quinta-feira, 11 de abril de 2019

Filme contra o aborto arrasa nas bilheterias dos EUA

Filme está sofrendo uma campanha de boicote por parte da indústria abortista e da mídia panfletária

Com receita de 6,1 milhões de dólares no seu primeiro fim de semana, o filme “Unplanned” (“Não Planejado“) conquistou o notável sucesso de ficar em 5º lugar entre as maiores bilheterias dos Estados Unidos na sua primeira semana de exibição nos cinemas do país, apesar da forte campanha de boicote realizada por grupos abortistas contra esta produção pró-vida.

Os primeiros 100 dias da atuação da imprensa no governo Bolsonaro

A mídia avalia o governo Bolsonaro através de uma lente ideológica esquerdista em que todos os atos de Bolsonaro serão sempre piores do que as atitudes de Fidel Castro ou Maduro. Diante disso, analisamos os primeiros 100 dias da atuação da imprensa no governo.

A mídia inteira avalia os primeiros 100 dias do governo Bolsonaro através de uma lente ideológica esquerdista. Isso significa que não importa o que Bolsonaro faça seus atos serão sempre piores do que as atitudes de Fidel Castro ou Maduro. A mídia está seguindo o mesmo modus operandis da imprensa americana: transformar os atos mais desprezíveis em escândalo nacional como a notícia publicada pelo Estadão em que Bolsonaro chega na churrascaria antes do aniversariante.

O corte de mais de 10 bilhões com publicidade estatal, a flexibilização da posse, mais de 12 concessões aeroportuárias, a apresentação da Reforma e do Pacote Anticrime, o novo recorde da bolsa, a extinção de mais de 21 mil cargos públicos estão sendo completamente ignorados por cortinas de fumaça como a polêmica de menino veste azul e menina veste rosa.

Diante de tantos problemas, resolvemos analisar os primeiros 100 dias da atuação da imprensa no governo Bolsonaro, comentadas por Luciano Oliveira e André Assi Barreto, editor e colunista do Senso Incomum.

Exposição de "virgem abortista" na Argentina completa um mês sem sanção alguma


Apesar da rejeição de milhares de cidadãos, de grupos de advogados, do Partido Democrata Cristão e do próprio Secretário de Culto da Argentina, Alfredo Abriani, a imagem mariana chamada "virgem abortista" ainda está exposta em um centro cultural em Buenos Aires (Argentina).

No dia 7 de abril completou um mês desde que a imagem da Imaculada Conceição, pintada com um lenço verde no rosto, foi instalada no Centro Cultural da Memória Haroldo Conti, em Buenos Aires, como parte da "exposição feminista Para Todes, tode [Plano de luta]" de Kekena Corvalán.

A rejeição à imagem ofensiva foi imediata. A Corporação de Advogados Católicos exigiu medidas administrativas contra o centro cultural e mais de 20 mil pessoas assinaram na plataforma cidadã CitizenGo para solicitar a retirada da "virgem abortista".

Do total de assinaturas, cerca de 17 mil foram apresentadas pelo grupo Advogados pela Vida ao secretário de Culto da Argentina, Alfredo Abriani.

O Diagnóstico de Bento XVI sobre a crise da Igreja e dos abusos sexuais do clero


O Papa Emérito Bento XVI escreveu recentemente um texto intitulado "A Igreja e os abusos sexuais", no qual oferece suas reflexões sobre a atual situação eclesial e apresenta suas propostas para enfrentar esta grave crise.

O texto (escrito em alemão) é dividido em três partes. No primeiro apresenta o contexto histórico a partir dos anos 1960, no segundo se refere aos efeitos na vida dos sacerdotes e no terceiro se propõe uma resposta adequada da Igreja.

Originalmente, o mesmo seria publicado na Semana Santa pelo Klerusblatt, um jornal mensal para o clero de algumas dioceses bávaras da Alemanha; no entanto, terminou sendo divulgado na quarta-feira, 10 de abril, pelo jornal New York Post.

ACI Digital oferece uma tradução ao português do documento na íntegra, que é, nas palavras do próprio Bento XVI, sua contribuição para "ajudar a Igreja nesta hora tão difícil".

A seguir, o texto completo do Papa Bento XVI:

A Igreja e o Escândalo do abuso sexual

De 21 a 24 de fevereiro, a convite do Papa Francisco, os presidentes das conferências episcopais de todo o mundo se reuniram no Vaticano para discutir a crise da Fé e da Igreja, uma crise palpável em todo o mundo após as estarrecedoras revelações dos abusos perpetrado por clérigos contra menores. A extensão e a gravidade dos incidentes relatados têm afligido profundamente tanto sacerdotes quanto leigos, e levou a não poucas pessoas a questionarem a própria fé da Igreja. Era necessário enviar uma mensagem forte e procurar um novo começo, com tal de tornar a Igreja novamente verdadeiramente credível como uma luz entre os povos e como uma força ativa contra os poderes da destruição.

