão de Cristo e o distribui ao mundo. Evangelho e perdão não estão separados, pois a “boa notícia” que a Igreja dá ao mundo é que, em Jesus Cristo, o ser humano está perdoado por Deus, pois o Filho de Deus triunfou sobre a causa do pecado, a saber, o egoísmo.

A um mundo atormentado por injustiças, guerras e violências, Cristo oferece a paz fundadora e criadora que combate a raiz do pecado. A uma comunidade fechada por causa do medo, o Cristo estende a graça da vida dele, tornada princípio da missão universal. Jesus é a paz para aqueles que o recebem e para todos.

A Páscoa torna-se Pentecostes, pois o Ressuscitado sopra sobre seus discípulos dizendo: “Recebei o Espírito Santo” (v. 22). Um gesto que alude a uma nova criação, uma vez que, no princípio, Deus havia soprado sobre o ser humano, tornando-o ser vivente (cf. Gn 2,7). Agora o gesto de Jesus nos indica que o Cristo pascal leva ao ápice a criação que fora começada.

O Evangelho de João une Páscoa e Pentecostes em um mesmo mistério: a manifestação pascal de Cristo se torna efusão do Espírito do Ressuscitado sobre a totalidade da Igreja. A Páscoa significa que a morte de Jesus pela humanidade abre um caminho de amor e de transformação do mundo. E Pentecostes é o dom da Páscoa, é ter o mesmo Espírito de Jesus, é viver à luz do mesmo sopro vital que o animava. 

Não se pode conceber vida cristã nem Igreja sem a presença e a ação do Espírito Santo. Também o Espírito Santo constitui a nova comunidade do Povo de Deus, a Igreja.

Nela, todos devem estar unidos em Cristo e na força do Espírito Santo. As línguas de Pentecostes significam essa unidade do Povo de Deus. Pentecostes é, então, o reverso de Babel (cf. Gn 11,1-9); em Babel, a dispersão, aqui, a unidade. O Espírito Santo, que é o amor do Pai e do Filho, é também amor entre nós. Lembremo-nos que é sempre o amor que une os corações. O amor, por ser conhecido propriamente somente pelos que se amam, é sempre muito discreto. Daí a discrição do Espírito Santo: sua missão é levar a Palavra de Jesus, ajudar a Igreja para que anuncie destemidamente a Palavra da salvação, Jesus Cristo. Isso condiz com o Espírito Santo que é amor, já que o autêntico amor sempre pensa mais no outro que em si mesmo.

A Igreja precisa estar unida. Hoje terminamos a Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos; findamos a semana, não a oração pela unidade dos cristãos. Todos nós, discípulos de Cristo, precisamos – é importante para nós e para a evangelização – viver bem unidos: uma só fé, os mesmos sacramentos, um só governo: o do Papa e o dos Bispos em comunhão com ele. A divisão é vergonhosa para nós. “Celebrai, pois, este dia como membros do único corpo de Cristo. E não o celebrareis em vão, se realmente sois aquilo que celebrais, isto é, se estais perfeitamente incorporados naquela Igreja que o Senhor enche do Espírito Santo e faz crescer progressivamente através do mundo inteiro. (…) Esta é a casa de Deus, edificada com pedras vivas. Nela o Eterno Pai gosta de morar; nela seus olhos jamais devem ser ofendidos pelo triste espetáculo da divisão entre seus filhos” (Dos Sermões de um Autor africano anônimo do séc.VI).

Depois que Jesus completou a sua obra, constituído Senhor a partir de sua ressurreição, envia ao mundo o seu Espírito, o Espírito do Pai. Conforme São João (Cf. Jo 20,19-23), Jesus comunica o seu Espírito, o mesmo Espírito que Ele entregou ao Pai no dia da ressurreição. Para isso, sopra sobre eles, transmitindo-lhes a vida nova, a força, o Espírito Santo: “Recebei o Espírito Santo…” e o Dom do Perdão e da Reconciliação.

As línguas de fogo no dia de Pentecostes simbolizam a unidade da Igreja, ela falaria todas as línguas com a sua expansão; no entanto, essa que falaria todas as línguas encontra-se toda ali, unida. Essas línguas são de fogo. “O fogo simboliza a energia transformadora do Espírito Santo” (Cat. 696). Também ao Espírito Santo poderia aplicar-se o simbolismo da água, que significa “o nascimento e a fecundidade da vida dada no Espírito Santo” (Id.). Nós experimentamos a água e o fogo, ao mesmo tempo. Nascemos da água e do Espírito no nosso Batismo (cf. Jo 3,5), a partir daí o Espírito Santo começa uma ações muito especiais em nós que vai transformando-nos mais e mais. São Basílio fala-nos da importância de estar com o Espírito Santo, ou melhor, de que o Espírito Santo esteja em nós: “Por estarmos em comunhão com Ele, o Espírito Santo torna-nos espirituais, recoloca-nos no Paraíso, reconduz-nos ao Reino dos céus e à adoção filial, dá-nos a confiança de chamarmos Deus de Pai e de participarmos na graça de Cristo, de sermos chamados filhos da luz e de termos parte na vida eterna” (Liber de Sp. Sancto, 15,36, em Cat. 736).

