terça-feira, 12 de maio de 2015

Homilética: Solenidade da Ascensão do Senhor - Ano B: “Suba o nosso coração ao céu!”.


Hoje celebramos o mistério conclusivo da vida de Jesus: sua Ascensão ao Céu. É a sua entrada oficial na glória que lhe correspondia como ressuscitado, depois das humilhações do Calvário; é a volta ao Pai anunciada por Si no dia de Páscoa; “ Vou subir para Meu e vosso Pai, Meu e vosso Deus” (Jo 20,17). E aos discípulos de Emaús: “Não tinha o Messias de sofrer essas coisas para entrar na sua glória?”(Lc 24,26). “Depois de falar com os discípulos, o Senhor Jesus foi elevado ao céu e sentou – se à direita de Deus. Então, os discípulos foram anunciar a Boa Nova por toda parte…” (Mc 16, 15 – 20).

O livro dos Atos dos Apóstolos narra que Jesus, depois da sua Ressurreição, apareceu aos discípulos durante quarenta dias e depois “elevou – se à vista deles” (At 1, 9). O significado deste último gesto de Cristo é duplo. Em primeiro lugar, “elevando – se”, Ele revela de modo inequívoco a sua divindade; volta para lá, de onde veio, isto é, para Deus, depois de ter cumprido a sua Missão na Terra. Além disso Cristo sobe ao Céu com a humanidade que assumiu e que ressuscitou dos mortos: aquela humanidade é a nossa, transfigurada, divinizada, que se tornou eterna. Portanto, a Ascensão revela a “altíssima vocação” (Gaudium et Spes, 22) de cada pessoa humana: ela está chamada à vida eterna no Reino de Deus, Reino de amor, de luz e de paz.

“Enquanto olhavam atentamente para o Céu à medida que Ele se afastava…” ( 1, 11). “Tal como os Apóstolos, ficamos meio tristes ao ver que Ele nos deixa. Na realidade, não é fácil acostumarmo-nos à ausência física de Jesus. Comove-me recordar que Jesus, num gesto magnífico de amor, foi-se embora e ficou; foi para o Céu e entrega-se a nós como alimento na Hóstia Santa (Eucaristia). Sentimos, no entanto, a falta da sua palavra humana, da sua forma de atuar, de olhar, de sorrir, de fazer o bem. Gostaríamos de voltar a vê-Lo de perto, quando se senta à beira do poço, cansado da dura caminhada (cf. Jo 4, 6), quando chora por Lázaro (Jo 11, 35), quando se recolhe em prolongada oração (Cf. Lc 6, 12), quando se compadece da multidão (Cf. Mt 15, 32; Mc 8, 2)”.

A vida de Jesus na terra não termina com a sua morte na Cruz, mas com a Ascensão aos céus. É o último mistério da vida do Senhor aqui na terra. É um mistério redentor, que constitui, com a Paixão, a Morte e a Ressurreição, o mistério pascal. Convinha que os que tinham visto Cristo morrer na Cruz, entre os insultos, desprezos e escárnios, fossem testemunhas da sua exaltação suprema. A Ascensão não nos rouba Jesus, não o impede estar presente entre nós, eficaz. Assim como ao descer à terra não deixou o Pai, também não abandona os discípulos ao subir ao Céu. “Eu estarei convosco”!

E eles “estavam com os olhos fixos no céu, para onde Jesus se afastava” ( At 1, 9 – 10). Estavam, portanto, fixando o céu, porque acompanhavam com o olhar Jesus Cristo, crucificado e ressuscitado, que era elevado ao Céu. Somos chamados, permanecendo na Terra, a fixar o Céu, a orientar a atenção, o pensamento e o coração para o Mistério inefável de Deus. Somos chamados a olhar na direção da realidade divina, para a qual o homem está orientado desde a criação. Ali está contido o sentido definitivo da nossa vida.

A Ascensão fortalece e estimula a nossa esperança de alcançarmos o Céu e incita-nos constantemente a levantar o coração a fim de procurarmos as coisas que são do alto. Agora a nossa esperança é muito grande, pois o próprio Cristo foi preparar-nos uma morada (cf. Jo 14,2).