Já que eu mesmo me encontrava servindo em uma posição de responsabilidade como pastor da Igreja no momento da eclosão pública da crise e durante seu desenvolvimento, eu tive que me perguntar – ainda que como emérito já não seja mais diretamente responsável por essa situação - o que eu podia fazer para contribuir com um novo começo em retrospecto. Assim, durante o período que vai do anúncio até a realização da reunião dos Presidentes das Conferências Episcopais, compilei algumas anotações com as quais creio poder oferecer uma ou duas observações e ajudar a Igreja nessa hora tão difícil. Tendo entrado em contato com o Secretário de Estado, Cardeal [Pietro] Parolin e o Santo Padre [Papa Francisco], pareceu-me apropriado publicar o texto resultante deste esforço no "Klerusblatt" (NdT: um jornal mensal para o clero de algumas dioceses da Baviera).

Meu trabalho está dividido em três partes. Na primeira, pretendo apresentar brevemente o contexto societário mais amplo da questão, sem o qual o problema não pode ser entendido. Eu tento mostrar que na década de 60 ocorreu um evento excepcional, em uma escala sem precedentes na história. Pode-se dizer que, nos 20 anos decorridos entre 1960 e 1980, os padrões vinculantes relativos à sexualidade até então entraram em colapso por completo, gerando uma ausência de normativa que já foi objeto de tentativas laboriosas de compreensão.

Na segunda parte, pretendo destacar os efeitos dessa situação na formação dos sacerdotes e na vida dos sacerdotes.

Finalmente, na terceira parte, gostaria de desenvolver algumas perspectivas para uma resposta adequada por parte da Igreja.

terça-feira, 9 de abril de 2019

Frei Damião: O capuchinho que evangelizou o nordeste brasileiro e é agora Venerável


Entre os sete decretos assinados pelo Papa Francisco que reconhecem as virtudes heroicas de novos Veneráveis está também o de Frei Damião de Bozzano, capuchinho que evangelizou o Nordeste brasileiro e dizia ser apenas um mensageiro de Deus.

Frei Damião nasceu em Bozzano, na Itália, em 5 de novembro de 1898, tendo recebido o nome de Pio Gianotti. Era o segundo dos cinco filhos do casal de camponeses Felice e Maria Giannotti, de sólida formação católica.

Ainda aos 10 anos, após ser crismado, começou a expressar os primeiros sinais de vocação e, aos 13 anos, ingressou no Seminário Seráfico de Camigliano, da Ordem dos Frades Menores Capuchinhos, em 17 de março de 1911.

Aos 17 anos, em julho de 1915, emitiu os primeiros votos e recebeu o nome de Frei Damião de Bozzano. Entretanto, precisou interromper os seus estudos de Filosofia após ser convocado, em setembro de 1918, para o serviço militar na Primeira Guerra Mundial.

Retornou ao Convento ao fim da Guerra e emitiu sua profissão perpétua. Em 1920, foi estudar Teologia na Pontifícia Universidade Gregoriana, em Roma.

Frei Damião foi ordenado sacerdote em 25 de agosto de 1923, na igreja do antigo Colégio São Lourenço de Bríndisi, em Roma. E, em 1931, foi enviado ao Brasil, onde chegou em 17 de junho, tendo se estabelecido no Convento Nossa Senhora da Penha, em Recife (PE). Após esta chegada, foram 66 anos dedicados às Santas Missões.

As Santas Missões eram vistas como “tempo forte de graça e conversão”, que costumavam durar de segunda-feira a domingo. Durante esta semana missionária, o frade proclamava a Palavra de Deus em uma cidade, por isso, afirmava ser apenas um mensageiro de Deus.

As Santas Missões contavam com sermões, catequeses, encontros específicos com homens, mulheres, jovens, crianças, visitava os doentes, os presos. Além disso, dedicava-se ao sacramento da Reconciliação, atendendo confissões por mais de 12 horas por dia, orientando os corações para Cristo.

Com os anos, adquiriu uma deformação na coluna que o deixou encurvado, provocando dificuldades na fala e na respiração. Além disso, durante muito tempo, sofre de erisipela, devido à má circulação sanguínea.

segunda-feira, 8 de abril de 2019

Quarta pregação da Quaresma 2019: "Adorarás o Senhor teu Deus"




MEDITAÇÃO PARA A QUARESMA
"Adorarás o Senhor teu Deus"
 

Este ano celebramos o oitavo centenário do encontro de Francisco de Assis com o Sultão do Egito al-Kamil, em 1219. Recordo-o aqui por um detalhe que diz respeito ao tema das nossas meditações sobre o Deus vivo.

