segunda-feira, 22 de janeiro de 2018

Perú: "Maria é Mãe e não abandona os seus filhos", disse o Papa


VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO AO CHILE E PERU
(15-22 DE JANEIRO DE 2018)

SANTA MISSA

HOMILIA DO SANTO PADRE

Trujillo - Esplanada litorânea de Huanchaco
Sábado, 20 de janeiro de 2018

Estas terras têm sabor a Evangelho. Todo o ambiente que nos rodeia, tendo como pano de fundo este mar imenso, ajuda-nos a compreender melhor a experiência que os apóstolos viveram com Jesus e que também nós, hoje, somos chamados a viver. Gostei de saber que viestes de diferentes lugares do norte peruano para celebrar esta alegria do Evangelho.

Os discípulos de ontem, como muitos de vós hoje, ganhavam a vida com a pesca. Saíam em barcos, como alguns de vós continuam a fazer nos «cavalinhos de totora» [pequenas embarcações monoposto construídas com uma planta chamada totora]; e tanto eles como vós com o mesmo fim: ganhar o pão de cada dia. A isto se destinam muitas das nossas canseiras diárias: poder levar por diante as nossas famílias e dar-lhes aquilo que as ajudará a construir um futuro melhor.

Esta «lagoa com peixes dourados», como a quiseram chamar, tem sido fonte de vida e bênção para muitas gerações. Ao longo do tempo soube nutrir sonhos e esperanças.

Vós, como os apóstolos, conheceis a força da natureza e tendes experimentado as suas estocadas. Como eles enfrentaram a tempestade no mar, assim a vós coube enfrentar a dura estocada do «Niño costiero», cujas dolorosas consequências ainda se fazem sentir em tantas famílias, especialmente naquelas que ainda não puderam reconstruir as suas casas. Foi por isso também que quis vir e rezar aqui convosco.

Trazemos para esta Eucaristia, também aquele momento tão difícil que interpela e muitas vezes põe em dúvida a nossa fé. Queremos unir-nos a Jesus. Ele conhece o sofrimento e as provações; passou por todos os sofrimentos para nos poder acompanhar nos nossos. Na cruz, Jesus quer estar perto de cada situação dolorosa para nos dar a mão e ajudar a levantar. Porque Ele entrou na nossa história, quis compartilhar o nosso caminho e tocar as nossas feridas. Não temos um Deus alheio àquilo que sentimos e sofremos; pelo contrário, no meio da dor, dá-nos a sua mão.

Estas sacudidelas põem em discussão e em jogo o valor do nosso espírito e das nossas atitudes mais elementares. Então damo-nos conta de quanto é importante não estar sozinhos, mas unidos, cheios daquela unidade que é fruto do Espírito Santo.

Que aconteceu às virgens do Evangelho (cf. Mt 25, 1-13), que ouvimos? De repente, ouvem um grito que as acorda e põe em movimento. Algumas deram-se conta de não ter o azeite necessário para iluminar a estrada na escuridão, enquanto outras encheram as suas lâmpadas e puderam encontrar e iluminar a estrada que as levava ao esposo. No momento indicado, cada uma mostrou de que enchera a sua vida.

O mesmo acontece connosco. Em certas circunstâncias, compreendemos com que enchemos a nossa vida. Como é importante encher as nossas vidas com aquele azeite que permite acender as nossas lâmpadas nas múltiplas situações de escuridão e encontrar a estrada para avançar!

No Perú, Papa pede defesa da esperança e luta contra a corrupção


VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO AO CHILE E PERU
(15-22 DE JANEIRO DE 2018)

ENCONTRO COM AS AUTORIDADES, 
A SOCIEDADE CIVIL E O CORPO DIPLOMÁTICO

DISCURSO DO SANTO PADRE

Lima - Pátio de Honra do Palácio do Governo
Sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Senhor Presidente,
Membros do Governo e do Corpo Diplomático,
Distintas Autoridades
Representantes da sociedade civil,
Senhores e senhoras todos!

Ao chegar a esta casa histórica, dou graças a Deus pela oportunidade que me concedeu de pisar, uma vez mais, solo peruano. Gostaria que as minhas palavras fossem de saudação e agradecimento para cada um dos filhos e filhas deste povo que soube conservar e enriquecer, no decurso dos tempos, a sua sabedoria ancestral que é, sem dúvida alguma, um dos seus principais patrimónios.

