terça-feira, 29 de setembro de 2015

Homilética: 27º Domingo Comum - Ano B: "O que Deus uniu".


As leituras bíblicas deste domingo levam à reflexão sobre o tema da família. No Antigo Testamento, em Gn 2,18-24, lê-se que Deus faz desfilar perante o homem “todos os animais dos campos e todas as aves do céu”, para que desse o nome a cada um deles e visse se entre eles encontrava “uma auxiliar semelhante a ele.” Adão põe o nome a cada um dos animais, mas nenhum deles satisfaz a sua necessidade de companhia e amor.

Então diz o Senhor Deus: “Não é bom que o homem esteja só. Vou dar-lhe uma auxiliar semelhante a ele.” E Deus cria a mulher e quando esta é apresentada ao homem, este prorrompe numa exclamação de alegria, reconhecendo nela a companheira ideal: “Desta vez, sim, é osso dos meus ossos e carne da minha carne!” O texto termina por afirmar: “Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne.” A indissolubilidade do matrimônio encontra nestas palavras o seu fundamento, a sua razão de ser profunda e sagrada.

O Evangelho (Mc 10, 2-16) apresenta os fariseus que se aproximam de Jesus para tentá-Lo, para fazê-Lo entrar em conflito com a Lei de Moisés. Perguntam a Jesus se era lícito ao marido repudiar a sua mulher. Jesus retoma o texto de Gn 2 (citado acima) e declara que o casamento é indissolúvel; isto desde a origem, conforme fora instituído por Deus, no princípio da criação.

Diz Jesus: Quem repudia sua mulher e se casa com outra comete adultério contra a primeira (Mc 10,11). Não há porque duvidar: Jesus, com essas palavras, exclui precisamente aquilo que nós chamamos de divórcio.

O divórcio! Não falar disso, neste caso, somente porque o assunto se tornou melindroso, seria fugir do Evangelho. Terríveis são os males do divórcio jurídico: mulheres condenadas à solidão, filhos destruídos psicologicamente pela escolha penosa que devem fazer entre a própria mãe e o próprio pai. Conheço crianças nesta situação; depois que vi seus olhos, não preciso ouvir mais conferências sobre os males do divórcio: os vi todos estampados naqueles olhos de passarinho ferido.

“O homem não separe” significa sim: a lei humana não separe; mas significa também, e antes de tudo: o marido não separe a mulher de si; a mulher não separe de si o marido.

Jesus lembra a unidade: “… e os dois formarão uma só carne.” (Mc. 10,8), isto é, quase uma só pessoa, com a concórdia nos mesmos projetos e sentimentos; implicitamente inculca a construir sobre a unidade e renová-la cada dia. Como? Procurando resolver logo que surgem os problemas, as incompreensões, as friezas. Depois a confiança recíproca; esta é como um lubrificante; falar, comunicar as próprias dificuldades e também tentações. Enquanto há confiança recíproca, o divórcio fica longe.

Devemos nos convencer de que tudo isto não basta e que são necessários os meios espirituais: sacrifício e oração. Se o matrimônio encontra tanta dificuldade de se manter unido, é porque enfraqueceu o espírito de sacrifício e se quer só receber do outro antes de dar ao outro.

A dignidade do matrimônio e a sua estabilidade é um dos temas que mais importa defender e fazer com que muitos compreendam. Pois, a saúde moral dos povos está ligada ao bom estado do matrimônio. Quando este se corrompe, podemos afirmar que a sociedade está doente, gravemente doente. Por isso, todos temos que rezar e velar pelas famílias com tanta urgência!

Os que se casam iniciam juntos uma vida nova que devem percorrer na companhia de Deus. É o próprio Senhor que os chama para que cheguem a Ele por esse caminho, pois o matrimônio é uma autêntica vocação sobrenatural. Sacramento grande em Cristo e na Igreja (Ef. 5,32), diz São Paulo; sinal sagrado que santifica, ação de Jesus que se apossa da alma dos que se casam e os convida a segui-Lo, transformando toda a vida matrimonial num caminhar divino sobre a terra.