O Espírito Santo nos conduz à vida de oração. A vida cristã requer um diálogo constante com Deus Uno e Trino, e é a essa intimidade que o Espírito Santo nos conduz. Acostumemo-nos a procurar o convívio com o Espírito Santo, que é quem nos há de santificar; a confiar nEle, a pedir a sua ajuda, a senti-lo perto de nós. Assim se irá dilatando o nosso pobre coração, teremos mais ânsias de amar a Deus e, por Ele, a todas as criaturas.

O Espírito Santo é alma da Igreja. Sem Ele, ao que se reduziria Ela? Sem dúvida, seria um grande movimento histórico, uma instituição social complexa e sólida, talvez uma espécie de agência humanitária. E na verdade é assim que a julgam quantos a consideram fora de uma perspectiva de fé. Na realidade, porém, na sua verdadeira natureza e também na sua mais autêntica presença histórica, a Igreja é incessantemente plasmada e orientada pelo Espírito do seu Senhor. É um Corpo vivo, cuja vitalidade é precisamente o fruto do invisível Espírito Divino.

Para chegarmos a um convívio mais íntimo com o Espírito Santo, aproximemo-nos da Virgem Maria, que soube secundar como ninguém as inspirações do Espírito Santo. “Perseveravam unânimes na oração, com algumas mulheres e com Maria, a Mãe de Jesus” (At 1,14).

Recolhida com Maria, como no seu nascer, a Igreja reza também hoje: Vem, Espírito Santo, enche os corações dos teus filhos e acende neles o fogo do teu amor!

Por isso, cantemos: Vem, vem, vem, vem Espírito Santo de Amor, vem a nós, traz à Igreja em novo vigor.

PARA REFLETIR

Caríssimos, estamos no sagrado Pentecostes. Freqüentemente, o sentido profundo da hodierna solenidade é passado por alto. Diz-se simplesmente: hoje o Espírito Santo desceu sobre os Apóstolos no Cenáculo e a Igreja iniciou sua missão pública. Eis: é tudo! E, no entanto, isso é dizer tão pouco! É muito mais rico e profundo o Mistério que hoje celebramos! Eis alguns dos seus principais aspectos:

Primeiramente, com esta Solenidade encerramos o Tempo Pascal, aqueles cinqüenta dias que a Igreja celebra como se fosse um só dia, santo e glorioso, o Dia da Ressurreição. Pois bem: é o Senhor ressuscitado, pleno do Espírito Santo que o Pai derramou sobre ele, que hoje nos doa o seu Espírito. Nunca esqueçamos: o dom do Espírito é o fruto excelente e principal da Páscoa de Cristo: é no Espírito que nossos pecados são perdoados, é no Espírito que o fruto da paixão e morte de Cristo nos é dado, é no Espírito que somos transfigurados à imagem de Cristo Jesus. Sem o Espírito, de nada valeria para nós tudo quando Jesus por nós disse e fez! Se hoje, na primeira leitura, o Espírito aparece agindo de modo tão vistoso e barulhento no Cenáculo de Jerusalém (como a tempestade, o terremoto e a erupção vulcânica descritos no Sinai – cf. Ex 19,3-20), é para que nós compreendamos que ele age em nós constantemente, discreto e suave, como a brisa que passou diante de Moisés e Elias, fazendo-os encontrar a Deus! Eis, portanto: o Espírito é dado pelo Cristo ressuscitado, que o soprou sobre a Igreja no próprio Dia da Ressurreição – como escutamos no Evangelho de hoje -, e continua a soprá-lo sobre nós, no sinal visível da água no sacramento do Batismo e do óleo, na santa Crisma. No Cenáculo, no dia mesmo da Páscoa, os Apóstolos foram batizados no Espírito e tornaram-se cristãos; do mesmo modo, no nosso Batismo, banhados pela água, símbolo do Espírito, nós também recebemos em nós o Espírito de Cristo e nos tornamos cristãos, templos do Santo Espírito, chamados a viver uma vida segundo o Espírito de Cristo. Por isso, o conselho de São Paulo: “Procedei segundo o Espírito e não satisfareis os desejos da carne”. O cristão, caríssimos, vivendo no Espírito desde o Batismo, já não vive mais segundo a carne, isto é, segundo a mentalidade deste mundo, segundo o pecado. Agora, ele é impulsionado pelo Espírito de Cristo, crescendo cada vez mais nos sentimentos do Senhor Jesus. Isto é a obra do Espírito, que nos vai cristificando, dando testemunho de Cristo em nós (cf. Jo 15,26), conduzindo cada um de nós e a Igreja inteira à plena verdade de Cristo (cf. Jo 16,13). Portanto, é somente porque somos sustentados pelo Espírito, que podemos crer com toda certeza que Jesus está vivo e é Senhor e que Deus, o Pai de Jesus, é também nosso Pai, porque nos deu o Espírito do Filho, que nos faz filhos (cf. Rm 8,16).

