segunda-feira, 21 de dezembro de 2015

Homilética: Solenidade do Natal do Senhor - Missa da Vigília* (24 de dezembro): "Hoje sabereis que o Senhor vem salvar-nos. Amanhã vereis a sua glória".




A glória de Deus se manifesta nesta noite Santa pelo nascimento do Salvador: “Magno cum gaudio Christum natum adoremus. Salvator noster, dilectissimi, natus est: gaudeamus”. Com Júbilo no coração adoremos Cristo nascido, com um novo cântico. Caríssimos, alegrai-vos pois, o nosso Salvador é Nascido! Celebração que pode ser de luz ou de trevas, de esperança ou de ilusão, de paz ou de conflito... Vai depender de com qual espírito estaremos revestidos. A festa automaticamente já acontece, por força de tradição. Para muita gente não passa disso: presentes, relacionamentos amistosos, votos, mesas fartas... É preciso abrir a mente e o coração para a graça, pois Deus está mandando seu próprio Filho para nos salvar. Será que vai haver lugar para o Menino nascer?

Hoje, na ceia do natal, nas grandes ou pequenas celebrações familiares, lembremo-nos de tantas pessoas cujo Natal reproduzirá o despojamento do Senhor em Belém, rezemos por elas e pensemos no que fazer para ajudar a esses nossos irmãos e irmãs necessitados.

Não quero estragar essa noite nem quero que tenhamos peso de consciência ao comermos o peru natalino e brindar com champanhe. Mas eu gostaria – isso sim – que não fôssemos superficiais nessa noite e percebêssemos que todo o nosso alvoroço frequentemente contrasta, e fortemente, com o acontecimento da gruta de Belém: Jesus, acompanhado da sua mãe e do seu pai adotivo, algumas ovelhas e vacas, a natureza silenciosa e… ninguém mais.

Assim, nesta Santa vigília, nos preparamos com grande alegria para esta notícia jubilosa: Jesus nasceu para nos salvar! Vamos nos centrar no principal do Natal: não as festas exteriores, mais a interioridade, a luminosidade que vem do Menino que é nos é dado, homem e Deus, em tudo igual a nós, exceto no pecado, com uma missão muito específica: apagar a mancha do antigo inimigo, o pecado original, e nos conceder a salvação eterna.

Reunidos nesta vigília, celebramos o mistério da encarnação do Filho do Altíssimo entre nós. Nosso olhar se volta para Belém, onde, numa manjedoura repousa o Menino Deus. O amor se fez criança, humilde e sereno. Nele está a plenitude da vida, nossa salvação. Hoje o presépio é o altar, pois nele repousa o Senhor que, na Eucaristia, se oferece a nós para nossa redenção. Bendizemos ao Pai que não hesitou em seu amor, oferecendo-nos seu Filho único, nascido de Maria, a Mãe do Redentor.   


A festividade do Natal, que enche sempre as nossas almas de alegria e comoção, recorda-nos que a Igreja, querida e fundada por Jesus, tem como finalidade o anúncio da Encarnação do Filho de Deus, que veio ao mundo para revelar a Verdade e salvar todos os homens. Alegremo-nos todos no Senhor, porque nasceu o nosso Salvador. Desceu hoje sobre nós a verdadeira paz.
Comentários dos Textos Bíblicos

1ª Leitura: Isaías 62, 1-5

A liturgia desta noite santa transcorre com a santa lembrança da preparação da vinda do Cristo na história da Salvação. A Primeira Leitura (cf.  Is. 62,1-5) retoma o nascimento de um príncipe, no tempo de Isaías, setecentos anos antes do nascimento de Cristo, que significa esperança para o povo abalado pelas invasões assírias. Deus volta a seu povo. A leitura situa-se no tempo pós-exílico. O profeta desempenha o papel de intercessor e consolador. Deus parece calar-se. Por isso, o profeta fala, lembra a Deus a necessidade de seu povo. Deus o atenderá, pois a Cidade Santa é sua jóia. Ele a reconstruirá, fará novas núpcias com ela.

Depois do edito de Ciro, que autoriza a volta do exílio e a reconstrução de Jerusalém, por volta de 538 ou 537 a.C., o profeta vê de novo a cidade protagonista da história da Salvação envolvida pelo amor de Deus. Este amor é descrito com termos extraídos de uma festa de núpcias, aos quais, porém, se acrescenta uma terminologia que evidencia o conteúdo salvífico da mensagem. O encontro de Deus com Jerusalém, encontro que se dá com a humanidade, no Natal, é justiça, isto é, sinal da ação salvífica de Deus, isto é, glória, isto é, sinal de que Deus ainda está no meio do povo; é salvação, enquanto Deus resgatou aquela que era desamparada e abandonada, povo no exílio ou humanidade afastada de Deus, e a desposou, lembrando-lhe o seu amor por ela.