Depois de retornar de sua viagem ao Oriente em 1219, Francisco de Assis escreveu uma carta dirigida “Aos Regentes dos povos". Nela dizia, entre outras coisas:

Sois obrigados a dar ao Senhor tanta honra entre o povo que vos foi confiado, que todas as tardes se anuncie, através de um pregoeiro ou qualquer outro sinal, a obrigação de se dar o louvor e a gratidão ao onipotente Senhor Deus de todo o povo. E, se não fizerdes isto, sabei que tereis de prestar contas a Deus perante vosso Senhor Jesus Cristo no dia do juízo [1].

Acredita-se amplamente que o santo tenha inspirado esta exortação no que tinha observado na sua viagem ao Oriente, onde ouviu o apelo vespertino à oração feita pelos muezins de cima dos minaretes. Um belo exemplo não só de diálogo entre as diferentes religiões, mas também de enriquecimento mútuo. Uma missionária que trabalha há muitos anos num país africano escreveu estas palavras: "Nós somos chamados a responder a uma necessidade fundamental dos homens, à necessidade profunda de Deus, à sede de Absoluto, a ensinar o caminho de Deus, a ensinar a rezar. É por isso que os muçulmanos fazem, nestas regiões, muitos prosélitos: ensinam imediatamente e de modo simples, a adorar a Deus". 

Nós, cristãos, temos uma imagem diferente de Deus - um Deus que é amor infinito antes mesmo que poder infinito -, mas isto não deve fazer-nos esquecer o dever primário da adoração. À provocação da mulher samaritana: "Os nossos pais adoraram neste monte; mas vós dizeis que é em Jerusalém que devemos adorar", Jesus responde com palavras que são a magna carta da adoração cristã:

“Mulher, acredi­ta-me, vem a hora em que não adorareis o Pai, nem neste monte nem em Jerusalém. Vós adorais o que não conheceis, nós adoramos o que conhecemos, porque a salvação vem dos judeus. Mas vem a hora, e já chegou, em que os verdadeiros adoradores hão de adorar o Pai em espírito e verdade, e são esses adoradores que o Pai deseja. Deus é espírito, e os seus adoradores devem adorá-lo em espírito e verdade”. (Jo 4,21-24).

Foi o Novo Testamento que elevou a palavra adoração a esta dignidade que não tinha antes. No Antigo Testamento, além de Deus, o culto é também dirigido em alguns casos a um anjo (cf. Nm 22,31) ou ao rei (1 Sam 24,9); pelo contrário, no Novo Testamento toda vez que se tenta adorar alguém que não seja Deus e a pessoa de Cristo, mesmo que seja um anjo, a reação imediata é: "Não faça isso!  É Deus que deve ser adorado"[2].  É quase como se alguém estivesse correndo, caso contrário, um perigo mortal. É o que Jesus, no deserto, recorda peremptoriamente ao tentador que lhe pediu que o adorasse: "Está escrito: O Senhor, teu Deus adorarás, só a ele darás culto" (Mt 4, 10).

A Igreja retomou este ensinamento, fazendo da adoração o ato por excelência do culto de Latria, distinto da chamada dulia reservada aos Santos e da chamada hiperdulia reservada à Virgem.  A adoração é, pois, o único ato religioso que não pode ser oferecido a mais ninguém, em todo o universo, nem sequer a Nossa Senhora, mas apenas a Deus. Aqui está a sua dignidade e força única.

A adoração (proskunesis) no início indicava o gesto material de prostrar-se ao chão diante de alguém, como sinal de reverência e submissão. Neste sentido plástico a palavra ainda é usada nos Evangelhos e no Apocalipse. Neles a pessoa diante da qual se prostrar, na terra é Jesus Cristo e na liturgia celestial o Cordeiro imolado ou o Onipotente. Só no diálogo com a samaritana e em 1 Cor 14,25 é que aparece agora dissolvida do seu significado exterior e indica uma disposição interior da alma para com Deus. Este se tornará cada vez mais o sentido ordinário do termo e, neste sentido, no credo, dizemos do Espírito Santo que "adorado e glorificado" com o Pai e o Filho.

Para indicar a atitude externa correspondente à adoração, prefere-se o gesto de dobrar os joelhos, a genuflexão. Este último gesto também é reservado exclusivamente para a divindade. Podemos estar de joelhos diante da imagem de Nossa Senhora, mas não fazemos genuflexão diante dela, como fazemos diante do Santíssimo Sacramento ou do Crucifixo. 

