segunda-feira, 13 de janeiro de 2020

Sheik iraniano pede que Muçulmanos reajam ao filme do Porta dos Fundos


Imagem dos personagens entre chamas e os dizeres em letras garrafais “Netflix e a maior blasfêmia do século”  iniciam o vídeo do Sheik iraniano Qodi sobre o especial de Natal, gravado pelo grupo humorístico brasileiro Porta dos Fundos.

O jornalista Leonardo Coutinho avalia o posicionamento do líder Muçulmano como “algo preocupante e potencialmente perigoso”. “Qomi ressalta que a violência não deve ser aplicada contra o Porta dos Fundos. Fala em ações ‘racionais’. Mas sugere como exemplo a fatwa (decreto religioso) que o aiatolá Khomeini contra  Salman Rushdie.

O caso aconteceu no final da década de 80 quando o escritor britânico  Rushdie recebeu a sentença de morte do aitolá devido ao livro “Versos Satânicos”. O escritor foi acusado de ridicularizar O Corão e Maomé. Por meio  deste decreto,  o imã pediu que “todos os muçulmanos zelosos” tentassem matar o autor do livro, extingui a  editora e “aqueles que conhecem o conteúdo” do romance, “de forma que ninguém possa insultar as santidades islâmicas”. Uma recompensa alta foi oferecida pela cabeça do escritor na ocasião.

O Sheik  explica no vídeo que no Irã, ofensas contra os profetas são classificadas  como blasfêmia, um  crime que prescreve penalidades como a fatha. Quomi relembra que após o episódio de Rushdie, ninguém mais se atreveu a escrever contra o profeta Maomé. O líder considerou esse fato de extrema violência como exemplo.

Qomi orienta que os muçulmanos reajam ao filme do Porta dos Fundos. “Amamos o santíssimo Jesus de todo coração. Amamos a ele, amamos à Santíssima Virgem Maria. Por isso não admitimos que alguém venha a faltar com respeito a essas pessoas tão importantes. Não permitimos que alguém insulte, blasfemem ou difamem estas pessoas santas”.

Coutinho descreve para seus seguidores quem é o iraniano em questão. “Minhas fontes explicam que Qomi é o sucessor de Rabbani no comando da expansão das operações ‘culturais e religiosas’ do Irã na América Latina”.  Mohsen Rabbani é pai da esposa de Qomi, que é acusado de ser o arquiteto dos atentados contra a sede da AMIA [ Associação Mutual Israelita Argentina], em 1994, com um saldo de 85 mortos.

O líder muçulmano fala no vídeo que é preciso uma reação inteligente, não violenta e não emocional. Também se deve evitar a indiferença, para não cair no perigo  “perder a sensibilidade da fé”. “Não vamos insultar, não vamos atacar, para que os protagonistas deste filme não se  sintam oprimidos e saiam como heróis. Não, não, isso, não”.

Qomi acredita que cristãos e muçulmanos devem se unir a partir do amor que têm a Jesus. O segundo passo segundo o líder é tomar medidas legais de acordo com as leis do país. O cancelamento da Netflix também foi orientado pelo líder como uma atitude concreta para os crentes.

Bento XVI anuncia novo livro sobre celibato e a crise na Igreja: “Eu não posso ficar em silêncio!”


O jornal francês Le Figaro publicou neste domingo uma série de trechos do novo livro do Papa emérito Bento XVI, incluindo uma forte defesa do papel do celibato na Igreja Católica. Escrito em conjunto com o cardeal conservador Robert Sarah, prefeito do dicastério de liturgia do Vaticano, a obra Des profondeurs de nos cœurs (“Das profundezas de nossos corações”, em português) abordará a atual “crise na Igreja”, fazendo uma defesa do sacerdócio católico e do celibato sacerdotal.

Bento 16, de acordo com os trechos, afirma que o sacerdócio e o celibato estão integralmente ligados. O ex-papa, de 92 anos, também afirma que, embora alguns padres se casassem no primeiro milênio do cristianismo ocidental, era esperado que aqueles com cônjuges observassem abstinência após a ordenação.

Sarah fala mais diretamente a Francisco, pedindo abertamente ao papa que não permita padres casados.