Obrigado, Senhor Presidente Pedro Pablo Kuczynski, pelo convite a visitar o país e pelas palavras de boas-vindas que me dirigiu em nome de todo o seu povo.

Venho ao Perú, sob o lema «unidos pela esperança». Deixai que vos diga que olhar esta terra é, de por si, um motivo de esperança.

Parte do vosso território é formado pela Amazônia, que visitei esta manhã e que, na sua totalidade, constitui a maior floresta tropical e o sistema fluvial mais extenso do planeta. Este «pulmão», como houveram por bem chamá-la, é uma das áreas de grande biodiversidade no mundo, porque abriga as espécies mais variadas.

Possuís uma pluralidade cultural muito rica e cada vez mais interativa, que constitui a alma deste povo. Alma marcada por valores ancestrais como são a hospitalidade, a estima do outro, o respeito e a gratidão pela mãe-terra e a criatividade para novos projetos, bem como a responsabilidade comunitária pelo progresso de todos que se faz solidariedade, tantas vezes demonstrada nas várias catástrofes experimentadas.

Neste contexto, gostaria de salientar os jovens, que são o presente mais vital que esta sociedade possui. Com o seu dinamismo e entusiasmo, prometem e convidam a sonhar um futuro de esperança que nasce do encontro entre o cúmulo da sabedoria ancestral e os novos olhos com que nos presenteia a juventude.

Congratulo-me também com um fato histórico: saber que a esperança nesta terra tem um rosto de santidade. O Perú gerou Santos que abriram caminhos de fé para todo o continente americano; Santos como – para nomear apenas um – Martinho de Porres, filho de duas culturas, mostrou a força e a riqueza que nascem nas pessoas quando colocam o amor no centro da sua vida. E poderia continuar longamente esta lista material e ideal de razões de esperança. O Perú é terra de esperança, que convida e desafia para a unidade de todo o seu povo. Este povo tem a responsabilidade de permanecer unido, para, entre outras coisas, defender precisamente todos estes motivos de esperança.

Sobre esta esperança, estende-se uma sombra, levanta-se uma ameaça. «Nunca a humanidade – escrevi na carta encíclica Laudato si’ – teve tanto poder sobre si mesma, e nada garante que o utilizará bem, sobretudo se se considera a maneira como o está a fazer».[1] Isto manifesta-se claramente no modo como estamos a despojar a terra dos recursos naturais, sem os quais nenhuma forma de vida é possível. A perda de florestas e bosques supõe não só o desaparecimento de espécies, que poderiam inclusive significar no futuro recursos extremamente importantes, mas também a perda de relações vitais que acabam por alterar todo o ecossistema.[2]

Perú: Papa se encontra com as crianças


VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO AO CHILE E PERU
(15-22 DE JANEIRO DE 2018)

ENCONTRO NO LAR «O PRINCIPEZINHO»

DISCURSO DO SANTO PADRE

Puerto Maldonado - Hogar Principito
Sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Amados irmãos e irmãs,
Queridos meninos e meninas!

Muito obrigado por esta linda receção e pelas palavras de boas-vindas. Ver-vos cantar e dançar enche-me de alegria.

Quando me referiram a existência deste Lar «O Principezinho» e da Fundação Apronia, pensei que não podia partir de Puerto Maldonado, sem vos saudar. Quisestes congregar-vos, vindos de diferentes casas, neste lindo Lar «O Principezinho». Obrigado pelos esforços que fizestes para estar aqui hoje.

Acabamos de celebrar o Natal. Enterneceu-nos o coração a imagem do Menino Jesus. Ele é o nosso tesouro, e vós meninos, sendo o seu reflexo, sois também o nosso tesouro, o tesouro de todos nós, o tesouro mais precioso de que devemos cuidar. Perdoai as vezes que nós, grandes, não o fazemos ou não vos damos a importância que vós mereceis. Quando fordes grandes, não vos esqueçais disto. O vosso olhar, a vossa vida requerem um compromisso e esforços sempre maiores para não ficarmos cegos ou indiferentes perante tantas outras crianças que sofrem e passam necessidade. Não há dúvida, vós sois o tesouro mais precioso de que devemos cuidar.

