quarta-feira, 10 de agosto de 2016

Santa Filomena




Existia na Grécia, um pequeno Estado, no qual o Rei não tinha filhos, pois, sua esposa a Rainha era estéril, e sentiam grande desgosto por não terem quem sucedê-los no trono. Apesar de não serem cristãos, tinham na corte um médico cristão, muito fervoroso, que os convenceu a fazerem um pedido a Jesus. Se Jesus lhes fizesse o milagre de lhes dar um filho, se tornariam cristãos; e obtiveram, nascendo uma linda menina no dia 10 de janeiro e, lhe deram o nome de LUMENA, que quer dizer "Luz da Fé", e ao batizar acrescentaram a palavra FILO, que quer dizer "Filho da Luz", e assim ficou o nome de FILOMENA.

Aos doze anos fez votos de virgindade, tornando-se assim esposa de Jesus. Quando tinha 13 anos o imperador Romano Deocleciano declarou guerra a seu pai, injustamente, este como não tinha possibilidade de enfrentá-lo foi a Roma com sua esposa e filha pedir ao imperador súplica pelo seu povo. O imperador, ao ver a beleza deslumbrante daquela linda menina lhe disse: "Não te assustes, eu não te faço mais guerra, mas porei os meus soldados a teu lado contanto que me dês tua linda filha em casamento", estes, com muita alegria, aceitaram tal proposta, ao que Santa Filomena contestou energicamente, dizendo que já estava comprometida com Jesus seu Divino Esposo.

Seus pais e o imperador fizeram de tudo para convencê-la, mas foi inútil. Então, o tirano imperador vendo-se humilhado mandou prendê-la e torturá-la horrivelmente, pensando assim conseguir o seu intuito, mas ela, quanto mais sofria, mais amava a Jesus; no fim de 37 dias de sofrimentos indizíveis, Nossa Senhora lhe apareceu na prisão, a curou de suas chagas e lhe restituiu a sua beleza, ficando mais formosa do que antes e lhe disse: "Sofrerás mais três dias, depois, Eu e meu amado Filho te levaremos para o céu". O Carrasco ao presenciar estes prodígios, se converteu e se tornou cristão com toda a sua família. O imperador, ao ver-se vencido, o amor que tinha por ela, transformou-se em ódio e por isso mandou flechá-la, mas as flechas não a acertaram; pensando ser os deuses dela que as desviavam, mandou aquecer as flechas no fogo e atirar nela, mas as flechas em fogo, no lugar de a acertar voltaram para trás e mataram seis flecheiros. Depois de derrotado com este prodígio, mandou jogá-la no rio Tibre com uma âncota ao pescoço; veio um anjo e cortou a corda, a âncora foi para o fundo, onde se encontra até hoje, e Ela nem sequer molhou os vestidos.

A multidão que presenciava estes prodígios se converteu e glorificou a Deus. Então o tirano não suportando mais a cólera deu ordens para que fosse decapitada e assim sua alma voou gloriosamente para o céu, no dia 10 de agosto, numa sexta-feira, às três horas da tarde como seu Divino Esposo Jesus.

O corpo de Santa Filomena foi encontrado nas escavações das catacumbas em Roma no dia 25 de maio de 1802, no reinado do Papa Pio VII. O Padre Francisco de Lúcia da cidade de Munhamo Del Cardinali (Itália), queria levar as relíquias de um santo para sua paróquia e foi a Roma, à Santa Sé solicitá-lo. Quando estava no salão onde estão as relíquias dos Santos, deparou com as relíquias de Santa Filomena e disse: "Santa Filomena, se quiseres que eu leve suas relíquias para minha paróquia, alcançai-me de Jesus esta graça que era uma graça muito importante". Antes de chegar à sua paróquia, já tinha alcançado a graça. Então voltou à Santa Sé, narrando a graça alcançada e obteve o seu pedido levando triunfalmente as relíquias para sua paróquia. Assim que lá chegou começou a fazer tantos milagres que vinha gente de toda a Itália e da Europa, a pedir e agradecer as graças. Muitos papas foram devotos de Santa Filomena, entre eles, o Papa Pio IX, que no dia 7 de novembro de 1849, celebrou a Santa Missa no altar onde estão as Santas Relíquias, e no dia 15 de janeiro de 1857, concedeu ofício próprio com Missa. Em 30 de abril de 1884, o Papa Leão XIII, aprovou, consagrou e indulgenciou o cordão de Santa Filomena.