O que significa adorar

Mas, mais do que o significado e o desenvolvimento do termo, estamos interessados em saber em que consiste e como podemos praticar a adoração. A adoração pode ser preparada por uma longa reflexão, mas termina com uma intuição e, como qualquer intuição, ela não dura muito tempo. É como um clarão de luz na noite. Mas de uma luz especial: não tanto a luz da verdade, mas a luz da realidade. É a percepção da grandeza, da majestade, da beleza e, ao mesmo tempo, da bondade de Deus e da sua presença que tira o fôlego. É uma espécie de naufrágio no oceano sem costas e sem fundo da majestade de Deus. Adorar, segundo a expressão de Santa Ângela de Foligno mencionada no início, significa "recolher-se em unidade e mergulhar no abismo infinito de Deus".

Uma expressão de adoração, mais eficaz que qualquer palavra, é o silêncio. Na verdade, ele diz por si mesmo que a realidade está muito além de qualquer palavra.  Na Bíblia, a insinuação ressoa alto: "Toda a terra está em silêncio diante dele! (Hab 2,20) e: "Silêncio na presença do Senhor Deus!" (Sof 1, 7). Quando "os sentidos estão envoltos em silêncio sem limites e as memórias envelhecem com a ajuda do silêncio", disse um Padre do deserto, então tudo o que resta é adorar.

Foi um gesto de adoração o de Jó, quando, tendo vindo ver face a face o Onipotente no final da sua história, exclama: " "“Leviano como sou, que posso responder-te? Ponho a minha mão sobre a boca." (Jó 40,4). Neste sentido, o versículo de um salmo, mais tarde retomado pela liturgia, no texto hebraico, dizia: "Por ti o silêncio é louvor", Tibi silentium laus! (cf. Sl 65,2, texto Massorético). Adorar - segundo a estupenda expressão de São Gregório de Nazianzeno - significa elevar a Deus um "hino de silêncio"[3]. À medida que o ar se torna mais rarefeito ao se subir uma alta montanha, da mesma forma ao se aproximar de Deus a palavra deve tornar-se mais curta, até que se torne, no final, completamente silenciosa e se una em silêncio com aquele que é o inefável[4].

Se precisamente se busca "parar" a mente e impedi-la de vaguear sobre outros objetos, convém fazê-lo com a palavra mais curta que existe: Amém, Sim. Adorar, de fato, é consentir.  É deixar Deus ser Deus.  É dizer sim a Deus como Deus e a si mesmo como criaturas de Deus. Neste sentido, Jesus é definido no Apocalipse como o Amém, o Sim que se fez pessoa (cf. Ap 3,14), ou seja, repetir incessantemente com os Serafins: "Qadosh, qadosh, qadosh: Santo! Santo! Santo!

A adoração requer, portanto, que nos curvemos e fiquemos em silêncio.  Mas será que tal ato é digno do homem?  Não o humilha, derrogando a sua dignidade? Na verdade, isso é realmente digno de Deus? Que Deus é esse que precisa que as suas criaturas se inclinem à terra diante dele e se calem? É, Deus, como um daqueles soberanos orientais que inventaram a adoração para si próprios? É inútil negá-lo, a adoração implica para as criaturas também um aspecto de humilhação radical, de se tornarem pequenas, de se entregarem e de se submeterem. A adoração envolve sempre um aspecto de sacrifício, uma imolação de algo. Precisamente assim ela atesta que Deus é Deus e que nada nem ninguém tem direito de existir diante dele, senão na sua graça. Com a adoração se imola e se sacrifica o próprio eu, a própria glória, a própria autossuficiência. Mas esta é uma glória falsa e inconsistente, e é uma libertação para o homem se livrar dela.

Adorando, a pessoa "liberta a verdade que era prisioneira da injustiça". A pessoa torna-se "autêntica" no sentido mais profundo da palavra. Na adoração já se antecipa o retorno de todas as coisas a Deus. Há um abandono ao significado e ao fluxo do ser.  Assim como a água encontra a sua paz ao fluir em direção ao mar e o pássaro sua alegria ao seguir o curso do vento, assim também o adorador ao adorar. Adorar a Deus não é, portanto, tanto um dever, uma obrigação, mas um privilégio, uma necessidade. O homem precisa de algo majestoso para amar e adorar! Foi feito para isto. 

Portanto, não é Deus que precisa ser adorado, mas o homem que precisa adorar. Um prefácio da Missa diz: "Tu não precisas do nosso louvor, mas por um dom do teu amor nos chamas a dar-te graças; os nossos hinos de bênção não aumentam a tua grandeza, mas obtêm para nós a graça que nos salva, por Cristo nosso Senhor"[5]. F. Nietzsche estava completamente fora do caminho quando definiu o Deus da Bíblia como "aquele oriental ganancioso por honras em seu assento celestial"[6].