“Peço humildemente ao Papa Francisco que… vete qualquer enfraquecimento da lei do celibato sacerdotal, mesmo limitada a uma ou outra região”, escreve o cardeal.

Os 185 membros do Sínodo da Amazônia realizado de outubro consideraram a questão de padres casados supostamente sob a perspectiva das “necessidades pastorais” da região amazônica. Em seu documento final, os membros do Sínodo sugeriram, por uma votação de 128 a 41, que Francisco permitisse que os bispos da região ordenassem os diáconos atuais como padres, caso as circunstâncias o merecessem.

Em sua introdução conjunta ao livro, Bento XVI e o cardeal Sarah falam a uma só voz: “Como Agostinho, podemos dizer: ‘Não posso ficar em silêncio! Eu realmente sei como seria um silêncio, pernicioso para mim… É para Cristo que terei que prestar contas das ovelhas confiadas aos meus cuidados. Não consigo ficar quieto ou fingir ignorância.”

Defensores do Papa Francisco como Massimo Faggioli, historiador e teólogo da Universidade de Villanova, afirmaram que a decisão de Bento XVI de escrever sobre o assunto foi uma “violação grave” de sua promessa de silêncio. “Isso interfere com um processo sinodal que ainda está se desenrolando após o sínodo da Amazônia … e ameaça limitar a liberdade do único papa”, disse Faggioli.

Segue abaixo algumas das declarações do Papa Emérito Bento XVI e do cardeal Sarah no novo livro:

quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

STF derruba liminar que suspendia especial do Porta dos Fundos na Netflix


A suspensão imposta ao especial de Natal do Porta dos Fundos na Netflix, por força de uma liminar expedida pelo desembargador Benedicto Abicair, do Tribunal de Justiça (TJ) do Rio de Janeiro, não chegou a durar 24 horas. O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Dias Toffoli, acatou pedido da plataforma de streaming e liberou a veiculação da atração.

“Não se descuida da relevância do respeito à fé cristã (assim como de todas as demais crenças religiosa ou a ausência dela). Não é de se supor, contudo, que uma sátira humorística tenha o condão de abalar valores da fé cristã, cuja existência retrocede há mais de 2 (dois) mil anos, estando esculpida na crença da maioria dos cidadãos brasileiros”, argumenta Toffoli, em sua decisão.

O ministro também destacou “a plenitude do exercício de liberdade de expressão como decorrência imanente da dignidade da pessoa humana” como “meio de reafirmação/potencialização de outras liberdades constitucionais”.

Netflix diz que decisão do TJ do Rio é inconstitucional

A Netflix defendeu o conteúdo dizendo que uma decisão da Suprema Corte foi desrespeitada por instâncias inferiores. A companhia destacou que o STF deixou claro em outras ocasiões que quaisquer tipos de censura prévia e restrições de liberdade de expressão são inconstitucionais. Sua reclamação também destaca que o objetivo do serviço é “disponibilizar os mais diversos temas, assuntos e gêneros, para que os usuários livremente optem pelo que desejem assistir, concedendo-lhes total liberdade de escolha”.

Além disso a empresa lembrou que o vídeo possui classificação indicativa para maiores de 18 anos e “é indexado como sátira, comédia e humor ácido”. Por enquanto, a Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura, que moveu a ação junto ao TJ do Rio, não se manifestou a respeito. 

segunda-feira, 6 de janeiro de 2020

Em tuíte, papa invoca a paz: “Não se obtém a paz se não se espera por ela”



No final da oração do Angelus neste domingo, o Papa exortou a evitar “a sombra da inimizade”, referindo-se às tensões que estão atravessando várias regiões do mundo.O papa Francisco exprimiu ainda a sua preocupação com o que está ocorrendo em algumas partes do mundo com a crescente tensão que se teme possa levar a uma escalada da violência. No final da oração mariana do angelus deste domingo, o Pontífice recordou que a guerra traz destruição e que é necessário trabalhar para favorecer o diálogo entre as partes.