O salmo responsorial comenta que tais fatos são a prova de que Deus governa o mundo com justiça e os povos segundo sua fidelidade.

2ª Leitura: Atos 13, 16-17.22-25

A Segunda leitura (cf. At 13,16-17.22-25) anuncia o tempo de Cristo como o tempo em que se manifesta sua graça e a amizade de Deus, transformando a nossa noite em dia e em luz. A pregação de Paulo; testemunho a respeito do “Filho de Davi”. Paulo, na sua primeira viagem, é convidado a falar na sinagoga de Antioquia da Psídia. Resume a História da Salvação, chegada à plenitude em Jesus Cristo, Filho de Davi, anunciado por João Batista, que convocara o povo para a conversão.

Temos aqui um pequeno extrato do primeiro discurso de Paulo em Atos: uma breve síntese da história da salvação, que culmina em Jesus Cristo. Foi selecionada a parte do texto que põe em evidência que, de acordo com as promessas de Deus, «Jesus, é o Salvador de Israel», sendo «da descendência de David»(v. 23); o último elo da corrente profética que prepara a sua vinda é João.

São Paulo dirigindo-se aos judeus da sinagoga de Antioquia da Psídia, Paulo lembra das grandes etapas da história da Salvação: os patriarcas – libertação do Egito – deserto – conquista da terra – juízes e rei Davi (At 13,16-22). Nesta linha, Jesus é aquele que dá cumprimento à salvação, por isso é o Salvador e à promessa feita a Davi (At 13,23). É, pois, o messias; por isso, segundo a pregação de João (Lc 1,76ç 3,3-17), a sua vinda exige do povo mudança de mentalidade.

Evangelho: São Mateus 1, 1-25  /São Mateus 1, 18-25 (breve)

Estimados Irmãos, Jesus é colocado hoje como o Sol invencível, o sol da justiça, o sol sempre nascente, o sol sem ocaso, a luz que apareceu nas trevas para iluminar os povos. Isaías relembra que o povo caminhava nas trevas e viu a luz, uma grande luz que hoje podemos afirmar que é o Senhor Jesus (cf. Mt 1,1-25 ou 1,18-25).

As trevas sempre representaram nas sagradas Escrituras a desgraça, a dor, a opressão em todas as suas facetas, a escravidão e a própria morte. E a luz indica prosperidade, felicidade, vida plena, fecundidade, bem-estar, presença de Deus. No meio da noite de Natal, Deus se faz presente na carne humana. Troca-se o próprio destino do homem, que caminhava pela estrada da morte e a partir de hoje caminhará com Jesus, pela estrada da vida. Jesus vem nos trazer, com seu nascimento, a graça e a vida plena, a vida eterna, as alegrias celestiais.

Essa genealogia (Mt 1,1-17) deve ser explicada à luz da segunda leitura. Jesus é aquele que dá cumprimento às três grandes etapas da história da salvação (Mt 1,17) e, como descendente de Abraão e de Davi(Mt 1,1), na linha jurídica de José(Mt 1,16.20), é o que dá cumprimento às promessas e é aquele que salva o povo dos seus pecados(Mt 1,21). Citando, literalmente, o texto de Is 7,14 (Mt 1,23), o evangelista declara que Jesus está na linha das promessas feitas a Davi e é, portanto, filho de Davi segundo a carne(Rm 1,3), embora seu nascimento virginal exclua a cooperação do homem(Mt 1,16.18)e é juridicamente filho de Davi só através de José, que fisicamente não seu pai(Mt 1,20). José que é justo – não porque procura separar-se de Maria (Mt 1,19), mas porque, como exige o termo, procura em todas as coisas o cumprimento da vontade de Deus – reconhece Jesus como seu filho e lhe transmite, dando-lhe o nome, todos os direitos de um descente de Davi (Mt 1,21-24). O fato demonstra como é Deus que opera a salvação, mas também como esta não se concretiza na terra sem a cooperação do homem.