A adoração deve, no entanto, ser livre. O que torna a adoração digna de Deus e ao mesmo tempo digna do homem é a liberdade, entendida não só negativamente como ausência de coação, mas também positivamente como um alegre impulso, dom espontâneo da criatura que assim exprime a sua alegria de não ser ele próprio Deus, para poder ter um Deus acima de si para adorar, admirar, celebrar.

Segunda pregação da Quaresma 2019: "Retorne a si mesmo"


  
MEDITAÇÃO PARA A QUARESMA
"Retorne a si mesmo"

Santo Agostinho lançou um apelo que, muitos séculos depois, manteve intacta a sua relevância: "In te ipsum redi. In interiore homine habitat veritas"[1]: "Retorne a si mesmo. A verdade habita no homem interior". Em um discurso ao povo, com insistência ainda maior, ele exorta:

"Entrai de novo em vosso coração! Onde quereis ir para longe de vós? Ao ir longe, vos perdereis. Por que vos dirigis a estradas desertas? Retornai do vosso deambular que vos levastes para fora da estrada; voltai para o Senhor. Ele está pronto. Em primeiro lugar, retornai ao vosso coração, vós que vos tornastes estranhos a vós mesmos, vagando lá fora: não vos conheceis a vós mesmos, e procurais aquele que vos criou! Voltai, retornai ao coração, desprendei-vos do vosso corpo... Retornai ao coração: ali examinai o que se pode perceber de Deus, porque ali se encontra a imagem de Deus; na interioridade do homem mora Cristo, na vossa interioridade vos renovais segundo a imagem de Deus"[2].

Continuando o comentário iniciado no Advento sobre o versículo do Salmo "A minha alma tem sede do Deus vivo", refletimos sobre o "lugar" onde cada um de nós entra em contato com o Deus vivo. No sentido universal e sacramental este "lugar" é a Igreja, mas no sentido pessoal e existencial é o nosso coração, o que a Escritura chama "o homem interior", "o homem escondido no coração"[3]. Esta escolha é impulsionada também pelo tempo litúrgico em que nos encontramos.  Jesus nestes quarenta dias está no deserto, e é aí que devemos chegar até ele. Nem todos podem ir para um deserto exterior; mas todos podemos nos refugiar no deserto interior que é o nosso coração. "Cristo habita na interioridade do homem", disse-nos Agostinho.

Se quisermos uma imagem plástica ou um símbolo que nos ajude a realizar esta conversão interior, o Evangelho oferece-nos com o episódio de Zaqueu. Zaqueu é o homem que quer conhecer Jesus e, para isso, sai de casa, entra na multidão, sobe a uma árvore... Procura-o fora. Mas, eis que, quando Jesus passou, viu-o e disse-lhe: "Zaqueu, desce imediatamente, porque hoje tenho de entrar em tua casa" (Lc 19, 5). Jesus traz Zaqueu de volta à sua casa e ali, no segredo, sem testemunhas, acontece o milagre: Ele conhece verdadeiramente quem é Jesus e encontra a salvação.

Nós nos parecemos muito com Zaqueu. Procuramos Jesus e o procuramos fora, nas ruas, na multidão. E é o próprio Jesus quem nos convida a voltar à nossa casa em nossos corações, onde Ele deseja encontrar-se conosco.

Interioridade, um valor em crise


A interioridade é um valor em crise. A "vida interior" que antes era quase sinônimo de vida espiritual, agora tende a ser vista com desconfiança. Há dicionários de espiritualidade que omitem completamente as vozes "interioridade" e "recolhimento" e outros que as trazem, mas não sem expressar algumas reservas. Por exemplo, nota-se que, afinal, não há nenhum termo bíblico que corresponda exatamente a estas palavras; que poderia ter havido, neste ponto, uma influência decisiva da filosofia platônica; que poderia favorecer o subjetivismo e assim por diante.

Um sintoma revelador deste declínio do gosto e da estima pela interioridade é o destino da Imitação de Cristo, que é uma espécie de manual para a introdução à vida interior. De livro mais amado entre os cristãos, depois da Bíblia, ele passou, em poucas décadas, a ser um livro esquecido.

Algumas das causas desta crise são antigas e inerentes à nossa própria natureza. A nossa "composição", isto é, o nosso ser feito de carne e espírito, nos faz como um plano inclinado, mas inclinado para o exterior, o visível e o múltiplo. Assim como o universo, após a explosão inicial (o famoso Big Bang), também nós estamos em fase de expansão e de afastamento do centro. "O olho não para de olhar, nem o ouvido se cansa de ouvir", diz as Escrituras (Ec 1, 8). Estamos perpetuamente "saindo" por aquelas cinco portas ou janelas que são nossos sentidos.