“Em tantas partes do mundo se sente um terrível ar de tensão. A guerra traz apenas morte e destruição. Convido todas as partes a manterem acesa a chama do diálogo e do autocontrole e a evitarem a sombra da inimizade. Rezemos em silêncio para que o Senhor nos dê esta graça”.

A situação entre os EUA e o Irã

A tensão entre os Estados Unidos e o Irã se elevaram depois do assassinato, nos dias passados, do general iraniano Qassem Soleimani, num ataque dos EUA em Bagdá. O Alto Representante da União Europeia para os Negócios Estrangeiros e a Política de Segurança, Josep Borrell, interveio no assunto, expressando “profunda preocupação com o aumento dos confrontos no Iraque” e exortando à moderação para evitar uma nova escalada de violência. Borrell convidou o ministro das Relações Exteriores iraniano Mohammad Javad Zarif para ir a Bruxelas.

Entretanto, continuam as acusações recíprocas entre Washington e Teerã. O Irã pede a evacuação das bases militares dos EUA na região, prometendo vingança se isso não ocorrer e afirmando que já identificou 35 alvos a serem atingidos. Não seriam descartados ataques no Estreito de Hormuz, através do qual passa cerca de 20% do tráfego mundial de petróleo por mar. A ameaça foi imediatamente levada a sério por Londres, que dispôs escolta militar para os navios com a bandeira britânica. Por sua vez, o presidente dos EUA, Trump, declarou que no caso de um ataque iraniano, os EUA estão prontos para a ação contra 52 locais importantes para a cultura iraniana, 52 como os reféns estadunidenses sequestrados por Teerã em 1979. No twitter, o ministro iraniano das Relações Exteriores, Zarif, escreveu que “atingir locais culturais seria um crime de guerra”.

O patriarca da Igreja católica caldeia, Louis Raphael Sako, neste contexto, fez um forte apelo: “Os iraquianos – disse -, ainda estão chocados com o que aconteceu na semana passada. Eles temem que o Iraque se torne um campo de batalha, em vez de ser uma nação soberana capaz de proteger seus cidadãos e suas riquezas. Em circunstâncias tão críticas e tensas, é sábio realizar um encontro em que todas as partes envolvidas se sentem em torno de uma mesa para um diálogo sensato e civilizado que poupará consequências inesperadas para o Iraque. Nós imploramos a Deus Todo-Poderoso – concluiu Sako -, que garanta ao Iraque e à região uma “vida normal, pacífica, estável e segura, à qual aspiramos”.

Bispo no Iraque: Todos têm medo de uma guerra


O Bispo Auxiliar de Bagdá (Iraque), Dom Shlemon Warduni, afirmou que "todos têm medo de que estamos indo ao encontro da guerra", em relação ao clima de tensão no país originado pela morte do general iraniano Qasem Soleimani em um ataque ordenado pelos Estados Unidos, em 2 de janeiro

“Esperamos no que os chefes de Estado possam fazer, porque o mundo inteiro está de cabeça para baixo: em vez de semear a paz, semeia-se o ódio”, disse o Prelado iraquiano a Vatican News, no sábado, 4 de janeiro.

"Todos têm medo de que estamos indo ao encontro da guerra e isso seria uma coisa terrível, porque a família iraquiana já está espalhada por todo o mundo: um filho neste país, um filho em outro país e assim por diante", destacou.

“Pedimos ao mundo inteiro que reze, que volte a Deus: isto é o mais importante, porque afastando-se de Deus, todo o mal possível é feito. Por isso, pedimos a todos vocês, pedimos que rezem pela paz”, continuou.

O Prelado também explicou que a situação atual no Iraque “é crítica, muito difícil, porque a nossa religião é a paz, mas o mundo de hoje quer apenas interesses pessoais, quer apenas ‘o material’, quer apenas ocupar aqui e ali”. "É uma coisa terrível e por isso os nossos iraquianos estão em grandes dificuldades, eles sofrem tanto", acrescentou.

Lembrando que o Papa sempre incentiva a oração pela paz, o Bispo iraquiano disse que "gritamos ao mundo inteiro para fazer a paz, para ajudar verdadeiramente a semear a paz, sem interesses pessoais".