Queridos meninos do Lar «O Principezinho» e jovens dos outros centros de acolhimento! Às vezes, alguns de vós sentem-se tristes à noite, tendes saudade do pai ou da mãe que não estão convosco, e sei também que há feridas que doem muito. Dirsey, foste corajoso, ao partilhá-lo connosco. E dizias-me: «que a minha mensagem seja luz de esperança». Mas deixa-me dizer-te uma coisa: a tua vida, as tuas palavras e as de vós todos são luz de esperança. Quero agradecer-vos o vosso testemunho. Obrigado porque sois luz de esperança para todos nós.

Alegra-me ver que tendes um lar onde sois acolhidos, onde vos ajudam, com carinho e amizade, a descobrir que Deus vos segura nas suas mãos e coloca sonhos no vosso coração. É belo isto.

Como é belo o vosso testemunho de jovens que passastes por esta estrada, que ontem vos enchestes de amor nesta casa e hoje pudestes construir o vosso próprio futuro! Sois para todos nós o sinal das potencialidades imensas que cada pessoa tem. Para estes meninos e meninas, vós sois o melhor exemplo a seguir, a esperança de que também eles hão de conseguir. Todos nós precisamos de modelos para imitar; as crianças precisam de olhar em frente e encontrar modelos positivos: «quero ser – sentem e dizem – como ele, quero ser como ela». Tudo o que vós, jovens, puderdes fazer, como vir estar com eles, jogar, passar o tempo, é importante. Sede para eles, como dizia o «Principezinho», as estrelinhas que iluminam a noite.[1]

Perú: Encontro do Papa com a população de Puerto Maldonado


VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO AO CHILE E PERU
(15-22 DE JANEIRO DE 2018)

ENCONTRO COM A POPULAÇÃO

DISCURSO DO SANTO PADRE

Puerto Maldonado - Instituto Jorge Basadre 
Sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Queridos irmãos e irmãs!

Vejo que viestes não só das diversas regiões desta Amazónia peruana, mas também dos Andes e doutros países vizinhos. Como é linda a imagem da Igreja que não conhece fronteiras e onde todos os povos podem encontrar o seu espaço! Como precisamos destes momentos em que podemos encontrar-nos e, independentemente da proveniência, encorajar-nos a gerar uma cultura do encontro que nos renova na esperança.

Obrigado, D. David, pelas suas palavras de boas-vindas. Obrigado, Arturo e Margarita, por terdes partilhado as vossas experiências com todos nós. Eles disseram-nos: «Visita-nos nesta terra tão esquecida, ferida e marginalizada... mas não somos terra de ninguém». Obrigado por no-lo terdes dito: não somos terra de ninguém. É algo que é preciso dizer com força: vós não sois terra de ninguém. Esta terra tem nomes, tem rostos: tem-vos a vós.

A região é designada com o nome muito belo de «Madre de Dios [Mãe de Deus]». Não posso deixar de fazer menção de Maria, jovem mulher que vivia numa aldeia remota, perdida, considerada também por muitos como «terra de ninguém». Lá recebeu Ela a saudação e o convite maior que uma pessoa possa experimentar: ser a Mãe de Deus; há alegrias que só as podem escutar os pequeninos.[1]

Vós tendes em Maria, não só uma testemunha para quem olhar, mas uma Mãe e, onde houver uma mãe, não existe esse mal terrível de sentir que não pertencemos a ninguém, esse sentimento que nasce quando começa a desaparecer a certeza de pertencer a uma família, a um povo, a uma terra, ao nosso Deus. Queridos irmãos, a primeira coisa que gostaria de vos transmitir – e quero fazê-lo com força – é que esta não é uma terra órfã, é a terra da Mãe! E, se há uma mãe, há filhos, há família e há comunidade. E onde há mãe, família e comunidade, os problemas poderão não desaparecer, mas certamente encontra-se força para os enfrentar de maneira diferente.

É triste constatar que há alguns que querem apagar esta certeza e tornar a Madre de Dios uma terra anônima, sem filhos, uma terra infecunda. Um lugar que se deixe facilmente vender e explorar. Por isso, faz-nos bem repetir nas nossas casas, nas comunidades, no mais fundo do coração de cada um: esta não é uma terra órfã! Tem uma Mãe! Esta boa notícia é transmitida de geração em geração, graças ao esforço de muitos que partilham este dom de saber que somos filhos de Deus, e ajuda-nos a reconhecer o outro como irmão.