Outras causas são mais específicas e atuais. Uma delas é a emergência do "social" que é certamente um valor positivo do nosso tempo, mas que, se não for reequilibrado, pode acentuar a projeção ao exterior e a despersonalização do homem. Na cultura secularizada e leiga dos nossos tempos o papel que desempenhava a interioridade cristã foi assumido pela psicologia e pela psicanálise, que, no entanto, se detêm no inconsciente do homem e, em todo caso, na sua subjetividade, independentemente da sua íntima ligação com Deus.

No campo eclesial, a afirmação, com o Concílio, da ideia de uma "Igreja para o mundo" fez com que o antigo ideal de fugir do mundo fosse por vezes substituído pelo ideal de fugir para o mundo. O abandono da interioridade e a projeção para o exterior é um aspecto - e entre os mais perigosos - do fenômeno do secularismo. Houve até mesmo uma tentativa de justificar teologicamente esta nova orientação que tomou o nome de teologia da morte de Deus, ou da cidade secular. Deus - se fala - deu-nos, ele próprio, um exemplo. Encarnando-se, esvaziou-se, saiu de si mesmo, da interioridade trinitária, "mundanizou-se", isto é, dispersou-se no profano. Tornou-se um Deus "fora de si mesmo".

Primeira pregação da Quaresma 2019: "Bem-aventurados os puros de coração pois verão a Deus"



MEDITAÇÃO PARA A QUARESMA
"Bem-aventurados os puros de coração pois verão a Deus"
Continuando a reflexão iniciada no Advento sobre o versículo do salmo: "A minha alma tem sede do Deus vivo" (Sl 42, 2), nesta primeira pregação quaresmal gostaria de meditar convosco sobre a condição essencial para "ver" a Deus. Segundo Jesus, é a pureza de coração: "Bem-aventurados os puros de coração, porque verão a Deus" (Mt 5, 8), diz ele em uma de suas bem-aventuranças.

Sabemos que puro e pureza têm na Bíblia, assim como na linguagem comum, uma grande variedade de significados. O Evangelho insiste em duas áreas em particular: a retidão de intenções e a pureza dos costumes. A pureza das intenções é contraposta pela hipocrisia, a pureza dos costumes pelo abuso da sexualidade.

Na esfera moral, a palavra "pureza" comumente se refere a um certo comportamento na esfera da sexualidade, marcado pelo respeito à vontade do Criador e à finalidade intrínseca da própria sexualidade. Não podemos entrar em contato com Deus, que é espírito, a não ser através do nosso espírito. Mas a desordem ou, pior ainda, as aberrações neste campo têm o efeito constatado por todos de obscurecer a mente. É como balançar os pés em um charco: a lama, do fundo, se eleva e enlameia toda a água. Deus é luz e uma tal pessoa "odeia a luz".

O pecado impuro não deixa ver o rosto de Deus, ou, se o mostra, mostra-o todo deformado. Faz dele, não o amigo, o aliado e o pai, mas o antagonista, o inimigo. O homem carnal está cheio de concupiscências, deseja as coisas dos outros e a mulher dos outros. Nesta situação, Deus aparece para ele como aquele que bloqueia o caminho para os seus maus desejos por meio das suas ordens "Tu deves!", "Tu não deves!". O pecado desperta no coração do homem um ressentimento surdo contra Deus, a ponto de que, se dependesse dele, ele desejaria que Deus não existisse.

Nesta ocasião, porém, mais do que na pureza dos costumes, gostaria de insistir no outro sentido da expressão "puros de coração", isto é, na pureza ou retidão das intenções, na prática, na virtude contrária à hipocrisia. O tempo litúrgico em que vivemos também nos orienta neste sentido. Começamos a Quaresma, a quarta-feira de cinzas, ouvindo novamente as admoestações esmagadoras de Jesus:

          ["Quando derdes esmolas, não toqueis trombeta diante de vós, como os hipócritas... Quando orardes, não sejais como os hipócritas... E quando jejuardes, não vos torneis tão melancólicos como os hipócritas" (Mt 6, 1-18).]

É surpreendente o quanto o pecado da hipocrisia - o mais denunciado por Jesus nos evangelhos - pouco entre em nossos exames ordinários de consciência. Não tendo encontrado em nenhum deles a pergunta: "Fui hipócrita?", tive que colocá-la por minha conta, e raramente passei incólume para a próxima pergunta. O maior ato de hipocrisia seria esconder a própria hipocrisia. Escondê-la de si mesmo e dos outros, porque não é possível de Deus. A hipocrisia é amplamente superada no momento em que é reconhecida. E é isso que nos propomos fazer nesta meditação: reconhecer a parte de hipocrisia, mais ou menos consciente, que está em nossas ações.

