sexta-feira, 9 de dezembro de 2016

O que esperar de um país que promove as mortes de inocentes?


Não é de hoje que a infamante tentativa de legalização do aborto espreita de maneira detestável a ordem pública.  E se a sua horrenda prática é repugnante quando defendida por uma militância que não sabe como anda e respira ao mesmo tempo, o que dirá quando a tentativa de legitimá-la parte de autoridades que, por dever de ofício, deveriam garantir a estabilidade e segurança social, com três agravantes:  o fazem ao arrepio da lei, de forma sorrateira e num dia em que a nação inteira foi abatida pela notícia de um trágico acidente aéreo?

Afinal, o que esperar de um país que promove a morte de inocentes?  A resposta não é tão simples e por mais louvável que seja observar e concluir que a sociedade hoje, em muitos aspectos, se assemelha a determinados contextos da história do povo de Israel, é urgente compreender como a legalização do aborto ameaça, gravemente, o futuro de todos nós e, por isso, é tão necessário combatê-la. 

O discurso definitivamente não é religioso, mas antes de tudo político e jurídico. 

Aborto

Não é recente a realização de seminários que tratam de estratégias para a descriminalização do aborto no Brasil, importando destacar que as organizações não governamentais, que defendem a sua legitimação, são financiadas por indústrias interessadas que, cada vez mais, mulheres adiram à prática.

Por essa razão é comum que tais ONGs não empenhem esforços na defesa e promoção de políticas públicas que beneficiem, efetivamente, o sexo feminino, sua dignidade e singularidade sob o ponto de vista humano e social, limitando-se a colocar as mulheres sempre em dicotomia com o sexo masculino, como se por imposição social restasse a elas apenas duas opções: se rebelarem contra o “sistema”, negando a sua natureza feminina, que é geradora de vida em todos os sentidos ou submeterem-se às mais diversas sortes de violência.

A verdade nua e crua é que os argumentos pró-aborto, geralmente pautados em pesquisas falaciosas, desenvolvidas sem qualquer critério científico, e comprovadamente com muitos erros técnicos (e éticos), por entidades partidárias de um determinado segmento comercial, ignoram o perfil procriador do sexo feminino, mutilando, assim, a sua integridade, já que faz parte do negócio incentivar as mulheres a repudiar aquele ser que ela concebeu, na plenitude de si, espoliando por via indireta os direitos, de um e de outro, que devem ser acolhidos e protegidos pela sociedade.

O problema da decisão no Supremo Tribunal Federal

O contexto processual, que gerou a liberação dos médicos abortistas – assim chamado, pois de fato praticaram o aborto e não foi a primeira vez –, e, “sugeriu” a descriminalização do aborto até o terceiro mês de gestação, aconteceu nos autos de um habeas corpus, que discutia a legalidade técnica da manutenção da prisão preventiva dos acusados, ou seja, o tipo penal ao qual respondiam os impetrantes, não fazia parte do libelo.

É fato que a “sugestão”, embora não vincule em decisões outras, inclusive em instâncias inferiores, foi levada a termo, e abriu, de forma intencional, um precedente argumentativo, que fere o entendimento da norma positiva, promovendo uma prevaricação jurídica de grande monta, pois claramente carece de embasamento jurídico, processual, ético e científico, pondo em risco toda a sociedade. 

Não abordamos aqui, especificamente, a questão da ausência de legitimidade dos julgadores quanto à questão da ilegalidade do ato de tomar para si a competência de legislar, em afronta ao princípio da independência dos poderes, posto que se trata de uma aberração à parte.

O fato é que o aborto é um crime contra a vida, conforme o normativo constitucional (art. 5º), o Pacto de São José, ao qual o Brasil é signatário, e que declara a inviolabilidade da vida desde a concepção e, os Códigos Penal (art. 128) e Civil (art.2), não sendo lícito o judiciário mudar isso, nem mesmo sob o argumento da livre interpretação da lei.

Cabe lembrar que a “sugestão” proferida nos autos do habeas corpus já nos adianta o que podemos esperar do julgamento da ação que visa legalizar o aborto de crianças com microcefalia, infectadas pelo Zika Vírus, marcada para o próximo dia 7 de dezembro.

Mesmo sem amparo legal e ainda que os registros médicos recentes demonstrem a evolução no tratamento que visa à melhoria da qualidade da vida dessas crianças, caso a opinião pública não se insurja contra tamanha afronta jurídica e humana, estaremos diante do horror da prática da eugenia institucionalizada.

E assim, não é um exagero afirmar que se uma vez legalizada a eugenia no Brasil, estaremos a poucos passos para a legalização também da eutanásia. 

O que tudo isso significa na prática? O que podemos esperar com a desvalorização e descarte da pessoa humana? Estaremos todos, desde a concepção até a morte, a mercê de interesses que definitivamente não nos protegem.

O falso discurso de proselitismo

A contraposição à fé e até o escárnio sobre ela são, sem dúvida, instrumentos utilizados para abrir os caminhos para se alcançar a meta ideológica de tais grupos, que também, cada vez mais, investem em desestabilizar e destruir a família, alicerce da sociedade civil. Porém, para eles, não se trata de combater a fé, pela fé, mas combater os valores absolutos e, portanto, sacros que nela estão inseridos.

E porque a Igreja defende a vida, a dignidade da pessoa humana e a família, tornou-se um obstáculo para os organismos pró-aborto e de ideologia de gênero, e isso explica a razão dos discursos que defendem, por exemplo, a retirada dos símbolos da fé cristã, em especial, dos órgãos públicos, sob a frágil alegação de que o Estado é laico e que mantê-los expostos é prova do proselitismo religioso.

No mesmo sentido, é a oposição do ensino religioso confessional nas escolas e as tentativas de tornar igualitária a união de pares e o casamento.

A ação de tais grupos gira assim em torno da imposição de uma ditadura sectarista, com objetivo de acabar com tudo o que remete à cultura judaico-cristã, e para isso alguns militantes já ameaçam, expressamente, pegar em armas para alcançar seus objetivos sindicais.

Tais grupos usurpam a liberdade democrática e se articulam para que em toda base educacional, cultural e jurídica da sociedade seja desconstruída e, sobre ela, criada uma nova realidade, na qual a submissão ao sistema, lardeada de políticas populistas, visam silenciar a população.

Desta forma reafirma-se que o discurso não é religioso; o que temos diante de nós é uma articulação de domínio político, que busca sua legitimidade de forma ardilosa, numa afronta ao Estado Democrático de Direito e contra os valores sociais concebidos através da dinâmica histórica e cultural que permeiam a nação brasileira. 


Michelle Figueiredo Neves,
Ministra do Acolhimento
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Arquidiocese do Rio de Janeiro

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