O Senhor está já no Céu com o seu Corpo glorificado, com os sinais do seu Sacrifício redentor, com as marcas da Paixão que Tomé pôde contemplar e que clamam pela salvação de todos nós.

A Ascensão se nos apresenta, assim, não tanto como uma festa da partida de Jesus deste mundo quanto como a festa de sua permanência aqui na terra. Ele, com efeito, não deixou este nosso universo. “Não abandonou o céu quando de lá desceu até nós e nem se afastou de nós quando novamente subiu ao céu. Ele é exaltado acima dos céus: todavia, sofre aqui na terra todos os dissabores que nós, seus membros, suportamos. Disto deu testemunho gritando: Saulo, Saulo, por que me persegues?” (Santo Agostinho). Cristo está ainda presente e comprometido com este mundo com todo seu corpo que é a Igreja.

A esperança do Céu encherá de alegria o nosso peregrinar diário. Imitaremos os apóstolos que, segundo São Leão Magno, “tiraram tanto proveito da Ascensão do Senhor que tudo quanto antes lhes causava medo, depois se converteu em alegria. A partir daquele momento, elevaram toda a contemplação das suas almas à divindade que está à direita do Pai; a perda da visão do corpo do Senhor não foi obstáculo para que a inteligência, iluminada pela fé acreditasse que Cristo, mesmo descendo até nós, não se tinha afastado do Pai e, com a sua Ascensão, não se separou dos seus discípulos.”

O pensamento do Céu ajudar – nos- á a superar os momentos difíceis. É muito agradável a Deus que fomentemos esta esperança teologal, que está unida à e ao amor, e que em muitas ocasiões nos será especialmente necessária. “À hora da tentação, pensa no Amor que te espera no Céu. Fomenta a virtude da esperança, que não é falta de generosidade” (Caminho, 139).

A meditação sobre o Céu deve também estimular-nos a ser mais generosos na nossa luta diária “porque a esperança do prêmio conforta a alma para que empreenda boas obras” (São Cirilo de Jerusalém). O pensamento desse encontro definitivo de amor a que fomos chamados ajudar-nos-á a estar mais vigilantes nas nossas tarefas grandes e nas pequenas, realizando-as de um modo acabado, como se fossem as últimas antes de irmos para o Pai.

O pensamento do Céu, ao celebrarmos a festa da Ascensão, deve levar-nos a uma luta decidida e alegre por tirar os obstáculos que se interpõem entre nós e Cristo, deve estimular- nos a procurar sobretudo os bens que perduram e a não desejar a todo custo as consolações que acabam.

Jesus parte, mas permanece muito perto de cada um. Nós O encontramos na Eucaristia, no Sacrário de nossas Igrejas.

Visitemos mais Jesus no Sacrário, à nossa espera! Não deixemos de procurá-Lo com frequência, ainda que na maioria das vezes só possamos fazê-lo com o coração, para dizer-Lhe que nos ajude na tarefa apostólica, que conte conosco para estender a Sua doutrina por todos os ambientes.

Nessa semana, que precede a Solenidade de Pentecostes, fiquemos unidos em oração, como disse Jesus: “Permanecei na cidade até que sejais revestidos da força do alto” (Lc 24,48). Assim a vida da Igreja não começa com a ação, mas com a oração, junto com Maria, a Mãe de Jesus.

A festa de hoje nos fortalece a esperança pelo destino que nos aguarda, mas também nos lembra que a nossa missão hoje é continuar o projeto de Jesus, Não fiquemos de braços cruzados, parados, olhando para o Céu! É hora de olhar ao nosso redor e começar a Missão!