O homem - escreveu Pascal - tem duas vidas: uma é a vida verdadeira, a outra é a vida imaginária que vive na opinião, sua ou do povo. Trabalhamos incansavelmente para embelezar e preservar o nosso ser imaginário e negligenciamos o verdadeiro. Se possuímos alguma virtude ou mérito, temos o cuidado de torná-la conhecida, de uma forma ou de outra, para enriquecer nosso ser imaginário com essa virtude ou mérito, dispostos até mesmo a prescindir dela, para acrescentar algo a ele, a ponto de consentir, às vezes, de sermos covardes, com tal de parecermos valentes e a dar também a vida, desde que as pessoas falem sobre isso[1].

Vamos tentar descobrir a origem e o significado do termo hipocrisia. A palavra vem da linguagem teatral. No início significava simplesmente recitar, representar no palco. Aos antigos não escapava o elemento intrínseco de mentira que existe em cada representação cênica, apesar do elevado valor moral e artístico que lhe é reconhecido. Daí o julgamento negativo que pesava sobre a profissão de ator, reservado, em certos momentos, aos escravos e até mesmo proibido pelos apologistas cristãos. A dor e a alegria representadas e enfatizadas não são verdadeira dor e verdadeira alegria, mas aparência, afetação. A realidade íntima dos sentimentos não corresponde às palavras e atitudes externas. O que se vê no rosto não é o que está no coração.

Usamos a palavra ficção num sentido neutro ou até mesmo positivo (é um gênero literário e de entretenimento muito em voga hoje em dia!); os antigos deram-lhe o sentido que ela realmente tem: o do fingimento. O que havia de negativo no fingimento cênico passou para a palavra hipocrisia. De uma palavra originalmente neutra, tornou-se uma palavra exclusivamente negativa, uma das poucas palavras com todos, e apenas, os significados negativos. Há quem se vanglorie de ser orgulhoso ou libertino, ninguém de ser hipócrita.

A origem do termo nos coloca na trilha para descobrir a natureza da hipocrisia. É fazer da vida um teatro em que se atua para um público; é usar uma máscara, deixar de ser uma pessoa para se tornar um personagem. O personagem nada mais é do que a corrupção da pessoa. A pessoa é um rosto, o personagem é uma máscara. A pessoa é nudez radical, o personagem é todo vestuário. A pessoa ama a autenticidade e a essencialidade, o personagem vive de fingimentos e de artifícios. A pessoa obedece às próprias convicções, o personagem obedece a um guião. A pessoa é humilde e leve, o personagem é pesado e volumoso.

Essa tendência inata do homem é grandemente aumentada pela cultura atual, dominada pela imagem. Cinema, televisão, internet: agora tudo é baseado principalmente na imagem, disse Descartes: "Cogito ergo sum", penso logo sou; mas hoje nós tendemos a substituí-lo por "apareço, portanto, sou". Um famoso moralista definiu a hipocrisia como "o tributo que o vício presta à virtude"[2]. Ameaça acima de tudo pessoas piedosas e religiosas. Um rabino do tempo de Cristo disse que 90% da hipocrisia do mundo estava em Jerusalém[3]. A razão é simples: quanto mais forte for a estima pelos valores do espírito, da piedade e da virtude, mais forte será também a tentação de cortá-los para não se parecer privado deles.

Um perigo vem também da multidão de ritos que as pessoas piedosas estão acostumadas a realizar e das prescrições que se comprometem a observar. Se não forem acompanhadas por um esforço contínuo de colocar uma alma neles, através do amor a Deus e ao próximo, tornam-se cascas vazias. "Estas coisas - diz São Paulo falando de certos ritos e prescrições exteriores - têm uma aparência de sabedoria, com sua afetada religiosidade e humildade e austeridade em relação ao corpo, mas na realidade servem apenas para satisfazer a carne" (Cl 2,23). Neste caso, as pessoas guardam, diz o Apóstolo, "a aparência de piedade, enquanto negam a sua força interior" (2 Tm 3, 5).

Quando a hipocrisia se torna crônica, cria, no matrimônio e na vida consagrada, a situação de "vida dupla": uma pública, evidente, outra oculta; muitas vezes uma diurna, outra noturna. É o estado espiritual mais perigoso para a alma, do qual se torna muito difícil sair, a menos que algo interfira de fora para romper o muro dentro do qual se está trancado. É a etapa que Jesus descreve com a imagem dos sepulcros caiados:

"Ai de vós, escribas e fariseus hipócritas, que pareceis túmulos caiados de branco: por fora estão lindos, mas por dentro estão cheios de ossos de mortos e de toda podridão. Assim também vós: por fora pareceis justos diante dos homens, mas por dentro estais cheios de hipocrisia e de iniquidade" (Mt 23, 27-28).