Não esqueçamos que a primeira coisa que o Messias quis santificar foi um lar. O primeiro milagre que Jesus fez foi no Casamento, em Caná da Galiléia (Jo 2, 1-11). E que é precisamente nas famílias alegres, generosas, cristãmente sóbrias, que nascem as vocações para a entrega plena a Deus na virgindade ou no celibato. Todas elas representam um dom que Deus concede muitas vezes aos pais que rezam pelos filhos de todo o coração e com constância.

Que as famílias possam manter-se fiéis à sua vocação em cada época da vida, “na alegria e no sofrimento, na saúde e na doença”, como prometeram no rito sacramental. Conscientes da graça recebida, possam os cônjuges cristãos construir uma família aberta à vida e capaz de enfrentar unida os numerosos e complexos desafios deste nosso tempo. Hoje, há particularmente necessidade do seu testemunho. Há necessidade de famílias que não se deixem arrastar pelas modernas correntes culturais inspiradas no hedonismo e no relativismo, e estejam prontas a realizar com generosa dedicação a sua missão na Igreja e na sociedade

A família, tal como Deus a quis, é o lugar idôneo para tornar-se, com o amor e o bom exemplo dos pais, dos irmãos e dos outros membros do círculo familiar, uma verdadeira escola de virtudes em que os filhos se formem para serem bons cidadãos e bons filhos de Deus. É no meio da família firmemente voltada para Deus que cada um pode encontrar a sua própria vocação, aquela a que Deus o chama.

Numa época, em que muitos procuram destruir ou desfigurar a família, é urgente proclamar o Plano de Deus sobre o Matrimônio e a Família. Não é uma norma da Igreja, é Plano de Deus, reafirmado por Cristo.

A Missão dos pais é repetir o gesto das mães israelitas: levar seus filhos a Jesus, para que, abençoados por Ele e crescendo na sua escola, conservem a inocência e sejam um dia recebidos no reino dos Céus, preparado para eles. A família é insubstituível para a serenidade pessoal e para a educação dos filhos.

A família é um dos tesouros mais importantes dos povos, é patrimônio da humanidade inteira. “O futuro da humanidade passa pela família” (São João Paulo II).

A melhor oração, é aquela feita juntos, marido e mulher. Rezemos pelos casais e para aqueles que estão se encaminhando ao matrimônio; que o Senhor afaste deles o divórcio do coração e o divórcio jurídico. Sobre todas as famílias, especialmente sobre as que estão em dificuldade, invoquemos a proteção materna de Nossa Senhora e do se esposo São José. Maria, Rainha da família, rogai por nós.

COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

Leituras: Gn 2,18-24; Hb 2,9-11; Mc 10,2-16

As leituras bíblicas, que compõem a Liturgia da Palavra deste domingo, nos apresentam o projeto de Deus para o homem e para a mulher, e sinalizam o tema do matrimônio presente no Evangelho e na primeira leitura. A mensagem da Palavra de Deus pode ser resumida na expressão contida no livro do Gênesis e retomada pelo próprio Jesus no Evangelho: “Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne” (Gn 2,24, Mc 10,7-8), cujo objetivo é formar uma comunidade de amor, estável e indissolúvel.

Lançando um olhar inicial para a primeira leitura, observa-se que Deus colocou o homem no Jardim do Éden, um ambiente de felicidade material, onde todas as exigências da vida humana se compunham. Contudo, o homem não estava plenamente realizado, pois lhe faltava alguém com quem pudesse compartilhar a sua vida.  E ao constatar a solidão do homem, Deus quis encontrar para ele uma companhia adequada e apresentou diante dele “todos os animais do campo e todas as aves do céu”, a fim de que os chamasse pelos seus respectivos nomes (v. 19). O fato de “dar um nome” indica um ato de domínio e de posse. O fato de Deus ter conduzido os animais para que o homem lhes desse um nome era, na perspectiva do texto bíblico, o reconhecimento por parte de Deus da autonomia do homem e a sua associação à obra criadora do Senhor Deus.  No entanto, o homem não encontrou, nesse mundo animal que Deus lhe confiou, “uma auxiliar semelhante a ele” (v. 20), Diante disso, Deus reconhece que “não é bom que o homem esteja só” (Gn 2, 18).

