domingo, 6 de março de 2016

2ª Dor de Nossa Senhora: A Fuga para o Egito


1. O próprio Jesus é espada de dor para Sua Mãe 

Ferida pelo caçador, aonde vai, leva a corça consigo a sua dor: carregando no corpo a seta cruel. Assim também Maria, depois do funesto vaticínio de S. Simeão levou conSigo a dor, que consistia na contínua memória da Paixão do Filho. Algrino aqui aplica o texto dos Sagrados Cânticos: Os cabelos de tua cabeça são como a púrpura do rei, que é atada em dobras (7, 8). Essa cabeleira cor de púrpura simboliza a constante contemplação da Paixão de Jesus. A Virgem a tinha tão viva diante dos olhos, como se já estivesse vendo o sangue a correr das chagas dEle. Era assim Jesus a espada que atravessava o coração de Maria. 

E, a medida que Ele Lhe parecia mais amável mais profundamente a feria a dor por ter de perdê-lO um dia. 

Consideremos agora a segunda espada de dor que feriu o coração de nossa Mãe, quando fugiu para o Egito, a fim de livrar o Menino-Deus da perseguição de Herodes. 

2. A ordem de fugir 

Mal ouviu Herodes que era nascido o Messias esperado, temeu loucamente que o recém-nascido lhe quisesse usurpar o trono. S. Fulgêncio de Ruspe censura-lhe a loucura, dizendo: Por que estás inquieto, Herodes? Esse rei, nascido agora, não vem para vencer os reis em combate. Não; ele vem para subjugá-los de um modo admirável, morrendo por eles. Esperava, pois, o ímpio rei lhe viessem os santos Magos revelar. o lugar do nascimento do real Menino, a fim de tirar-Lhe a vida. Vendo-se, contudo logrado, ordenou a morte de todos os meninos que então se achavam em Belém e seus arredores. Foi então que o anjo apareceu em sonhos a José com a ordem: Levanta-te, toma o Menino e Sua mãe, e foge para o Egito (Mt 2, .13). 

Segundo o parecer de Gerson, S. José avisou a Maria na mesma noite, e tomando ambos o, Menino Jesus, puseram-se a caminho. É isso o que se deduz das palavras do Evangelho: "E levantando-se, José tomou consigo, ainda noite, o Menino e Sua Mãe e retirou-se para o Egito". Ó Deus, disse então Maria (como contempla S. Alberto Magno), assim deve fugir dos homens aquele que veio para salvá-los? Logo conheceu a aflita Mãe como já começava a verificar-se no Filho a profecia de Simeão: Eis aqui está posto este Menino como alvo a que atirará a contradição (Lc 2, 34). Viu que, apenas nascido, já O perseguiam e queriam matar. "Que pesar para o coração de Maria, escreve S. Pedro Crisólogo, ao ouvir a intimação do cruel exílio ao qual Ela e o Filho eram condenados! 

Foge dos teus para os estranhos, do templo do verdadeiro Deus para a terra dos ídolos! Há lástima que se compare à de uma criança que, apenas nascida, já se vê obrigada a fugir, levada nos braços de sua Mãe? 

3. Incômodos da fugida

Bem, pode cada qual adivinhar o que padeceu Maria nessa viagem. Da Judéia ao Egito era muito longe a jornada. Com Sebastião Barradas, fala-se, geralmente, em mais de cem horas de caminho. Por isso a viagem durou pelo menos trinta dias. Além disso, como descreve Boaventura Barrádio, era o caminho desconhecido e péssimo, cortado de carrascais e pouco freqüentado. Estava-se no inverno e a Sagrada Família teve de viajar debaixo de aguaceiros, neves e ventos, por estradas alagadas e lamacentas. Quinze anos tinha então Maria; era uma donzela delicada, nada afeita a semelhantes viagens.

Finalmente não tinham os fugitivos quem lhes servisse. José e Maria, na frase de S. Pedro Crisólogo, não tinham nem criados nem criadas; eram senhores e criados ao mesmo tempo. Meu Deus! como excita a compaixão ver essa tenra virgenzinha, com esse Menino recém-nascido ao colo, fugindo por este mundo! Boaventura Baduário pergunta: Aonde iam comer e dormir? em que hospedagem ficariam? Qual podia ser o alimento deles, senão um pedaço de pão duro trazido por S. José ou recebido como esmola? Onde hão de ter dormido durante a viagem, especialmente durante as 50 horas da travessia do deserto, sem casas e hospedarias? Onde, senão sobre a areia ou debaixo de alguma árvore do bosque, ao relento, expostos aos ladrões e às feras, tão abundantes no Egito? Oh! quem encontrasse então esses três grandes personagens, tê-los-ia certamente tomado por ciganos e mendigos. 