S. Mateus centra o seu relato do nascimento de Jesus na figura de S. José (S. Lucas na de Maria), com uma clara intencionalidade teológica de apresentar Jesus como o Messias, anunciado como descendente de David. Isto é posto em evidência logo de início: «Genealogia de Jesus Cristo (=Messias), Filho de David» (v. 1). Como a linha genealógica passava pela linha do esposo, é a de José que é apresentada. Os elos são selecionados para que apareçam três séries de 14 nomes. Pensa-se que isto obedece a uma técnica rabínica, chamada gematriáh, ou recurso ao valor alfabético dos números; assim, o número 14, ao ser reforçado pela sua tripla repetição – «catorze gerações» – (no v. 17), sugere o nome de David, que em hebraico se escreve com três consoantes (em hebraico não se escrevem as vogais) que dão o número catorze ([D=4]+[V=6]+[D=4]=14). A concepção virginal antes de ser explicada e justificada pelo cumprimento das Escrituras (vv. 18-25), é já aludida na genealogia, apresentada na 1ª parte (facultativa) da leitura de hoje, pois para todos os seus elos se diz «gerou», quando para o último elo não se diz que José gerou, mas, pelo contrário: «José, esposo de Maria, da qual nasceu Jesus» (v. 16, à letra «da qual Jesus foi gerado» – entenda-se – por Deus).

18 «Antes de terem vivido em comum»: Maria e José já tinham celebrado os esponsais (erusim), que tinham valor jurídico de um matrimônio, mas ainda não tinham feito as bodas solenes (nissuim ou liqquhim), em que o noivo trazia festivamente a noiva para sua casa, o que costumava ser cerca de um ano depois.

«Encontrava-se grávida por virtude do Espírito Santo»: isto conta-se em pormenor no Evangelho de S. Lucas (1, 26-38), lido na festa da Imaculada Conceição (ver comentário então feito). Ao dizer-se «por virtude do Espírito Santo», não se quer dizer que o Espírito Santo desempenhou o papel de pai, pois Ele é puro espírito. Também isto nada tem que ver com os relatos mitológicos dos semideuses, filhos dum deus e duma mulher. Além do mais, é evidente o caráter semítico e o substrato judaico e vétero-testamentário das narrativas da infância de Jesus em Mateus e Lucas; ora, nas línguas semíticas a palavra «espírito» (rúah) não é masculina, mas sim feminina. Isto chegava para fazer afastar toda a suspeita de dependência do relato relativamente aos mitos pagãos. Por outro lado, na Sagrada Escritura, Deus nunca intervém na geração à maneira humana, pois é espiritual e transcendente: Deus não gera criaturas, Deus cria-as. As narrativas de Mateus e Lucas têm tal originalidade que excluem qualquer dependência dos mitos.

19 «Mas José, seu esposo…». Partindo do fato real e indiscutível da concepção virginal de Jesus, aqui apresentamos uma das muitas explicações dadas para o que se passou. A verdade é que não dispomos da crônica dos fatos, pois a intenção do Evangelista era primordialmente teológica, embora sem inventar histórias, pois em face dos dados das suas fontes nem sequer disso precisava. Do texto parece depreender-se que Maria nada tinha revelado a José do mistério que nela se passava. José vem a saber da gravidez de Maria por si mesmo ou pelas felicitações do paraninfo (o «amigo do esposo»), e aquilo que deveria ser para José uma grande alegria tornou-se o mais cruel tormento. Em circunstâncias idênticas, qualquer outro homem teria atuado drasticamente, denunciando a noiva ao tribunal como adúltera. Mas José era um santo, «justo», por isso, não condenava ninguém sem ter as provas evidentes da culpa. E aqui não as tinha e, conhecendo a santidade singular de Maria, não admite a mais leve suspeita, mas pressente que está perante o sobrenatural, já sentido por Isabel… Então só lhe restava deixar Maria, para não se intrometer num mistério em que julga não lhe competir ter parte alguma. É assim que «resolveu repudiá-la em segredo», evitando, assim, «difamá-la» (colocá-la numa situação infamante), ou simplesmente «tornar público» o mistério da sua maternidade. Mas podemos perguntar: porque não interrogava antes Maria para ser ela a esclarecer o assunto? Mas pedir uma explicação já seria mostrar dúvida, ofendendo Maria; a sua delicadeza extrema levá-lo-ia a não a humilhar ou deixar embaraçada. E porque razão é que Maria não falou, se José tinha direito de saber do sucedido? Mas como é que Maria podia falar de coisas tão colossalmente extraordinárias e inauditas?! Como podia provar a José a Anunciação do Anjo? Maria calava, sofria e punha nas mãos de Deus a sua honra e as angústias por que José iria passar por sua causa; e Deus, que tinha revelado já a Isabel o mistério da concepção de Jesus, poderia igualmente vir a revelá-lo a José. De tudo isto fica para nós o exemplo de Maria e de José: não admitir suspeitas temerárias e confiar sempre em Deus.