Hoje é um dia para desejar a vida eterna. Precisamos ter a santa ambição de alcançarmos a eternidade feliz. Que aumente em nós o desejo do céu! Tal desejo nos ajudará a trabalhar muito pela glória de Deus aqui nesta terra e, consequentemente, a construir, desde o posto que ocupamos nesta sociedade, a cidade dos homens que é também nossa. Apostolado! Um cristão sem zelo apostólico é um cristão estéril. Assim como não se pode entender que um peixe não possa nadar, a não ser que esteja morto, assim também não se pode entender que um cristão não seja apostólico, proselitista (no bom sentido da palavra), a não ser que esteja morto. Não podemos perder a audácia, o desejo de ganhar a todos para Cristo. No mesmo sermão citado anteriormente, São Leão Magno dizia que “a fé, aumentada pela ascensão do Senhor e fortalecida com o dom do Espírito Santo, não pode temer diante das cadeias, da prisão, do desterro, da fome, do fogo, das feras nem das torturas dos cruéis perseguidores. Homens e mulheres, crianças e frágeis donzelas lutaram em todo o mundo por essa fé até o derramamento do sangue. Esta fé afugenta os demônios, afasta as enfermidades, ressuscita os mortos”.
 COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

Leituras: At 1,1-11; Sl 46; Ef 1,17-23; Mc 16,15-20

Meus caros irmãos e irmãs, a liturgia deste domingo nos convida a contemplar o mistério da Ascensão do Senhor. Quarenta dias depois da Ressurreição, segundo o Livro dos Atos dos Apóstolos, Jesus subiu ao Céu, ou seja, voltou para o Pai, pelo qual tinha sido enviado ao mundo. A Ascensão do Senhor marca o cumprimento da salvação iniciada com a Encarnação. Depois de ter instruído pela última vez os seus discípulos, Jesus sobe ao Céu (cf. Mc 16,19). Contudo, Ele “não se separou da nossa condição”; com efeito, na sua humanidade, nos assumiu consigo na intimidade do Pai e, deste modo, revelou o destino final da nossa peregrinação terrena. Assim como por nós desceu do céu, e por nós padeceu e morreu na cruz, também ressuscitou por nós e subiu a Deus.

No Livro dos Atos dos Apóstolos, que temos como primeira leitura, Jesus se despede dos seus discípulos com estas palavras: “Ides receber uma força, a do Espírito Santo, que descerá sobre vós e sereis minhas testemunhas em Jerusalém, em toda a Judeia, na Samaria e até aos confins do mundo” (At 1,8). Em seguida, o autor sagrado acrescenta: “Depois de dizer isso, Jesus foi levado ao céu, à vista deles. Uma nuvem o encobriu, de forma que seus olhos não podiam mais vê-lo” (v. 9). É o mistério da Ascensão, que celebramos neste domingo solenemente.

Por que ficais parados olhando para o céu? O que o Cristo tinha de fazer aqui entre nós ele já fez. A partir de agora, cabe a nós desenvolver a nossa vida particular e coletiva, assimilando e vivendo os ensinamentos que Jesus nos transmitiu. A fé cristã implica responsabilidade. Cristo nos legou a boa-nova do Reino, agora cabe a cada um de nós, pessoalmente e em comunidade, responder a ele com nosso modo de viver. Não estamos abandonados, há uma promessa: o poder do Espírito que nos capacita a testemunhar até os confins do mundo.

A chamada de atenção feita pelos “homens vestidos de branco” significa que o verdadeiro seguimento de Jesus não envolve ficar parado olhando para o céu, esperando que Cristo faça a evangelização do mundo. A parte dele já foi feita, agora nos compete levar ao mundo inteiro, a toda criatura, a sua mensagem. Tornar o Reino de Deus algo real no nosso mundo.

O envio messiânico universal é a ata de fundação da Igreja. Jesus envia seus discípulos a todo o mundo conforme um programa, um esquema de universalidade que aparece em vários textos do terceiro evangelho e dos Atos dos Apóstolos: partindo de Jerusalém, passando pela Judeia e Samaria e chegando a todo o mundo, a todo cosmo, no idioma grego. Significa que a evangelização é um processo, um desenvolvimento que somente chegará ao seu término quando todos tiverem recebido a mensagem de Jesus.