Se nos perguntarmos por que a hipocrisia é tão abominável diante de Deus", a resposta é clara. A hipocrisia é mentira. É esconder a verdade. Além disso, na hipocrisia o homem deve rebaixar a Deus, colocá-lo em segundo lugar, colocando as criaturas, o público, em primeiro lugar. É como se, na presença do rei, alguém virasse as costas para ele para se concentrar apenas nos servos. "O homem olha para a aparência, o Senhor olha para o coração" (1 Sam 16,7): cultivar a aparência mais do que o coração, significa automaticamente dar mais importância ao homem do que a Deus.

A hipocrisia é, portanto, essencialmente uma falta de fé, uma forma de idolatria, na medida em que coloca as criaturas no lugar do Criador. Jesus faz derivar dela a incapacidade dos seus inimigos de acreditarem n'Ele: "Como podeis crer, vós que vos gloriais uns aos outros, e não buscais a glória que vem somente de Deus? (Jo 5, 44). A hipocrisia falta também a caridade para com o próximo, porque tende a reduzir os outros a admiradores. Não lhes reconhece uma própria dignidade, mas os vê apenas em função da sua própria imagem. Números da audiência e nada mais.

Uma forma derivada da hipocrisia é a duplicidade ou insinceridade. Com a hipocrisia se procura mentir a Deus; com a duplicidade no pensar e no falar se procura mentir aos homens. Duplicidade é dizer uma coisa e pensar outra; falar bem de uma pessoa em sua presença e falar mal assim que ela vira as costas.

O juízo de Cristo sobre a hipocrisia é como uma espada flamejante: "Receperunt mercedem suam": "receberam a sua recompensa". Eles assinaram um recibo, não podem esperar outra coisa. Uma recompensa, além disso, ilusória e contraproducente também a nível humano, porque é muito verdadeiro o ditado que diz que "a glória foge de quem a persegue e persegue quem foge dela". 

É evidente que a nossa vitória sobre a hipocrisia nunca será uma vitória à primeira vista. A menos que tenhamos atingido um nível muito elevado de perfeição, não podemos evitar instintivamente sentir o desejo de aparecer em boa luz, de causar boa impressão, de agradar aos outros. A nossa arma é a retidão de intenção. A reta intenção é alcançada através da constante e diária retificação de nossa intenção. A intenção da vontade, não o sentimento natural, é o que faz a diferença aos olhos de Deus. 

Se a hipocrisia consiste em mostrar também o bem que não se faz, um remédio eficaz para contrariar esta tendência é esconder também o bem que se faz. Privilegiar aqueles gestos escondidos que não serão desperdiçados por nenhum olhar terreno e que conservarão todo o seu perfume para Deus. "A Deus, diz São João da Cruz, é mais agradável uma ação, ainda que pequena, feita em segredo e sem o desejo de ser conhecida, do que mil outras feitas com o desejo de serem vistas pelos homens". E ainda: "Uma ação feita inteiramente e puramente por Deus, com coração puro, cria um reino inteiro para aqueles que a fazem"[4].

Jesus insiste neste exercício: "Orai em segredo, jejuai em segredo, dai esmolas em segredo e vosso Pai, que vê no segredo, vos recompensará". (cf. Mt 6,4-18). São iguarias para Deus que tonificam a alma. Não se trata de fazer disto uma regra fixa. Jesus também diz: "Assim resplandeça a vossa luz diante dos homens, para que vejam as vossas boas obras e dêem glória ao vosso Pai que está nos céus" (Mt 5, 16). É uma questão de distinguir quando é bom para os outros verem e quando é melhor para eles não verem.

O pior que se pode fazer, no final de uma descrição da hipocrisia, é usá-la para julgar os outros, para denunciar a hipocrisia que existe à nossa volta. É precisamente a eles que Jesus aplica o título de hipócritas: "Hipócritas, tirai primeiro a trave do vosso olho e depois vereis bem para tirar o cisco do olho do vosso irmão! (Mt 7,5). Aqui é verdadeiramente oportuno dizer: "Aquele dentre vós que não tem pecado, atire a primeira pedra" (Jo 8, 7). Quem pode dizer que está completamente livre de qualquer forma de hipocrisia? De não ser um pouco, também ele, um sepulcro caiado, diferente por dentro do que aparece por fora? Talvez só Jesus e Nossa Senhora tenham estado isentos, de forma estável e absoluta, de todas as formas de hipocrisia. O fato consolador é que, assim que se diz: "Fui hipócrita", sua hipocrisia é superada.