A nova ação de Deus começa com um “sono profundo” do homem. Depois, Deus tirou uma de suas costelas para criar a mulher.  Em seguida o Senhor Deus a conduz ao homem. O homem, ao despertar do “sono profundo”, acolhe a mulher com uma expressão de alegria e a reconhece como a companhia que lhe faltava, o seu complemento, o seu outro eu: “Esta é realmente osso dos meus ossos e carne da minha carne” (v. 23). O homem (v. 23) dá à sua companheira o nome de “mulher” (em hebraico: ‘ishah) porque foi tirada do homem (em hebraico: ‘ish). A proximidade das duas palavras sugere a proximidade entre o homem e a mulher, a sua igualdade fundamental em dignidade, a sua complementaridade, o seu parentesco.  E o texto termina com uma frase que diz: “Por isso, o homem deixará seu pai e sua mãe para se unir à sua esposa, e os dois serão uma só carne” (v. 24).

Pode-se observar que Deus criou o homem e a mulher para ser auxílio mútuo e para partilhar a vida no amor. É no amor e não na solidão que o homem encontra o sentido para a sua existência. O Homem e a mulher são iguais em dignidade. Eles são “da mesma carne”, em igualdade de ser participantes do mesmo destino; completam-se um ao outro e, na perspectiva de uma ajuda mútua, chegam à plena realização. São, portanto, iguais em dignidade. Esta realidade exige que homem e mulher se respeitem um ao outro.

E o texto do evangelho nos apresenta mais um ensinamento de Jesus, desta vez respondendo a uma pergunta dos fariseus sobre o matrimônio e o divórcio.  Os fariseus eram os fanáticos observantes da lei e, a Lei de Israel permitia o divórcio (cf. Dt 24,1); mas não era totalmente clara acerca das razões que poderiam fundamentar a rejeição da mulher pelo marido.  A mulher, por sua vez, era autorizada a obter o divórcio em tribunal somente no caso de o marido estar afetado pela lepra ou exercer um ofício repugnante. É nesta discussão de contornos pouco claros que os fariseus procuram envolver Jesus. A pergunta dos fariseus insere-se, provavelmente, na tentativa de encontrar razões para eliminar Jesus.

Diante da questão posta pelos fariseus “pode um homem repudiar a sua mulher?” (v. 2), Jesus começa por recordar-lhes o estado da questão na perspectiva da Lei: “O que vos ordenou Moisés?” (v. 3). Não significa que Jesus está se identificando com o posicionamento da Lei a propósito da questão do divórcio. Efetivamente, a Lei de Moisés permitia o divórcio, contudo, essa condescendência da Lei não resulta do projeto de Deus para o homem e para a mulher, mas é o resultado da “dureza do coração” dos homens. Em contraste com a permissividade da Lei, Jesus vai apresentar o projeto primordial de Deus para o amor do homem e da mulher. Citando livremente Gn 1,27 e Gn 2,24, Jesus explica que, no projeto original de Deus, o homem e a mulher foram criados um para o outro, para se completarem, para se ajudarem, para se amarem. Unidos pelo amor, o homem e a mulher formarão “uma só carne”. A separação será sempre o fracasso do amor; não está prevista no projeto ideal de Deus. Só o amor eterno, expresso num compromisso indissolúvel, respeita o projeto primordial de Deus para o homem e para a mulher.