Já, em várias ocasiões, me referi à cultura do descarte. Uma cultura que não se contenta apenas com excluir – como estávamos habituados a pensar –, mas que cresceu silenciando, ignorando e rejeitando tudo o que não serve aos seus interesses; parece que o consumismo alienante de alguns não consegue perceber a dimensão do sofrimento sufocante de outros. A cultura do descarte é uma cultura anônima, sem laços, nem rostos. Uma cultura sem mãe, que só quer consumir. A terra é tratada dentro desta lógica. As florestas, os rios e as torrentes são aproveitados, utilizados até ao último recurso, e depois deixados como baldios e inúteis. As próprias pessoas são tratadas com esta lógica: são usadas até ao exaurimento e depois deixadas como «inúteis». Esta é a cultura do descarte: descartam-se as crianças, descartam-se os idosos. Lá, na saída, quando fiz o percurso, havia uma avó de 97 anos: devemos descartar aquela avó? Não! Porque a avó tem a sabedoria dum povo. Um aplauso para a avó de 97 anos!

domingo, 21 de janeiro de 2018

Peru: Papa se encontra com povos da Amazônia e defende respeito e reconhecimento para com os povos nativos


VIAGEM APOSTÓLICA DO PAPA FRANCISCO AO CHILE E PERU
(15-22 DE JANEIRO DE 2018)

ENCONTRO COM OS POVOS DA AMAZÔNIA

DISCURSO DO SANTO PADRE

Puerto Maldonado - Coliseu Madre de Dios
Sexta-feira, 19 de janeiro de 2018

Queridos irmãos e irmãs!

Aqui, junto de vós, brota do meu coração o cântico de São Francisco: «Louvado sejais, meu Senhor». Sim, louvado sejais pela oportunidade que nos dais de termos este encontro. Obrigado D. David Martínez de Aguirre Guiné, senhor Héctor, senhora Yésica e senhora Maria Luzmila pelas vossas palavras de boas-vindas e pelos vossos testemunhos. Em vós, quero agradecer e saudar todos os habitantes da Amazónia.

Vejo que viestes dos diferentes povos originários da Amazónia: Harakbut, Esse-ejas, Matsiguenkas, Yines, Shipibos, Asháninkas, Yaneshas, Kakintes, Nahuas, Yaminahuas, Juni Kuin, Madijá, Manchineris, Kukamas, Kandozi, Quichuas, Huitotos, Shawis, Achuar, Boras, Awajún, Wampis, entre outros. Vejo também que nos acompanham povos originários dos Andes que chegaram à floresta e se fizeram amazónicos. Muito desejei este encontro. Quis começar daqui a visita ao Perú. Obrigado pela vossa presença e por nos ajudardes a ver mais de perto, nos vossos rostos, o reflexo desta terra. Um rosto plural, duma variedade infinita e duma enorme riqueza biológica, cultural e espiritual. Nós, que não habitamos nestas terras, precisamos da vossa sabedoria e dos vossos conhecimentos para podermos penetrar – sem o destruir – no tesouro que encerra esta região, ouvindo ressoar as palavras do Senhor a Moisés: «Tira as tuas sandálias dos pés, porque o lugar em que estás é uma terra santa» (Ex 3, 5).

Deixai-me dizer mais uma vez: Louvado sejais, Senhor, por esta obra maravilhosa dos povos amazónicos e por toda a biodiversidade que estas terras contêm!

Este cântico de louvor esboroa-se quando ouvimos e vemos as feridas profundas que carregam consigo a Amazónia e os seus povos. Quis vir visitar-vos e escutar-vos, para estarmos juntos no coração da Igreja, solidarizarmo-nos com os vossos desafios e, convosco, reafirmarmos uma opção sincera em prol da defesa da vida, defesa da terra e defesa das culturas.

Bolívia: Evo Morales anuncia que vai revogar temporariamente o novo Código Penal


O presidente da Bolívia, Evo Morales, anunciou no Twitter que decidiu revogar o novo Código Penal. Sem regras e prazos claros, a lei poderia ferir os direitos de ampla defesa e devido processo legal, além de permitir a perseguição religiosa. Desde a sua promulgação, em 15 de dezembro, o novo código desencadeou uma onda de protestos de vários setores da sociedade civil boliviana.