Bispo sobre "Dois Papas": Desequilíbrio de personagens prejudica fatalmente o filme


Uma nova crítica ao filme "Dois Papas" foi feita nesta semana, desta vez pelo Bispo Auxiliar de Los Angeles, Dom Robert Barron, que assegura que há tanto "desequilíbrio" na representação dos protagonistas, que “prejudica fatalmente” o filme.

"The Two Popes" (Dois Papas), que estreou na Netflix em 2019, centra-se em encontros imaginários entre o Papa Bento XVI e o Cardeal Jorge Mario Bergoglio no período entre os conclaves de 2005 e 2013. No filme, Bento XVI é interpretado por Anthony Hopkins e o Cardeal Bergoglio, o futuro Papa Francisco, por Jonathan Pryce.

“O novo filme da Netflix, The Two Popes, deveria se chamar The One Pope (O único Papa), por direito, já que apresenta um retrato bastante matizado, texturizado e compreensivo de Jorge Mario Bergoglio (Papa Francisco) e uma caricatura completa de Joseph Ratzinger (Papa Bento XVI). Esse desequilíbrio prejudica fatalmente o filme, cujo objetivo, ao que parece, é mostrar que o velho Bento, mal humorado e legalista, encontra seu rumo espiritual através do ministério de Francisco amigável e progressivo”, escreveu Dom Barron em uma coluna de opinião intitulada “The One Pope”, publicada em 2 de janeiro no site ‘Word on Fire’.

O Prelado explica que, na forma como o filme é narrado, "viola as duas figuras e converte o que poderia ter sido um estudo de caráter extremamente interessante em uma apologia previsível e tediosa do cineasta sobre o catolicismo”.

domingo, 5 de janeiro de 2020

Palavra de Vida: “Trataram-nos com invulgar humanidade” (At 28, 2)



Duzentos e setenta e seis náufragos chegam à costa de uma ilha do Mediterrâneo, depois de duas semanas à deriva. Estão encharcados, esgotados, aterrorizados: experimentaram a impotência perante as forças da natureza e sentiram-se perto da morte.

Entre eles, está um prisioneiro com destino a Roma, para ser julgado pelo Imperador.

Sim, porque esta crônica não saiu de um noticiário da atualidade, mas é a narração de uma experiência do apóstolo Paulo, conduzido a Roma para coroar a sua missão de evangelização, através do testemunho do martírio.

Ele, sustentado pela sua fé inabalável na Providência, apesar da condição de prisioneiro, conseguiu dar alento aos outros companheiros de infortúnio, até desembarcarem numa praia de Malta.

Ali, os habitantes vêm ao encontro deles, acolhem-nos ao redor duma grande fogueira para restaurarem as forças e, depois, cuidam deles. Passados três meses, no final do inverno, dão-lhes o necessário para continuar a viagem em segurança.

“Trataram-nos com invulgar humanidade”

Paulo e os outros náufragos experimentam a humanidade calorosa e concreta daquela população que ainda não tinha sido tocada pela luz do Evangelho. É um acolhimento que não é apressado nem impessoal, mas que sabe pôr-se ao serviço do hóspede, sem preconceitos culturais, religiosos ou sociais. Para o fazer, é indispensável o envolvimento pessoal e de toda a comunidade.

A capacidade de acolher o outro faz parte do ADN de qualquer pessoa, como criatura que traz gravada em si a imagem do Pai misericordioso, mesmo quando a fé cristã não foi ainda acesa ou esmoreceu. É uma lei inscrita no coração humano, que a Palavra de Deus ilumina e valoriza, desde Abraão até à surpreendente revelação de Jesus: «Era estrangeiro e acolhestes-me».

O próprio Senhor oferece-nos a força da sua graça, para que a nossa vontade frágil chegue à plenitude do amor cristão.