Jesus reitera que a relação entre o homem e a mulher deve se enquadrar no projeto inicial de Deus. A perspectiva de Deus é que marido e mulher, unidos pelo amor, formem uma comunidade de vida estável e indissolúvel. Ambos, em igualdade de circunstâncias, são responsáveis pela edificação da comunidade familiar.

A Sagrada Escritura começa pela criação do homem e da mulher, à imagem e semelhança de Deus, e termina com a visão das “núpcias do Cordeiro” (Ap 19,9). Do princípio ao fim, a Escritura fala do matrimônio e do seu “mistério”, da sua instituição e do sentido que Deus lhe deu, da sua origem e da sua finalidade, das suas diversas realizações ao longo da história da salvação, das suas dificuldades nascidas do pecado e da sua renovação “no Senhor” (1Cor 7,39), na Nova Aliança de Cristo e da Igreja.

A vocação para o matrimônio está inscrita na própria natureza do homem e da mulher, tais como saíram das mãos do Criador, e ao criá-los Deus os fez imagem do amor.  E este amor, que Deus abençoa, está destinado a ser fecundo e a realizar-se na obra comum do cuidado da criação, conforme podemos ler na própria Sagrada Escritura: “Deus abençoou-os e disse-lhes: ‘Sede fecundos e multiplicai-vos, enchei a terra e submetei-a’” (Gn 1,28).

A união matrimonial do homem e da mulher é indissolúvel: foi o próprio Deus que a estabeleceu: “Não separe, pois, o homem o que Deus uniu” (Mt 19,6). É seguindo a Cristo, na renúncia a si próprios e tornando a sua cruz, que os esposos poderão compreender o sentido original do matrimônio e vivê-lo com a ajuda de Cristo.  E o Apóstolo São Paulo exorta: “Maridos, amai as vossas mulheres, como Cristo amou a Igreja e Se entregou por ela, a fim de a santificar” (Ef 5,25-26): e acrescenta imediatamente: “É grande este mistério, digo-o em relação a Cristo e à Igreja” (Ef 5,32).

O vínculo matrimonial é, portanto, estabelecido pelo próprio Deus, de maneira que o matrimônio ratificado e consumado entre batizados não pode jamais ser dissolvido. Este vínculo, resultante do ato humano livre dos esposos e da consumação do matrimônio, é, a partir de então, uma realidade irrevogável.  Pela sua própria natureza, o amor dos esposos exige a unidade e a indissolubilidade e são chamados a crescer sem cessar na sua comunhão, através da fidelidade quotidiana à promessa da mútua doação total que o matrimônio implica (cf. CIgC, n. 1644). Esta é uma consequência da doação de si mesmos que os esposos fazem um ao outro.

O matrimônio está ligado à fé e, nos tempos atuais, somos capazes de compreender toda a verdade desta afirmação, em contraste com a dolorosa realidade de muitos matrimônios que, infelizmente, acabam mal. Há uma clara correspondência entre a crise da fé e a crise do matrimônio. E, como a Igreja afirma e testemunha, o matrimônio é chamado a ser o sujeito da nova evangelização, testemunho da unidade querida por Deus em cada circunstância da vida, “na alegria e na tristeza, na saúde e na doença”, como prometeram no rito sacramental.

O autor de Hebreus tem demonstrado em versículos anteriores a superioridade de Cristo sobre os anjos. Aqui nos diz que, se bem que durante sua vida terrena, foi inferior aos anjos, Ele, e não os anjos, se tornou o único mediador e pontífice, já que o sacerdote deve ser da mesma natureza que o povo; logo os anjos não podiam  mediar entre Deus e os homens em ordem à salvação. O homem e o mundo estavam submetidos às leis dominadas pelos anjos, segundo o sentir da época (Cl 2, 13; Rm 3, 38 e Gl 4, 3-9). Porém, Cristo, vencedor do pecado e da morte, não está sujeito a essas leis e cedo o homem, igual que o Cristo, estará totalmente livre delas. Paradoxalmente, a honra e a glória de Jesus manifestam-se em sua morte em favor de toda a humanidade. A cruz, então, tornou-se para todos os que creem nele o caminho da vitória sobre toda a maldade, que procura impedir o plano de amor e de salvação de Deus. Ao assumir a condição humana com seus limites e dores, Jesus torna-nos também participantes de sua morte redentora. Ao identificar-se plenamente com o ser humano, possibilitou que este se identificasse com a sua divindade. Por isso, Jesus não se envergonha de nos chamar de irmãos.