Ao canal estatal El Pueblo es Noticia, Morales declarou que “levou em conta as propostas do povo”. No Twitter, o presidente escreveu que decidiu revogar a lei para “evitar confusões e que a direita deixe de conspirar” e que enviará uma carta para o Congresso boliviano nos próximos dias. Anunciou também que vai “escutar propostas de todos os setores” e que ainda deseja substituir o atual código penal do país, que remonta à ditadura de Hugo Banzer (1971-1978). A oposição comemorou a decisão.  

Site do Vaticano denuncia problemas no novo código penal da Bolívia


A Secretaria Geral da Conferência Episcopal Boliviana (CEB), em nota divulgada esta quarta-feira, 17, posicionou-se sobre os fatos ocorridos na tarde de terça-feira, 16, em La Paz, quando a Polícia usou a força para entrar no Convento de São Francisco, adjacente à igreja de mesmo nome, para prender quatro jovens manifestantes.

Igreja é local de acolhida

Segundo os bispos, “tratou-se de um fato particularmente grave, pois se trata de um ambiente ligado a um local sagrado e protegido como patrimônio cultural e religioso”.

“Recordamos – dizem os prelados em uma nota – que no decorrer da história, antiga e recente, a igreja foi um local de acolhida e proteção de todos aqueles que se sentiam perseguidos, independente da posição política ou social das pessoas envolvidas”.

Respeito

Os bispos sublinham o grande número de manifestações nestes dias contra a promulgação do novo Código Penal e mais uma vez dirigem um apelo ao Governo para que escute estas vozes “com respeito e racionalidade”, sem responder com o uso da força, observando ainda que “tampouco ser protagonistas de um evento como o Rally Dakar justifica a repressão”.

Segundo a Constituição – recordam os prelados – “o povo tem o direito de expressar o seu protesto e de ser ouvido”.

Ao mesmo tempo, a CEB convida os cidadãos a manifestarem-se “de forma pacífica e respeitosa”. 

Dom Helder Câmara, patrono brasileiro dos Direitos Humanos.


“Felizes sereis quando os homens vos odiarem, expulsarem, insultarem e amaldiçoarem o vosso nome por causa do Filho do Homem. (…) pois era assim que os seus antepassados tratavam os profetas. (…) Ai de vós quando todos falarem bem de vós, pois era assim que seus antepassados tratavam os falsos profetas” (Lc 6, 22- 23 e 26).

Queridos irmãos e irmãs de nossa arquidiocese,

Todos nós fomos surpreendidos pela Lei n. 13581, de 26 de dezembro de 2017, aprovada pelo Congresso Nacional e sancionada pelo presidente da República Michel Temer. Declara Dom Helder Camara patrono brasileiro dos direitos humanos. 

Todos os brasileiros conscientes e que amam a justiça e o direito concordam que Dom Helder é nosso patrono em toda a luta pacífica pela justiça, pela paz e pelos direitos humanos, tanto individuais, como coletivos das minorias fragilizadas pela sociedade dominante. No entanto, nos surpreendemos pela ambiguidade desse decreto, sentimento já expresso por amigos de Dom Helder, inclusive, Marcelo Barros que escreveu uma profética carta dirigida ao Dom da Paz. O texto dessa lei é sucinto e não explicita motivações, nem consequências. No entanto, nenhum ato dessa natureza é neutro ou sem repercussões.

Em seu tempo, o profeta Jeremias adverte os governantes do seu povo: “Sem responsabilidade, querem curar as feridas do meu povo dizendo apenas Paz, Paz, quando paz verdadeira não existe. Deveriam envergonhar-se, pois o que fizeram foi horrível, mas não se acanham, mesmo eles não sabem o que é ter vergonha” (Jer 8, 11- 12).

É nossa responsabilidade de cidadãos e de cristãos dar peso às palavras e exigir dos poderes públicos coerência em seus posicionamentos. Se a Política que deveria ser um exercício nobre do serviço ao bem comum está tão desacreditada é porque os políticos não primam pela coerência entre o seu falar e o seu agir.