A missão cristã se estende desde o princípio a todo o mundo, a todos os povos e culturas. Trata-se de um contexto universal; desaparecem as distinções entre os povos, já não há um povo único de Deus, mas todos os povos pertencem a Deus e com ele estabelecem aliança. A missão é para a humanidade, para o cosmo aberto à palavra dos missionários.

Dizer que Jesus “foi levado ao céu”, indica que ele não entra em um lugar, mas em uma nova dimensão. Ir para o céu, significa ir para Deus; estar no céu significa estar junto de Deus.  Ascensão de Cristo significa a tomada de posse do Filho do homem crucificado e ressuscitado na realeza de Deus sobre o mundo.

A Ascensão do Senhor ao céu significa que ele já não pertence ao mundo da corrupção e da morte que condicionam a nossa vida, e que ele pertence completamente a Deus.  Em quase todos os povos, o céu identifica-se com a morada da divindade. Também a Sagrada Escritura utiliza esta linguagem espacial: “Glória a Deus no alto do céu e paz na terra aos homens” (Lc 2,14). As palavras da oração “Pai nosso que estás nos céus”, mostram a morada de Deus, mas sabemos que ele está no céu, na terra e em todo lugar. Ele não se afastou de nós, mas agora, graças ao seu ser com o Pai, está próximo de cada um de nós, para sempre. Ir ao Pai significa não tanto deixar esta terra, porque ele também continua conosco, como havia prometido: “Eis que estou convosco todos os dias, até o fim do mundo” (Mt 28,20), por isto ele nos ouve em nossas orações e está sempre perto de nós.

A Ascensão nos diz que em Cristo a nossa humanidade é levada à altura de Deus; assim, todas as vezes que rezamos, a terra une-se ao Céu. E assim como o incenso queimado faz subir para o alto a sua fumaça, também quando elevamos ao Senhor a nossa oração confiante em Cristo, ela atravessa o céu e alcança o próprio Deus e é por ele ouvida e atendida.

Quando falamos que Deus está “nos céus” significa também que ele “vive em uma luz inacessível”; que o diferencia de nós. O céu, em sentido religioso, é mais um estado que um lugar. Deus está fora do espaço e do tempo e assim é seu paraíso.  Ao falarmos que Jesus “subiu ao céu”, lembramos também do Credo, onde professamos: “Subiu ao céu e está sentado à direita do Pai”. As palavras do anjo: “Galileus, o que fazeis olhando para o céu?” (At 1,11), contêm uma advertência: não devem ficar olhando para cima, ao céu, como para descobrir aonde vai estar Cristo, mas sim viver na espera de sua volta, prosseguir sua missão, levar seu Evangelho até os confins da terra.

Depois de ter suportado a humilhação da Sua paixão e morte, Jesus tomou o Seu lugar à direita de Deus e ao lado do Pai eterno.  Jesus foi ao Pai, pois ele mesmo já havia dito: “Vou para junto do Pai” (Jo 14,12); e depois volta a dizer: “Convém a vós que eu vá!  Porque, se eu não for; o Paráclito não virá a vós; mas se eu for, vo-lo enviarei” (Jo 16,7).

Jesus não subiu a um céu já existente, mas foi formar o céu, como disse certa vez: “Vou preparar-vos um lugar: Depois de ir e vos preparar um lugar, voltarei e tomar-vos-ei comigo, para que, onde eu estiver, também vós estejais comigo” (Jo 14,2-3).  O céu é, então, o corpo de Cristo ressuscitado com o qual irão reencontrar-se, integrar-se para formar um só Espírito com Ele, todos os remidos (cf. 1Cor 6,17).

No momento em que Jesus se separa dos Apóstolos, dá-lhes o mandato de O testemunharem em Jerusalém, em toda a Judeia e Samaria e até aos extremos confins da terra (cf. At 1,8) e de anunciarem a todos os povos “a conversão e o perdão dos pecados” (Lc 24,47).  Também no Evangelho ouvimos uma vez mais o mandato do Senhor: “Ide pelo mundo inteiro e anunciai a Boa Nova a toda a criatura” (Mc 16,15). Os discípulos foram enviados por toda a parte, dando testemunho por meio de sinais e prodígios, para que se acreditasse neles, pois narravam o que eles mesmos tinham visto.