A grandiosidade dele manifesta-se em sua radical humildade e obediência ao plano de Deus. É nosso modelo e caminho. Foi assumindo os sofrimentos e a morte, na fidelidade à sua missão, que Jesus nos redimiu e nos levou à perfeição. Como humanos, fazemos a experiência cotidiana dos limites e sofrimentos. Tornando-se um de nós, ele conhece perfeitamente todos os problemas que enfrentamos. Não fomos criados para o sofrimento, e sim para a perfeição e a glória. No seguimento de Jesus, assumimos a realidade de nossa condição humana com a missão a que fomos chamados, deixando-nos conduzir pela graça de Deus, na certeza de seu amor sem limites. Aprendemos a reconhecer a sua vontade e nos esforçamos para ser fiéis. A fidelidade a Deus exige rompimento com as facilidades enganosas que nos desviam do caminho da perfeição. A plena realização somente se dá na obediência a Deus, a qual se concretiza no amor solidário. Na cruz de Jesus, morremos para o egoísmo e passamos a viver na condição divina. Aí reside nossa honra e glória de irmãos de Jesus.

Possamos pedir a intercessão da Virgem Maria e do seu esposo São José pela estabilidade conjugal de todos os casais. E com eles, invocamos uma especial efusão do Espírito Santo, para que ilumine do alto todos os cônjuges, tornando fecunda a relação conjugal e, desta união, tendo como base o amor e o bem, possam no mundo, ser um testemunho eficaz da partilha, da unidade e da paz. Assim seja.

PARA REFLETIR

Neste domingo, a Palavra de Deus trata do matrimônio e de sua indissolubilidade. Eis aqui um tema que se tornou tabu nos tempos atuais e, por isso mesmo, precisa ser tratado com toda clareza pelos cristãos… Afinal, se o Evangelho não for sal e luz, para que serve?

Comecemos com o plano de Deus, descrito no Gênesis de modo figurado, como as parábolas que Jesus contava. São textos que não devem ser tomados ao pé da letra! Se lermos com atenção, perceberemos algo muito belo: Deus, à medida que vai criando, vê que tudo é bom… Ao criar o ser humano, vê que “era muito bom” (Gn 1,31). Mas, há algo na criação que o Senhor Deus viu que não era bom: “Não é bom que o homem esteja só”. Se o ser humano é imagem do Deus-Trindade, ele não foi criado para a solidão, mas deve viver em relação com outros: “Vou dar-lhe uma auxiliar que lhe seja semelhante”. Notemos os detalhes tão belos da criação da mulher: (1) “O Senhor Deus fez cair um sono profundo sobre Adão”. Por quê? Para ficar claro que o homem não participou da criação da mulher; esta é tão obra de Deus quanto aquele. (2) “Tirou-lhe uma das costelas e fechou o lugar com carne. Da costela tirada de Adão, o Senhor Deus formou a mulher”. A imagem é bela: tirada do lado do homem, como companheira e igual! (3) “E Adão exclamou: ‘Desta vez sim, é osso de meus ossos e carne da minha carne!’” É a primeira vez que o homem falou, na Bíblia! E sua palavra foi uma declaração de amor… não a Deus, mas à mulher que o Senhor Deus lhe dera de presente: osso de meus ossos, carne de minha carne… parte de mim, cara metade, outro lado do meu coração! E, finalmente, o preceito de Deus, inscrito no íntimo do coração humano pelo próprio Criador: “O homem deixará seu pai e sua mãe e se unirá à sua mulher, e eles serão uma só carne”. Pronto! Esta é o sonho de Deus para o amor humano!

