sexta-feira, 23 de dezembro de 2016

A Sede Primacial do Brasil


Em 1841, quando Dom Pedro II seria coroado Imperador -  tempo em que a Igreja Católica era a religião oficial do país -, surgiu uma questão: que bispo deveria presidir a coroação? Para os cariocas, deveria ser o do Rio de Janeiro, já que ele era o Capelão-mor da Corte; para os baianos, deveria ser o de Salvador, pois nesta cidade se situava a primeira diocese e a primeira arquidiocese brasileira, denominada, em 1676, pelo Papa Inocêncio XI, "Metrópole da Igreja no Brasil". 

A coroação acabou sendo presidida por Dom Romualdo Antônio de Seixas, 16º Arcebispo de São Salvador da Bahia. Somente em 1870, contudo, a Santa Sé reconheceu o primado da Bahia, tendo-o ratificado em documento, duas décadas depois (em 1892). Ficou, contudo, uma dúvida: qual a extensão dessa prerrogativa e qual a natureza do título? O Cardeal Dom Augusto Álvaro da Silva levou essa questão à Sé Apostólica, mas não obteve resposta.

Pouco depois da primeira viagem apostólica do Papa S. João Paulo II a Salvador (06-07.07.1980), o Cardeal Dom Avelar Brandão Vilela, então responsável por esta Arquidiocese,  escreveu a Roma, renovando o desejo de ter um esclarecimento oficial da Igreja sobre esse tema. Três meses depois (25.10.1908), veio a resposta, sob a forma de um decreto. A Arquidiocese de São Salvador da Bahia passou a ser oficialmente reconhecida como "Sede Primacial" e seu Arcebispo, "Primaz". Curiosamente, esse Decreto, além da assinatura do Prefeito da Congregação para os Bispos, trazia a assinatura de Dom Lucas Moreira Neves, então Secretário dessa Congregação e que, sete anos depois, seria nomeado Arcebispo de Salvador.

O Decreto começa de forma solene: "Os Romanos Pontífices tiveram sempre a preocupação de que as Cidades, famosas pela dignidade, e os Varões, ilustres pelo zelo das almas e pela obediente reverência, fossem ornados com dignas honras e agraciados com merecidos privilégios. Isto não só constitui prêmio aos que o merecem, mas incita o Pastor, o clero e o povo a se empenharem em ter sempre melhores carismas."

Mais adiante, lê-se: "Todos sabem que a mencionada Igreja, erigida no ano de 1551, segundo os documentos históricos, até o ano de 1667 era a única diocese e, depois, até o ano de 1892, a única Sé Metropolitana no Brasil. Não se pode, pois, duvidar de que todas as circunscrições eclesiásticas agora existentes no território brasileiro procedem, como filhas da mesma mãe, da Igreja Catedral de São Salvador no Brasil.

Ponderando maduramente tudo isso, o Sumo Pontífice, pela Divina providência, Papa João Paulo II, (...) julgou que os pedidos que lhe foram dirigidos seriam muito úteis à salvação das almas e benignamente decidiu acolhê-los. 

Por isso, Sua Santidade, com a plenitude do poder Apostólico, com o presente Decreto da Sagrada Congregação para os Bispos, válido de agora em diante como se fosse uma Carta Apostólica sob lacre, decidiu honrar perpetuamente a Igreja Metropolitana de São Salvador no Brasil com o título, somente para honra, de Sede Primacial de todas as Igrejas de toda a Nação Brasileira, e o seu então Antístite, somente para honra, com o título de Primaz. Estando firmes e certas todas as condições que o cânon 271 do Código de Direito Canônico prescreve, de agora em diante é lícito que o Eminentíssimo Prelado Dom Avelar Brandão Vilela, Cardeal da Santa Igreja Romana, e seus legítimos sucessores, possam em toda parte fruir do título de Primaz da Nação Brasileira."

Além de chamar a atenção para o fato de que esses títulos não dão nem à Arquidiocese de São Salvador da Bahia nem a seus Arcebispos qualquer poder jurídico, lembro o que o próprio Decreto observa: por causa deles, maior é a necessidade de Pastor, clero e povo se esforçarem para serem fieis à sua missão na Igreja e no mundo.


Dom Murilo S.R. Krieger

Arcebispo de Salvador

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