Foi este Espírito Santíssimo, que Jesus, glorificado pelo Pai, fez descer de modo portentoso em Pentecostes, a festa judaica da Lei. O Espírito de amor é a nova lei, a Lei do cristão, pois “O amor de Deus foi derramado em nossos corações pelo seu Espírito quen os foi dado”(Rm 5,5)! Observai, caríssimos, o sentido profundo daquele acontecimento, cinqüenta dias após a Páscoa, em Jerusalém! O Espírito encheu de coragem e vigor os apóstolos, de modo que eles abriram as portas e, ao lado de Pedro, o Chefe da Igreja, deram publicamente testemunho de Cristo. A Igreja abriu as portas para nunca mais fechar; falou por Pedro para nunca mais se calar! É, portanto, na força do Espírito, que a Mãe católica iniciou publicamente sua missão de levar o Evangelho a todos os povos. Mais ainda: vede como o Espírito atrai e reúne línguas e pessoas tão diversas. Estavam em Jerusalém judeus vindos de várias partes do Império romano, judeus que não falavam mais o hebraico nem conheciam o aramaico; e, no entanto, compreendiam o que os apóstolos falavam, como se fosse na sua própria língua! É o Espírito quem reúne o que está disperso, é o Espírito quem conserva a unidade, é o Espírito quem, na unidade, faz permanecer a rica diversidade das línguas, culturas e mentalidades, sempre para a glorificação do Senhor Jesus! É o Espírito quem embriaga de alegria, como um vinho bom, o vinho do Reino, o vinho novo de Caná da Galiléia, que tomou o lugar da velha água da Lei de Moisés! É o Espírito quem impele a Igreja para a missão, testemunhando Jesus pela proclamação da Palavra, pela celebração dos santos sacramentos e pelo testemunho santo da vida dos cristãos que, sustentados por este Santo Paráclito, são capazes de dar a vida por Jesus e com Jesus.

Eis, caríssimos, o sentido da Festa de hoje! É a solenidade que nos faz retomar a consciência do papel e da missão do Santo Espírito na vida da Igreja e na nossa vida. Sem o Espírito, a Igreja seria somente a Fundação Jesus de Nazaré, que recordaria alguém distante e ficado no passado. Sem o Espírito, a vida dos cristãos seria apenas um moralismo opressor, tentativa inútil de colocar em prática mandamentos exigentes que o Senhor nos deu. Sem o Espírito, a evangelização seria apenas uma propaganda, um exercício de marketing… Sem o Espírito, a nossa esperança seria em vão, porque o que nasce da carne é apenas carne, e nossa alma e nosso corpo jamais alcançariam a Deus, que é Espírito! Mas, caríssimos meus, no Espírito, tudo tem sentido, tudo se enche de profunda significação: com o Espírito, a Igreja é o Corpo vivo de Cristo, no qual os membros recebem a vida que vem da Cabeça, a seiva que vem do Tronco, que é Cristo; com o Espírito, Jesus está vivo entre nós e nós o recebemos de verdade em cada sacramento que celebramos; com o Espírito, os mandamentos podem ser cumpridos na alegria, porque o Espírito nos convence que eles são verdadeiros e libertadores e nos dá, no amor de Cristo, a força para tentar cumpri-los na generosa alegria; com o Espírito, a obra da evangelização é testemunho vivo do Senhor Jesus, dado com a convicção de quem experimentou Jesus; com o Espírito, já temos a garantia, o penhor da ressurreição, pois comungamos a Eucaristia, alimento espiritual, que nos dá a semente da vida eterna.

Que nos resta dizer? Só nos resta, admirados, suplicar: Vem, ó Santo Espírito! Enche o nosso coração, cristifica a nossa pobre existência mortal! És consolo que acalma, és hóspede da alma, és alívio dulcíssimo, és descanso no labor, refrigério no calor, és consolo na aflição! Ó Santo Espírito, lava nossa sujeira, refrigera nossa secura, cura nosso coração doente! Dobra nossa dureza, ilumina nossa treva, dá-nos o gosto pelas coisas de Deus e o aborrecimento pelo pecado; aquece nossa frieza! Tu, Espírito de Cristo, sê alento, força e vida divina, doce penhor do mundo que há de vir e que durará na eterna alegria do Pai e do Filho em vós, pelos séculos dos séculos. Amém.

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