Já aqui há três observações a serem feitas: (a) o laço de amor entre o homem e a mulher é superior a qualquer outro laço, inclusive aquele que liga pais e filhos: o homem e a mulher deixarão pai e mãe para ir ao encontro de sua esposa, de seu esposo. (b) Esta união, no sonho original de Deus, envolve a pessoa toda, corpo e alma: “serão uma só carne”! É uma união completa, abrangente, total: serão um só coração, um só sonho, uma só conta bancária, uma só casa, um só futuro, um só destino! (c) A relação matrimonial, no sonho de Deus, é uma relação entre um homem e uma mulher. Por isso mesmo, jamais os cristãos poderão equiparar a união entre homossexuais ao matrimônio! O respeito às pessoas homossexuais é dever de todos nós; o respeito pela consciência dessas pessoas, que têm o direito de dar o rumo que acharem justo às suas vidas, é obrigação nossa, é gesto de amor que Jesus espera de seus discípulos. Mas, equiparar a relação matrimonial a qualquer outra relação afetiva, sobretudo homossexual, nunca! Por fidelidade a Cristo, nunca! Por respeito ao plano de Deus, jamais! Hoje, no Direito, há uma forte corrente aqui no Brasil, que considera como sendo família qualquer união simplesmente afetiva: não importa se a união é entre marido e mulher, entre amigos ou entre duas pessoas do mesmo sexo. Para nós cristãos, tal concepção é inaceitável! A família, para nós, não é uma realidade simplesmente natural, mas tem sua raiz no próprio plano de Deus. A família é uma realidade também teológica! É preciso escutar o que Deus tem a dizer sobre a família! O problema é que nossa sociedade já não é cristã; é pagã e pensa e age como pagã; é atéia e age como se Deus não existisse… Nossa sociedade acha que o homem é a medida de todas as coisas, o senhor do bem e do mal, do certo e do errado. Isso é absolutamente inaceitável para o cristão!

Agora podemos compreender a palavra de Jesus no Evangelho! Naquele tempo havia o divórcio… E Jesus, que é tão misericordioso, condena sua prática: “Foi por causa da dureza do vosso coração que Moisés” permitiu o divórcio! “No entanto, no princípio da criação Deus os fez homem e mulher… Já não são dois, mas uma só carne. Portanto, o que Deus uniu, o homem não separe!” É uma palavra que parece dura, e os próprios discípulos tiveram dificuldades em compreender… como muitíssimos a têm hoje em dia. Compreendamos! Jesus veio para reconduzir este mundo ferido pelo pecado ao plano original de Deus. Ora, o sonho de Deus para o amor conjugal é que ele seja uma entrega total e plena, no amor indissolúvel, fiel e fecundo. Este é o ideal que Jesus aponta aos seus discípulos! Na perspectiva de Jesus, o divórcio é contrário ao plano de Deus para o amor humano! Por isso mesmo, o matrimônio abraçado por um cristão e uma cristã, no Senhor Jesus, é indissolúvel! Aqui é preciso deixar claro que a Igreja não tem autoridade para ensinar ou fazer diferente! Seria trair o Senhor! Surgem, no entanto, algumas questões sérias e graves:

(1) Como prometer amor por toda a vida, se nosso coração é inconstante? Primeiramente é necessário recordar que o matrimônio cristão somente pode ser abraçado na fé, sabendo os esposos que jamais a graça de Cristo lhes faltará. Com toda certeza, o Senhor haverá de conduzir os esposos no caminho do amor. Isto, no entanto, de modo algum, dispensa os esposos de cultivarem esse amor, com o diálogo, os gestos de carinho e de perdão, de compreensão e de atenção. Amor não é só sentimento: o amor não nasce de repente, não é fatal, não é cego, nem morre de repente. O amor pode e deve ser cultivado, cuidado. Como dizia São João da Cruz: “Onde não há amor, semeia amor e colherás amor”. A grande ilusão do mundo atual é pensar que o amor se reduz a sentimento, que não precisa ser cuidado nem cultivado! Confunde-se amor com paixão!