Santa Filomena, Padroeira do Rosário Vivo e Padroeira dos Filhos de Maria, rogai por nós!

Oh! gloriosa Virgem e Mártir Santa Filomena, que do Céu onde reinais vos comprazeis em fazer cair sobre a Terra benefícios sem conta, eis-me aqui prostrado a vossos pés para implorar-vos socorro para minhas necessidades que tanto me afligem, vós que sois tão poderosa junto a Jesus, como provam os inumeráveis prodígios que se operam por toda parte onde sois invocada e honrada. Alegro-me ao ver-vos tão grande, tão pura, tão santa, tão gloriosamente recompensada no céu e na terra. Atraído por vossos exemplos à prática de sólidas virtudes e cheio de esperança à vista das recompensas concedidas aos vossos merecimentos, eu me proponho de vos imitar pela fuga do pecado e pelo perfeito cumprimento dos mandamentos do Senhor. Ajudai-me, pois, oh! grande e poderosa Santinha, nesta hora tão angustiante em que me encontro, alcançando-me a graça ... e sobretudo uma pureza inviolável, uma fortaleza capaz de resistir a todas as tentações, uma generosidade de que não recuse a Deus nenhum sacrifício e um amor forte como a morte pela fé em Jesus Cristo, uma grande devoção e amor a Maria Santíssima e ao Santo Padre, e ainda a graça de viver santamente a fé para um dia estar contigo no céu por toda a eternidade.
 
POLÊMICA

A existência de Santa Filomena é posta em dúvida por razões plausíveis. Visto, porém, que não se pode provar a não existência, é lícito venerá-la. A Igreja houve por bem retirar do seu calendário litúrgico a festa dessa santa.

O histórico da devoção (geralmente ignorado) será suficiente para dissipar a maioria das dúvidas recém-suscitadas.

Até 1802 não se conhecia a famosa devoção a Santa Filomena na Igreja.

Aconteceu, porém, que aos 25 de maio de 1802 (época em que os arqueólogos começaram a estudar os cemitérios da antiguidade) descobriram nas catacumbas de Sta. Priscila em Roma, junto à via Salária, um túmulo recoberto por três fragmentos de lápide; sobre esses destroços lia-se uma inscrição em tinta vermelha assim concebida:

LU M E NA

PAXTE

C U M

F I

Tais letras estavam acompanhadas de desenhos simbólicos, como duas âncoras, uma palma, três setas, folhas de hera (ou, conforme alguns, um lírio). No interior do túmulo os exploradores encontraram ossos que eles julgaram ser os despojos de uma jovem donzela dos seus treze ou quinze anos de idade, a qual morrera com o crânio fraturado. Encontraram outrossim uma ampola que parecia conter sangue e que, em conseqüência, foi considerada sinal de que a donzela morrera como mártir da fé. A palma do epitáfio parecia corroborar a suposição do martírio, no caso; as setas que a acompanhavam, indicariam o instrumento da morte. Além do mais, a idade muito tenra atribuída à defunta fazia crer que fora virgem. Quanto ao nome da jovem sepultada, os descobridores não hesitaram em recompô-lo invertendo a ordem dos dizeres das placas de modo a ler:

PAX       TECUM       FILUMENA
"A paz esteja contigo, ó Filomena!".

Filumena é particípio passivo grego, que significa "amada, dileta" (alma?... Virgem?... Mártir?...). O vocábulo, porém, foi tomado como nome próprio da presumida virgem e mártir do sepulcro.

Concluíram os arqueólogos que haviam descoberto as relíquias de uma grande santa da antigüidade, cuja existência fora ignorada até então. Esses despojos mortais foram então extraídos das catacumbas e levados para a Custódia central das Relíquias em Roma. Em breve, o cônego Francisco di Lúcia solicitou-as instantemente e obteve-as para a aldeia de Mugnano, no sul da Itália, para onde os despojos mortais foram transportados aos 10 de agosto de 1805. Já que todos julgavam tratar-se de uma verdadeira santa, os fiéis começaram a invocá-la.

Note-se bem que não era necessário nem processo de canonização nem pronunciamento explícito da autoridade suprema da Igreja no caso, pois os santos anteriores ao séc. X não eram objeto de processo jurídico de canonização, mas eram simplesmente aclamados pela voz do povo (cf. PR 13/1959, qu. 5). No caso de Sta. Filomena, portanto, a devoção se baseava unicamente na suposta autenticidade da documentação e das interpretações que acabamos de mencionar.