Com esta experiência, Paulo ensina-nos também a confiar na intervenção providencial de Deus, a reconhecer e a apreciar o bem recebido através do amor concreto de tantos que se cruzam no nosso caminho.

quinta-feira, 2 de janeiro de 2020

Mensagem do Papa Francisco para o Dia Mundial da Paz 2020



MENSAGEM DO SANTO PADRE FRANCISCO
PARA A CELEBRAÇÃO DO DIA MUNDIAL DA PAZ

1º DE JANEIRO DE 2020

«A PAZ COMO CAMINHO DE ESPERANÇA:
DIÁLOGO, RECONCILIAÇÃO E CONVERSÃO ECOLÓGICA»

1. A paz, caminho de esperança face aos obstáculos e provações

A paz é um bem precioso, objeto da nossa esperança; por ela aspira toda a humanidade. Depor esperança na paz é um comportamento humano que alberga uma tal tensão existencial, que o momento presente, às vezes até custoso, «pode ser vivido e aceite, se levar a uma meta e se pudermos estar seguros dessa meta, se esta meta for tão grande que justifique a canseira do caminho»[1]. Assim, a esperança é a virtude que nos coloca a caminho, dá asas para continuar, mesmo quando os obstáculos parecem intransponíveis.

A nossa comunidade humana traz, na memória e na carne, os sinais das guerras e conflitos que têm vindo a suceder-se, com crescente capacidade destruidora, afetando especialmente os mais pobres e frágeis. Há nações inteiras que não conseguem libertar-se das cadeias de exploração e corrupção que alimentam ódios e violências. A muitos homens e mulheres, crianças e idosos, ainda hoje se nega a dignidade, a integridade física, a liberdade – incluindo a liberdade religiosa –, a solidariedade comunitária, a esperança no futuro. Inúmeras vítimas inocentes carregam sobre si o tormento da humilhação e da exclusão, do luto e da injustiça, se não mesmo os traumas resultantes da opressão sistemática contra o seu povo e os seus entes queridos.

As terríveis provações dos conflitos civis e dos conflitos internacionais, agravadas muitas vezes por violências desalmadas, marcam prolongadamente o corpo e a alma da humanidade. Na realidade, toda a guerra se revela um fratricídio que destrói o próprio projeto de fraternidade, inscrito na vocação da família humana.

Sabemos que, muitas vezes, a guerra começa pelo facto de não se suportar a diversidade do outro, que fomenta o desejo de posse e a vontade de domínio. Nasce, no coração do homem, a partir do egoísmo e do orgulho, do ódio que induz a destruir, a dar uma imagem negativa do outro, a excluí-lo e cancelá-lo. A guerra nutre-se com a perversão das relações, com as ambições hegemónicas, os abusos de poder, com o medo do outro e a diferença vista como obstáculo; e simultaneamente alimenta tudo isso.

Como fiz notar durante a recente viagem ao Japão, é paradoxal que «o nosso mundo viva a dicotomia perversa de querer defender e garantir a estabilidade e a paz com base numa falsa segurança sustentada por uma mentalidade de medo e desconfiança, que acaba por envenenar as relações entre os povos e impedir a possibilidade de qualquer diálogo. A paz e a estabilidade internacional são incompatíveis com qualquer tentativa de as construir sobre o medo de mútua destruição ou sobre uma ameaça de aniquilação total. São possíveis só a partir duma ética global de solidariedade e cooperação ao serviço dum futuro modelado pela interdependência e a corresponsabilidade na família humana inteira de hoje e de amanhã»[2].

Toda a situação de ameaça alimenta a desconfiança e a retirada para dentro da própria condição. Desconfiança e medo aumentam a fragilidade das relações e o risco de violência, num círculo vicioso que nunca poderá levar a uma relação de paz. Neste sentido, a própria dissuasão nuclear só pode criar uma segurança ilusória.

Por isso, não podemos pretender manter a estabilidade no mundo através do medo da aniquilação, num equilíbrio muito instável, pendente sobre o abismo nuclear e fechado dentro dos muros da indiferença, onde se tomam decisões socioeconômicas que abrem a estrada para os dramas do descarte do homem e da criação, em vez de nos guardarmos uns aos outros[3]. Então como construir um caminho de paz e mútuo reconhecimento? Como romper a lógica morbosa da ameaça e do medo? Como quebrar a dinâmica de desconfiança atualmente prevalecente?

Devemos procurar uma fraternidade real, baseada na origem comum de Deus e vivida no diálogo e na confiança mútua. O desejo de paz está profundamente inscrito no coração do homem e não devemos resignar-nos com nada de menos.