(2) Como fazer uma aliança para sempre, se esta depende não só de mim, mas também da outra pessoa? A questão é séria e, para nós, cristãos, deve ser pensada na fé. O matrimônio entre cristãos é sinal, é sacramento, do amor entre Cristo e a Igreja. São Paulo explica este mistério de modo belíssimo no capítulo quinto da Carta aos Efésios: marido e mulher devem se amar como Cristo e a Igreja (cf. Ef 5,21-32). Ora, este amor foi selado na cruz e na ressurreição; é amor pascal, amor que envolve morte e vida! A indissolubilidade não deveria ser vista como um fardo, mas como uma proposta de um Deus que crê no homem que criou; um Deus que nunca brinca com o amor, um Deus que aposta na nossa capacidade, quando aberta à sua graça! Ora, este amor-doação matrimonial, imagem daquele outro, entre Cristo e a Igreja, certamente terá a marca da cruz. As dificuldades conjugais, para o cristão, têm o nome de cruz, cruz que, assumida com amor e por amor, é transformada em alegria e plenitude de ressurreição. Aqui não se trata somente de palavras bonitas, mas de uma realidade impressionante: quem capitula, quem desiste ante as dificuldades, nunca plantará um amor no sentido cristão! A presença de Cristo na união conjugal não exclui as crises, as dificuldades, a incompatibilidade de temperamentos e até mesmo os erros na escolha do cônjuge! Mas tudo isso, por quanto doloroso possa ser, pode se tornar, em Cristo, um modo libertador e eficaz de participar com generosidade e desapego da cruz do Senhor e caminho de felicidade! “Loucura! Insanidade! Demência!” – dirá o mundo! Mas, a linguagem da cruz é loucura para o mundo! A sabedoria da cruz é tolice para o mundo! Nunca esqueçamos isso! Mas, para quem crê, é poder de Deus e sabedoria de Deus! (cf. 1Cor 1,18; 3,18-20). O problema é que as pessoas casam como os cristãos, mas não crêem nem vivem como os cristãos! Que fique bem assentado: o sonho de Deus em Cristo para o matrimônio é a indissolubilidade!

(3) E os nossos irmãos e irmãs que fracassaram na aliança conjugal e estão numa nova união? É uma situação dolorosa. Se são cristãos de verdade, a coisa é primeiramente difícil para eles. Não nos compete julgar suas intenções e sua história! Compete-nos respeitá-los e acolhê-los com espírito fraterno, ajudando-os a viver esta nova união do melhor modo possível. Isto, no entanto, não significa aprovação da separação nem da nova união. Mas, simplesmente, respeito pela história, pela consciência e pelo mistério da vida e das opções de cada irmão e de cada irmã. Mesmo porque, quem estiver sem pecado, que atire a primeira pedra. Cuidado, irmãos: não coloquemos fardos na vida dos outros!

Que o Senhor socorra as famílias e fortaleça no amor os esposos cristãos, fazendo-os simples como as crianças, capazes de acolher a proposta do Cristo para o matrimônio e que, nas dificuldades, recordem-se que Cristo, autor da nossa salvação, também foi levado à consumação passando pelos sofrimentos. Que nossos sofrimentos, unidos aos dele, sejam semente e penhor de vida eterna. Amém.

Um comentário:

  1. estou encantado com tantas riquezas que agora estou compreendendo a partir destas reflexões feitas por vcs! estou mesmo com muita alegria no meu coração por ter entendido a mensagem da Liturgia da Palavra de Deus! meu coração está cheio da graça de Deus, obrigado muito obrigado!

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