Pouco depois da trasladação para Mugnano, uma Religiosa napolitana, Irmã Maria Luísa de Jesus, julgou ter recebido uma série de revelações a respeito da vida e do martírio de Santa Filomena. Na base de tais revelações foi então redigida a biografia de Santa Filomena, Virgem e Mártir: narrava-se aí que fora filha de um rei da Grécia e padecera sob o Imperador Diocleciano (+ 305), que a queria violentar.

A devoção se foi consequentemente expandindo pela Itália e França; a sua popularidade tomou incremento extraordinário em vista da cura aparentemente milagrosa da Venerável Pauline Marie Jaricot, fundadora da Obra da Propagação da Fé, a qual, já moribunda, teria recuperado a saúde por intercessão de Santa Filomena! Em Ars, o santo cura João Maria Vianney (1786-1859) nutria grande estima para com Santa Filomena, chamando-a "sua cara santinha", e atribuindo-lhe numerosos favores; Filomena tornou-se assim a "taumaturga do séc. XIX". Tendo em vista os avultados benefícios, tanto espirituais como temporais, que comumente se derivavam da devoção a essa santa, a Sagrada Congregação dos Ritos, órgão oficial da Santa Sé que tratava do culto divino, em 1837 autorizou a sua veneração pública, estabelecendo a respectiva festa anual no dia 11 de agosto; em 1855 a mesma S. Congregação aprovou um formulário de Missa e um ofício para esse dia (note-se: o oficio era simplesmente do "Comum das Virgens Mártires"; tinha apenas uma leitura própria em Matinas, leitura, porém, que nada afirmava dos traços biográficos ou da cena de martírio de Filomena).

Nos últimos tempos, cerca de 300.000 devotos visitavam anualmente os despojos mortais de Sta. Filomena em Mugnano (Itália); elevado número de igrejas (somente nos Estados Unidos, cem igrejas), associações e pessoas foram colocadas sob o seu patrocínio...

Isso tudo, porém, não impediu que em tempos recentes os doutos, mesmo católicos, tenham começado a manifestar reservas frente ao culto de Sta. Filomena; os conhecimentos de história antiga, de arqueologia, tendo progredido, havendo-se esmerado também o senso de crítica e exatidão científicas, os estudiosos perceberam a precariedade da documentação histórica sobre a qual se apoiava a devoção à santa.

Com efeito, os arqueólogos averiguaram que as ditas "ampolas de sangue" das antigas sepulturas na verdade não contêm sangue, nem são indícios de despojos de algum mártir. Verificaram outrossim que os símbolos do epitáfio encontrado sobre os ossos de Filomena têm significado assaz genérico: a âncora lembra a cruz de Cristo e a esperança do cristão, a palma indica o galardão de que no céu goza todo discípulo fiel, as flechas e as folhas de hera servem apenas para separar as palavras entre si.

Quanto à reconstituição do nome "Filomena" e à atribuição do mesmo à defunta encontrada, observou-se que se baseava em hipótese igualmente inconsistente. Sim, no séc. IV, após a concessão de paz à igreja (313), as catacumbas de Roma foram sendo rebuscadas por cristãos devotos, que desejavam extrair os corpos dos mártires e justos mais famosos da antiguidade; abriam, portanto, as sepulturas, removendo as lápides sepulcrais ou os epitáfios. Ora, quando sepultavam novos mortos nas catacumbas do séc. IV, os respectivos túmulos eram muitas vezes fechados com lápides dos antigos sepulcros; ao aproveitar, porém, essas lápides, os "fossores" ou coveiros faziam questão de as misturar entre si, tomando fragmentos de mais de uma sepultura primitiva destituídos de nexo recíproco, justamente para evitar que se cresse que os ossos recém-sepultados em tal lugar pertenciam a tal ou tal defunto mais antigo.

Não estaria fora de propósito conjeturar que isto se tenha dado no caso de "Santa Filomena"; os três fragmentos que recobriam os ossos encontrados não proviriam de sepulturas mais antigas? Não teriam sido reunidos mais ou menos ao acaso? Suposto isto, a reconstituição do nome "Filomena" (a partir de LUMENA na primeira lápide e Fl na terceira) careceria de fundamento; poder-se-ia mesmo perguntar se existiu uma santa mártir com o nome de "Filomena"; LUMENA e Fl poderiam entrar na composição de muitas palavras das quais as outras partes estariam perdidas.