A segunda leitura afirma que a Igreja é o Corpo de Cristo. O que isso significa? Jesus foi elevado ao âmbito do Pai e recebeu autoridade sobre todas as coisas. Os discípulos saíram pelo mundo proclamando o evangelho com a cooperação do Senhor, que confirmava a palavra com sinais. A ascensão e a ausência física de Cristo tornam possível novo tipo de presença na comunidade de seus discípulos: somente quando Cristo “se vai” é que a Igreja começa a sentir a força dele atuando por meio dela. A comunidade dos discípulos, quer dizer, a Igreja é a presentificação do Cristo ressuscitado. Cristo se corporifica no mundo mediante seus discípulos, ou seja, o modo pelo qual se pode ver Cristo evangelizando o mundo são os evangelizadores. A Igreja o torna visível para o mundo.

Da mesma forma que não há corpo vivo sem cabeça, assim também não há Igreja sem a ação de Cristo ressuscitado agindo no mundo por meio dela. Portanto, podemos dizer que Jesus está no céu à direita do Pai, mas, ao mesmo tempo, está presente, coatuando por meio dos fiéis.

Desde o dia da Ascensão, cada comunidade cristã progride no seu itinerário terreno rumo ao cumprimento das promessas messiânicas, alimentada pela Palavra de Deus  e pelo Corpo e Sangue do seu Senhor. Somos fracos e pecadores, e temos necessidade daquela profunda transformação de espírito, de mente e de vida que na Sagrada Escritura se chama precisamente “metánoia”, ou seja, conversão. E esta conversão ocorre a partir do momento em que temos coragem de mudar o rumo da nossa vida, passando a ser alimentada pela palavra de Deus e pelos sacramentos.

O evangelho de hoje enfatiza o mandato missionário recebido por todo cristão. Primeiramente, oferece um resumo das experiências que os discípulos tiveram com o Ressuscitado, seguido do mandato missionário no qual são elencados os elementos ou sinais principais da missão dos cristãos: expulsar demônios, falar todas as línguas, ser imune a qualquer veneno e curar os enfermos. Percebemos aqui que a missão dos cristãos possui os mesmos elementos ou sinais da missão de Jesus. Aparentemente, é uma missão impossível. É necessário compreender cada um desses elementos. Antes de tudo, trata-se de sinais e não de demonstrações (muito menos midiáticas), os quais têm por objetivo indicar que os missionários entraram em um campo novo de ação e para isso receberam uma autoridade originada no Pai, ao lado do qual está Jesus. Significa que é uma ação dos cristãos, mas não unicamente deles: é uma ação de Deus regenerando este mundo por intermédio da obra evangelizadora dos cristãos.

Expulsar os demônios em nome de Jesus significa, primeiramente, continuar a sua luta contra o mal, como foi enfatizado ao longo do Evangelho de Marcos. Não é tanto fazer exorcismos, mas instaurar um reino de justiça, fraternidade e paz em oposição ao mal, ao pecado e ao egoísmo. É continuar a luta de Jesus em cada circunstância da vida, enfatizando o poder do bem contra o mal, e não o contrário. Uma forma de exorcismo que cada um pode fazer é evitar desanimar por causa do aumento da violência e prestar mais atenção nas ações das pessoas de bem que fazem grandes mudanças na sociedade.

Falar novas línguas, no contexto narrativo dessa leitura, não significa a oração em línguas, pois se trata não de falar com Deus – não é um texto sobre oração –, mas do mandato missionário de falar às pessoas do mundo inteiro. Significa que os cristãos farão um esforço para não impor uma cultura ou modo de pensar, mas anunciarão o evangelho, a boa notícia de Jesus, levando em conta os destinatários, seu contexto histórico-social e cultural.

