terça-feira, 2 de abril de 2019

Afinal, o STF acertou ao reconhecer a legalidade de sacrifícios de animais em rituais religiosos?


Você pode discordar, torcer o pescoço e xingar a decisão proferida pelo Superior Tribunal Federal, ao reconhecer à legalidade dos sacrifícios de animais em rituais religiosos. O fato é que isso não muda o que está escrito na Constituição Federal Brasileira, a lei máxima do país, aa qual o STF tem por obrigação zelar seu cumprimento.

Para entender a decisão é importante separar convicções religiosas, morais e até filosóficas do direito em si. Não cabe ao STF legislar acerca de doutrinas religiosas, nem sobre moralidade ou filosofia. À Corte cabe apenas observar se determinado ato está ou não em conformidade com a lei.

Ainda que possamos não concordar com o sacrifício de animais em rituais religiosos, é dever reconhecer que este é um direito garantido em consequência da liberdade de culto religioso, algo que, na prática, vale para qualquer religião.

"É inviolável a liberdade de consciência e de crença, sendo assegurado o livre exercício dos cultos religiosos e garantida, na forma da lei, a proteção aos locais de culto e a suas liturgias", diz o parágrafo VI do artigo 5° da Constituição Federal.

Note que está incluso "...e suas liturgias", indicando claramente que a forma de culto também é um direito adquirido, como observou o ministro Alexandre de Morais em seu voto:

"A oferenda dos alimentos, inclusive com a sacralização dos animais, faz parte indispensável da ritualística das religiões de matriz africana”, afirmou o magistrado, segundo o G1.

O direito à vida, também garantido na Constituição, não se aplica aos animais, mas apenas aos seres humanos. No âmbito dos rituais religiosos, o que é considerado "maus tratos" também não se aplica, visto que isso é relativo à interpretação da doutrina religiosa, algo que naturalmente pode ser visto de outra maneira por quem não professa determinada crença.

Assim, o STF entendeu que o sacrifício por si mesmo não constitui ilegalidade, nem maus tratos, até porque há muitas formas de sacrifício animal não contestadas pela sociedade, como o próprio abatimento para consumo e uso de derivados, como a pele e outras partes do animal. Ou seja, a finalidade religiosa é apenas uma entre tantas legalmente existentes, desde que atendendo certas condições.

O sacrifício animal na fenomenologia das religiões

A decisão do Supremo Tribunal Federal naturalmente foi associada às religiões de origens africanas. Isso, porque, o Brasil foi um dos grandes destinos dos escravos trazidos no passado pelos navios mercantes, sendo suas tradições uma das bases culturais religiosas em evidência no país.

No entanto, o sacrifício animal está presente também no islamismo e judaísmo até os dias de hoje, duas das maiores religiões do planeta, além do hinduísmo, religião de origem indiana, no xamanismo, de origem indígena, na bruxaria (na sua forma moderna, mais conhecida como Wicca), na maçonaria (ainda que muitos neguem o caráter religioso dessa organização) e no satanismo.

A prática, portanto, não é exclusividade do candomblé e suas variantes - conforme cada região, também chamado de Xangó, Umbanda, Catimbó ou Jurema, por exemplo. Se trata de um denominador comum acerca de uma fenomenologia que permeia vários entendimentos, sendo a expiação espiritual a principal delas.

No tocante ao cristianismo, não existe essa necessidade, exatamente porque a pessoa de Jesus Cristo encerrou a prática até então exercida pelo judaísmo. Os cristãos entendem que a lacuna espiritual existente devido ao pecado humano diante de Deus foi suprida pela morte e ressurreição de Cristo. Por isso Ele é chamado de "O Cordeiro de Deus".


Will R. Filho
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Opinião Crítica

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