Na base das considerações acima, já havia vários anos que no seio mesmo da Igreja se levantavam dúvidas a respeito da existência de Santa Filomena, quando o Santo Padre João XXIII houve por bem mandar cancelar do calendário oficial da Igreja a festa dessa santa; para isso, S. Santidade baseava-se na falta de certeza concernente à historicidade mesma de Sta. Filomena.

Como se vê, essa atitude da Santa Sé não foi adequadamente compreendida por um dos jornais do Rio de Janeiro, que publicou a seguinte notícia: "Não há mais Santa Filomena - acaba de decretar o Vaticano". A frase dá a entender que é o Vaticano quem faz e desfaz os santos, como se estes não passassem de produtos da imaginação ou do senso piedoso das autoridades eclesiásticas e dos devotos.

Aliás, a determinação da Santa Sé relativa a Santa Filomena fazia parte de amplo projeto de remodelação da Liturgia sobre bases muito simples e claras, remodelação que naturalmente tendia a remover da piedade cristã os motivos de devoção que carecessem de seguro fundamento histórico.

Tomando a rigor a disposição da S. Congregação dos Ritos, verifica-se que não é proibida a devoção particular a Santa Filomena; apenas o culto litúrgico foi atingido pelo decreto. Se alguém, portanto, julga que a precária documentação existente sobre Sta. Filomena merece crédito, pode dirigir-se a essa santa; era o que se fazia de boa fé no século XIX. Em nossos dias, porém, é de desejar que nenhum cristão, por mais piedoso que seja, feche os olhos voluntariamente às conclusões dos estudiosos, contentando-se com uma piedade de fantasia alheia à realidade dos fatos.

São estes os precedentes que elucidam o "caso de Santa Filomena", permitindo-nos verificar que muito acertada foi a determinação de Roma ao cancelar do seu calendário oficial a festa da santa: a piedade só pode lucrar ao se deixar guiar pelas luzes da verdade.

Na verdade, a Igreja nunca se pronunciou por seu magistério solene e infalível em favor da existência de Santa Filomena. Sua atitude foi, como dissemos, simplesmente a seguinte: em 1802 encontraram-se ossos que, com alguma verossimilhança, foram atribuídos pelos arqueólogos a uma santa dita "Filomena", virgem e mártir do séc. IV; a verossimilhança da atribuição parecia suficiente e aceitável naquele início do século XIX, época de exíguo senso crítico. Ora, visto que se apresentava Filomena como santa do século IV, as autoridades da Igreja não se viam, no caso, obrigadas a instaurar processo de canonização; a declaração de santidade (ou a canonização) de Filomena devia ser suposta; teria sido feita pela voz do povo cristão antigo, como era costume antes do século X (cf. PR 13/1959, qu. 5). Em consequência, os Romanos Pontífices, os bispos e o povo católico foram aceitando "Santa Filomena"; as graças atribuídas à sua intercessão só faziam corroborar a crença na santa. A colocação no calendário litúrgico aos 11 de agosto de modo nenhum implica em definição infalível; era apenas medida de disciplina,... medida sujeita a reforma desde que tal disciplina se evidenciasse inoportuna; as autoridades da Igreja introduziram a festa de Filomena unicamente por causa da devoção do povo cristão, devoção contra a qual nada se podia objetar, pois nada tinha de absurdo ou supersticioso (a questão da autenticidade da documentação pressuposta nem sequer se punha no século XIX).

Nos tempos atuais, porém, os estudiosos tendo verificado a precariedade de tal documentação, a Igreja não hesita em afirmar a evidência dos fatos: não permite que continue a ser celebrada na sua Liturgia oficial uma festa tão inseguramente assentada; quanto às manifestações de devoção pessoal a Santa Filomena, são toleradas... desde que os devotos julguem haver fundamento para crer na existência da santa. Tal atitude da Igreja está longe de ser uma "descanonização" ou "dessantificação", como se tem dito, pois nunca houve canonização oficial de Sta. Filomena; aconteceu mesmo mais de uma vez em épocas passadas que as autoridades eclesiásticas resolveram vedar o culto que o povo cristão começara a tributar a determinado santo. Cf. PR 13/1959, qu. 5.