4. A pobreza da Sagrada Família no Egito

No Egito Maria habitou em um lugar chamado Matarieh, conforme afirmam Burcardo de Saxônia e Jansênio Gandense, embora Strabo diga que moravam na cidade de Heliópolis*. Aí sofreram extrema pobreza, durante os sete anos que permaneceram escondidos, segundo S. Antonino e S. Tomás e outros autores. Eram estrangeiros, desconhecidos, sem rendimentos, sem dinheiro e sem parentes. A muito custo conseguiam sustentar-se com o fruto de suas fadigas. Por serem pobres, escreve S. Basílio, era-lhes bem penoso conseguir o indispensável para passar a vida. Ludolfo de Saxônia dá conta - e sirva isso de consolo aos pobres, - que tal era a pobreza de Maria, que muitas vezes nem tinha um pedaço de pão para o Filho, quando, obrigado pela fome, Lhe pedia algum. 

Morto Herodes, de novo apareceu em sonhos o anjo a José, ordenando-lhe que voltasse à Judéia. Aqui, descreve Boaventura Baduário a aflição da Santíssima Virgem pelo muito que sofreu Jesus durante o regresso. Tinha Ele então sete anos, sendo grande demais para os braços de Maria, e ainda pequeno para vencer a pé tão longas estradas. 

* Era Matarieh um subúrbio de Heliópolis e não deve ser trocado pela cidade de Mênfis, nem pela atual Cairo. – (Nota do tradutor).

5. Imitação da Sagrada Família pela paciência e desprendimento 

Jesus e Maria passaram pelo mundo como fugitivos. Eis aí uma lição para nós. Temos de viver na terra como peregrinos, sem apegos aos bens que o mundo nos oferece. Pois depressa teremos de deixá-los para passarmos à eternidade. "Não temos aqui cidade permanente, mas procuramos a futura" (Hb 13, 14). És um hóspede neste mundo; apenas o vês de passagem, acrescenta S. Agostinho. Aprendamos com Jesus e Maria a abraçar as cruzes, porque sem elas não podemos viver neste mundo. Neste sentido foi concedido à venerável Verônica de Binasco, agostiniana, acompanhar, numa visão, a viagem de Maria e do Menino Deus para o Egito. No fim da jornada disse-lhe a Mãe de Deus: Filha, viste com que trabalho chegamos a esta terra. Fica sabendo que ninguém recebe graças sem ter padecido. - Quem, entretanto desejar sentir menos os trabalhos desta vida, deve levar em sua companhia a Jesus e Maria. 

"Toma o Menino e Sua Mãe", disse o anjo a S. José. Àquele que traz com amor a esse Filho e a essa Mãe em seu coração, tornam-se leves e até suaves e agradáveis todas as penas. Amemo-lOs, portanto; consolemos Maria, acolhendo em nosso coração a Seu Filho, que hoje ainda continua a ser perseguido pelos pecados dos homens. 

EXEMPLO 

Um dia apareceu Nossa Senhora à venerável Coleta, religiosa franciscana, e mostrou-lhe o Menino Deus todo chagado, dizendo-lhe então: Vê, assim é que os pecadores tratam continuamente meu Filho; renovam-Lhe Sua morte e Minhas dores. Reza muito, minha filha, reza por eles para que se convertam. Semelhante visão teve Sóror Joana de Jesus e de Maria. Meditando na perseguição feita ao Menino Deus por Herodes, ouviu um ruído, como se gente armada andasse perseguindo alguém. Viu em seguida um menino muito formoso que, completamente esgotado, buscava refúgio junto dela. Joana - disse-lhe o Menino - ajuda-me a esconder-me; estou fugindo dos pecadores, que, como Herodes, me perseguem e querem matar. 

ORAÇÃO

Assim, pois, ó Maria, nem depois de Vosso Filho ter sido imolado pelos homens, que O perseguiram até à morte, cessaram esses ingratos de persegui-lO com seus pecados, e de afligir-Vos, ó Mãe dolorosa? E eu mesmo, ó meu Deus, não tenho sido um desses ingratos? Ah! minha Mãe dulcíssima, impetrai-me lágrimas para chorar tanta ingratidão. E pelas muitas penas que sofrestes na viagem para o Egito, assisti-me com Vosso auxílio na viagem que estou fazendo para a eternidade, afim de que possa um dia ir amar convosco meu Salvador perseguido, na pátria dos bem-aventurados. Amém.
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Vas Honorabile

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