domingo, 15 de julho de 2018

Conceituando a “pobreza” nos evangelhos sinóticos


Nosso país é massivamente cristão, portanto deduzo que todo cristão deva ter sua Bíblia em casa. Sendo assim é importante saber algumas informações, por exemplo, a Bíblia foi escrita originalmente em três idiomas: Hebraico, Aramaico e Grego. Todo o Novo Testamento foi escrito em grego, então o ensinamento de Jesus fora escrito na língua helênica. Nos três primeiros livros do Novo Testamento (Mateus, Marcos e Lucas), Jesus fala em específico aos pobres, mas cada um especifica o “pobre” na qual Jesus está a se referir. Quanto ao evangelho de João, este tem outra linha teológica ao abordar a Boa Nova de Jesus porque usou outras fontes para ser escrito, então deve ser visto de maneira diferente dos três primeiros, logo não será abordado nesse texto.

O idioma grego classifica a pobreza em duas categorias distintas, são elas: os ‘penes’ e os ‘ptochós’. Penes são os que têm uma ocupação, atividade própria, o que consegue viver com o indispensável, trabalha no dia-a-dia a fim de ter algo para comer, ou seja, o necessário para subsistir. Ptochós são os mendigos, indigentes, logo é a palavra que simboliza a pobreza indigesta, indica miséria mesmo. Percebe-se assim que o idioma grego demonstra cuidado nos conceitos porque havia a preocupação em poder delimitar claramente a sociedade e seu modo de organização. Afinal, existe uma diferença considerável entre ambas as classes (penes e ptochós) e os escritores dos evangelhos (livros que falam da vida de Jesus na Bíblia) entendiam sobre isso.

O pobre no evangelho de Marcos (provavelmente o primeiro a ser escrito) é o ptochós aquele mendigo e indigente; em Mateus (que escreve para cristãos de origem judaica) seria a pobreza espiritual; em Lucas “os pobres” são os penes, ou seja, os que precisam trabalhar para sustentar-se.

Porém, quando a Bíblia foi traduzida para o Latim (este um idioma limitado em vocábulos e expressões) usou-se uma mesma palavra para designar essas classes que no idioma original são diferenciadas, e a palavra usada fora: pobre. Não esquecendo que o português, mesmo tendo uma variedade enorme de possibilidades, originou-se do latim. Então a tradução portuguesa da Bíblia manteve a mesma palavra (pobre) para determinar aquilo que nos evangelhos são situações diferentes em cada escrito.

Provavelmente, a Igreja do Oriente mantêm a distinção na sua tradução da Sagrada Escritura. Essa diferença faz com que a interpretação oriental provavelmente seja mais profunda que a dos ocidentais com língua de origem latina. Lembremos também que foram os “ocidentais latinos” que no século XX expuseram a preocupação com o pobre ao dizer que: a Igreja fez sua opção preferencial pelos pobres (através da polêmica Teologia da Libertação). Os pobres, por sua vez, estão fazendo a opção pela Igreja Universal do Reino de Deus.

Em uma sociedade como a nossa, onde ficam visíveis os sinais de um grande declínio do que antes pareciam serem “valores perenes”, tais como: o desprezo da população por suas próprias instituições (estado, escola, igreja); os baixos índices de natalidade; a diminuição constante de horas de trabalho; invasão do funcionalismo; degeneração das elites (não considero isso ruim) até mesmo a recusa masculina ao serviço militar. Vemos que isso indica certa destruição daquilo que se tinha de ideal para uma sociedade há alguns anos e não se pode mais dar um modelo “finalizado” de sociedade onde se possa crer que ali há vida perfeita, como havia antes. Dentro de um mundo pós-moderno (cheio de nuances e múltiplas referências) fica difícil impor um molde finalizado de sociedade como em décadas atrás e no âmbito pessoal o máximo que se pode ter como referência; creio eu, esteja em algum místico ou santo no caso do nosso país cheio de religiosidade (o que considero muito positivo) o exemplo por excelência é o de Jesus.

E voltando ao assunto do início, mas com essas informações adicionais ouso perguntar: Nos dias atuais, que pobres estão sendo “preferidos” e quais estão sendo “preteridos” dentro de nossas convicções? Que pobre eu sou? O que faço para minimizar essa realidade? Os que se dizem estudiosos da Bíblia devem saber a diferença do significado do vocábulo “pobre” em cada evangelho citado anteriormente. Sabendo a teoria já é um passo. Nossa sociedade abrange as três categorias de pobres mostradas aqui nesse texto, sem dúvida, é por isso considero importante suscitar essa linha de reflexão. Obrigado!


Francisco das Chagas Santiago Silvestre Junior
Licenciado em Filosofia pela UFG
Estudante de Teologia na PUC – Minas
Noviço da Congregação São Pedro Ad Vincula
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Diocese de Tianguá

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