Serpentes e venenos que não causam nenhum mal não significam que o cristão é blindado para que nada de ruim lhe aconteça, como quer nos iludir a ideologia da prosperidade. Ao contrário, os cristãos estão sempre à mercê de muitos sofrimentos e perseguições, como aconteceu com Jesus e como vemos na vida dos santos. Bem entendidas, essas palavras de Jesus, em linguagem apocalíptica de luta contra o mal, significam que os verdadeiros cristãos estão imunes às serpentes e venenos do egoísmo que matam pela exclusão social, pelo preconceito e falta de aceitação do outro, pela calúnia, corrupção e desonestidade. É desse veneno maligno que os verdadeiros cristãos estão imunes e por ele jamais serão destruídos.

Imporão as mãos sobre os enfermos e eles ficarão curados. Essa expressão nos situa de novo no centro da atividade de Jesus – por onde ele andava, curava os enfermos. Os cristãos são, antes de tudo, crentes, isto é, pessoas unidas de tal forma a Jesus, que compartilham do seu poder de curar. Longe de pensar que isso se refere aos santos ou a uns poucos privilegiados, a cura das enfermidades é um sinal que acompanha todo aquele que crê. Não se trata tanto de um dom carismático, mas da cura dos corações marcados pelo egoísmo e pelas feridas do desamor. Todos nós podemos escolher entre ferir ou curar. E podemos pôr em prática essa palavra de Jesus por meio de nossas palavras e ações no compromisso com o outro.

Resumindo: num mundo perigoso (venenos e enfermidades), os cristãos deverão ser capazes de expandir a Palavra em toda língua, superando o poder do mal e ajudando os outros a viver (curas). Desse modo, o anúncio do evangelho se converterá em ação transformadora, sinal de que o mal cede lugar ao Reino que estará se expandindo na terra. 

PARA REFLETIR

Hoje, celebramos o mistério da Ascensão do Senhor. É mistério porque brota do coração de Deus, é mistério porque ultrapassa tudo quanto possamos imaginar, é mistério porque nos dá a vida eterna.

A hodierna Solenidade, caríssimos, é uma só com a do Dia de Páscoa: Aquele que admiramos ressuscitado em glória na Ressurreição, hoje, contemplamo-lo à Direita de Deus, com a mesma autoridade do Pai, e o proclamamos Cabeça da Igreja, Senhor sobre toda a criação, sobre toda a humanidade, Princípio e Fim da história humana e Juiz dos vivos e dos mortos. No Dia da Páscoa contemplamos o Cristo resplendente de Glória; na Festa de hoje, contemplamos o que essa glória significa para nós todos.

Eis, caríssimos no Senhor. Primeiramente, a Ascensão do Senhor nos faz compreender com o coração que o Cristo que por nós se fez homem, como um de nós viveu e por nós morreu, ele mesmo, agora, com a sua humanidade glorificada, está à Direita do Pai. Isto é admirável: um da nossa raça, o homem Jesus, participa agora do mesmo poder divino, acima de todas as criaturas. Que mistério: nele, a nossa humanidade está totalmente glorificada! Como dizia a oração inicial desta Santa Missa, “a Ascensão do Filho já é a nossa vitória” porque nós, enxertados nele, a ele unidos no Batismo e na Eucaristia, somos membros do seu Corpo, que é a Igreja; e sabemos: onde já está a nossa Cabeça, estaremos também nós um dia! Como diz a segunda leitura da Missa de hoje, chegaremos “todos juntos à unidade da fé e do conhecimento do filho de Deus, ao estado do homem perfeito e à estatura de Cristo em sua plenitude”. Vede, portanto, caríssimos, que destino a Festa deste hoje nos revela: chegar à estatura do Cristo em sua plenitude! Nada menos que isso pode saciar o coração humano; nada menos que isso pode nos contentar, pode nos dar paz! Olhemos para o Cristo glorioso à Direita do Pai e veremos a que somos chamados… Contemplai, pois o nosso destino! Pensai que miséria a do nosso mundo, que vive de bagatelas, empenha todo o seu afeto com futilidades e procura alegria e plenitude no que é efêmero! Tanto maior a grandeza que contemplamos em Cristo, mais deveria nos espantar a ilusão e alienação do mundo atual! Recordai, caros, a exortação do Apóstolo: “Esforçai-vos por alcançar as coisas do alto, onde está Cristo, sentado à Direita de Deus; aspirai Às coisas celestes e não às coisas terrestres. Quando Cristo, vossa vida, aparecer em seu triunfo, então vós aparecereis também com ele, revestidos de glória” (Cl 3,1-4).