Outra das dificuldades doutrinárias suscitadas pelo "caso de Santa Filomena" seria:

Como explicar os milagres atribuídos à Santa, caso se admita que esta não tenha existido? Tanto faz invocar Santos existentes como Santos não existentes?

Primeiramente, no tocante aos milagres convém lembrar que a Igreja não se empenha por afirmar a sua realidade; o magistério eclesiástico é, em geral, lento e cauteloso quando se trata de admitir portentos. Dado, porém, que os fiéis (e em particular o Cura d'Ars) tenham realmente obtido graças extraordinárias mediante a devoção a Santa Filomena, será preciso recordar que não são propriamente os Santos que fazem milagres e concedem graças, mas é o Senhor Deus quer distribui tais dons,... e os distribui principalmente em vista da fé e da devoção dos que os pedem na terra; no caso, portanto, da devoção a Santa Filomena, se houve milagres, estes foram realizados diretamente por Deus em resposta às piedosas disposições dos devotos; dado que Sta. Filomena não tenha existido, ela não intercedia (nem intercede) por seus devotos (como realmente intercede no céu um Santo existente), mas a figura da Santa servia ao menos de estímulo à piedade dos orantes; assim é que mesmo uma presumida "Santa Filomena" podia concorrer para a obtenção de graças extraordinárias do Céu (vinha a ser o incentivo subjetivo do zelo e da devoção dos que oravam).

Disto não se segue, é claro, que tanto faz invocar Santos existentes como invocar Santos inexistentes. A piedade e os afetos da alma, para que sejam dignos da natureza humana, devem ser iluminados pela verdade ou pela realidade das coisas. Caso, porém, alguém de boa fé se ache no erro, tomando como existente um Santo que não existiu, o Senhor não deixa de atender à boa fé de quem O suplica; Ele em tais casos corresponde às preces, não por causa do Santo inexistente, mas por causa das disposições sinceras de quem ora.

Foi justamente por averiguar que careciam de verdadeiro fundamento histórico que a S. Congregação dos Ritos mandou eliminar do calendário da Liturgia as festas de:

São Leão II (3 de julho), pois se evidenciou que nos antigos códigos litúrgicos a cifra II não significava um santo posterior a São Leão I, dito "Magno", Papa, mas designava o próprio São Leão I a ser celebrado pela segunda vez no ano (a primeira vez ocorria aos 11 de abril);

Santo Anacleto (13 de julho); verificou-se que este nome não era senão uma variante do nome São Cleto, que já tem sua festa a 26 de abril (a preposição aná em grego significa "de novo");

São Vital (28 de abril); também está comprovado que o santo celebrado com este nome em abril não difere do seu homônimo festejado aos 4 de novembro;

São João diante da Porta Latina (6 de maio); sob este título se comemorava um episódio cuja autenticidade foi reconhecida como assaz duvidosa: acreditava-se, com efeito, que o Apóstolo São João, diante da Porta Latina de Roma, fora atirado em um tanque de óleo a ferver, escapando, porém, incólume do perigo. Ora, já que a documentação referente a este particular é pouco fidedigna, a Igreja (que nunca definira o episódio como sendo real) houve por bem não mais o celebrar em sua Liturgia;

a Trasladação da Casa de Loreto (10 de dezembro); também por se ter observado que carece de suficiente documentação histórica, este episódio já não é objeto de celebração do culto oficial (cf. PR 12/ 1958, qu. 9, onde se expõem as origens da narrativa segundo a qual teria sido transferida pelos anjos para Loreto, Itália, a casa na qual se deu a Anunciação do Arcanjo Gabriel a Maria).

A confusão oriunda do cancelamento das referidas festas se deve a um pressuposto assaz comum: muitos dos nossos contemporâneos julgam que tudo que se faz na Igreja, é feito por ordem de Sua Santidade o Papa, envolvendo a sua autoridade suprema e infalível. - Na realidade, tal não se dá. Muitas práticas não essenciais à vida cristã se desenvolvem, na Igreja, de baixo para cima (não de cima para baixo), isto é, originam-se por iniciativa do povo devoto, não por decreto superior. As autoridades eclesiásticas deixam os fiéis agir enquanto não vêem superstição em tal ou tal prática popular e enquanto não se percebe motivo que desaconselhe a continuação. Desde, porém, que tal motivo se imponha, a Igreja intervém para vantagem do povo de Deus... Foi o que se deu nos casos que acabamos de percorrer.

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