Em segundo lugar, sentado como Senhor à Direita do Pai, Jesus é o Senhor do universo e de toda a história. Vede a criação, caríssimos! Pensai nas galáxias, recordai as estrelas, imaginai a riqueza de vida nas profundezas do mar, pensai ainda na sede de infinito do coração humano… De tudo isso Cristo é Senhor; tudo caminha para ele, ele é a Finalidade de tudo… também da história humana. Por mais que o homem pecador trame contra Cristo, por mais que o mundo hodierno volte suas costas ao Senhorio do Ressuscitado, tudo caminha para ele e ele triunfará ao fim de tudo – ele é o Alfa e o Ômega, o A e o Z, o Princípio e o Fim de todas as coisas!

Por tudo isso, ele é o Juiz de tudo quanto existe. Terá valido a pena, terá sentido, o que estiver sob o seu senhorio de paz, de amor, de vida, de justiça e de santidade. Tudo quanto não condisser com o seu reinado perecerá, passará, pois não servirá para mais nada a não ser para ser jogado fora e pisado pelos homens.

Mais ainda: o Senhor Jesus, hoje no mais alto dos céus, é Cabeça da Igreja. Aquele que é o Unigênito de Deus, pela sua ressurreição e pelo dom do seu Espírito, tornou-se o Primogênito de muitos irmãos, Cabeça do seu Corpo, que é a Igreja. Eis, meus irmãos: o Cristo pleno de glória que está nos céus, é nossa cabeça e dele continuamos recebendo a vida, que é o próprio Espírito Santo. Esta vida vem-nos sobretudo nos sacramentos, especialmente da Eucaristia, na qual recebemos o Cristo morto e ressuscitado, pleno do Santo Espírito, Senhor que dá a vida. Olhando para Aquele que está à Direita do Pai e é nossa Cabeça e Princípio, como não nos alegrar? Como não nos encher de esperança? Como não ter a certeza que nossa vida caminha para a Plenitude? Não estamos sozinhos, irmãos! A Igreja jamais estará sozinha – seu Senhor é o mesmo que está à direita do Pai; seu Esposo e Cabeça é o Rei da Glória!

Por fim, caríssimos, a Festa de hoje – que, de certo modo já nos prepara para o encerramento do Tempo da Páscoa, com o Santo Pentecostes, no próximo Domingo -, a Festa de hoje nos convida a colocar os pés nas estradas do mundo – na nossa família, no nosso trabalho, entre os nossos amigos, na vida social… pés nas estradas do mundo para proclamar o Senhorio de Cristo. Lembrai-vos hoje da sua promessa, lembrai-vos da sua missão: “Recebereis o poder do Espírito Santo que descerá sobre vós, para serdes minhas testemunhas até os confins da terra!” Coragem, pois, caríssimos! Se conhecermos Jesus de verdade, se o experimentarmos realmente na nossa vida, se crermos na sua glória e esperarmos com todo nosso coração participar dela, seremos, então, suas testemunhas e nossa convicção, nosso amor e nossa esperança invencível contagiarão a muitos.

Portanto, “homens da Galiléia, por que estais admirados, olhando para o céu? Este Jesus há de voltar, do mesmo modo que o vistes subir!” Façamos, pois, como nossos irmãos das origens que saíram e pregaram por toda parte. O Senhor os ajudava e confirmava sua palavra por meio dos sinais que a acompanhavam”. Que assim seja! Amém.

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