20 «Não temas receber Maria, tua esposa». O Anjo não diz: «não desconfies», mas: «não temas». Segundo a explicação anterior, José deveria andar amedrontado com algo de divino e misterioso que pressentia: julga-se indigno de Maria e decide não se imiscuir num mistério que o transcende. Na mesma linha de S- Jerônimo, S. Bernardo diz que S. José «foi tomado dum assombro sagrado perante a novidade de tão grande milagre, perante a proximidade de tão grande mistério, que a quis deixar ocultamente… José tinha-se, por indigno…». O texto sagrado poderia mesmo traduzir-se assim, com X. Léon-Dufour e outros: «porque sem dúvida (gar) o que foi gerado nela é obra do Espírito Santo, mas (dè) Ela dará à luz um filho ao qual porás o nome de Jesus» (exercendo assim para Ele a missão de pai). Assim, o Anjo não só elucida José, como também lhe diz que ele tem uma missão a cumprir no mistério da Incarnação, a missão e a dignidade de pai do Salvador. Comenta Santo Agostinho: «A José não só se lhe deve o nome de pai, mas este é-lhe devido mais do que a qualquer outro. Como era pai? Tanto mais profundamente pai, quanto mais casta foi a sua paternidade… O Senhor não nasceu do germe de José. Mas à piedade e amor de José nasceu um filho da Virgem Maria, que era Filho de Deus».

23 «Será chamado Emanuel». No original hebraico de Isaías 7, 14, temos o verbo no singular (forma aramaica para a 3ª pessoa do singular feminino: weqara’t referido a virgem, que é a que põe o nome = «e ela chamará»). Mateus, porém, usa o plural, que não aparece na tradução litúrgica, (kai kalésousin: «e chamarão»),um plural de generalização, a fim de que o texto possa ser aplicado a S. José, para pôr em evidência a missão de S. José, como pai «legal» de Jesus. Mateus, em face do papel providen­cial desempenhado por S. José, não receia adaptar o texto à realidade maravilhosa muito mais rica do que a letra do anúncio profético. Contudo, esta técnica do Evangelista para «actualizar» um texto antigo (chamada deraxe) não é arbitrária, pois baseia-se na regra hermenêutica rabínica chamada al-tiqrey («não leias»), a qual consiste em não ler um texto consonântico com umas vogais, mas com outras (o hebraico escrevia-se sem vogais). Neste caso, trata-se de «não ler» as consoantes do verbo (wqrt) com as vogais que correspondem à forma feminina (tanto da 3ª pessoa do singular na forma aramaica, como da 2ª pessoa do singular da tradução dos LXX: weqara’t «e tu chamarás»), mas de ler com as vogais que correspondem à 2ª pessoa do singular masculino (weqara’ta«e tu chamarás» – em hebraico há diferentes formas masculina e feminina para as 2ª e 3ª pessoas dos verbos). Como pensa Alexandre Díez Macho, «com este deraxe oculto, mas real, Mateus confirma as palavras do anjo do Senhor no v. 21: «e (tu, José) o chamarás».

Eis, a propósito, o maravilhoso comentário de S. João Crisóstomo, apresentando Deus a falar a José: «Não penses que, por ser a concepção de Cristo obra do Espírito Santo, tu és alheio ao serviço desta divina economia; porque, se é certo que não tens nenhuma parte na geração e a Virgem permanece intacta, não obstante, tudo o que pertence ao ofício de pai, sem atentar contra a dignidade da virgindade, tudo to entrego a ti, o pôr o nome ao filho. (…) Tu lhe farás as vezes de pai, por isso, começando pela imposição do nome, Eu te uno intimamente com Aquele que vai nascer» (Homil. in Mt, 4).

25 «E não a tinha conhecido…». S. Mateus pretende realçar que Jesus nasceu sem prévias relações conjugais, mas por um milagre de Deus. Quanto à posterior virgindade, o Evangelista não só não a nega, como até a parece insinuar no original grego, ao usar o imperfeito de duração («não a conhecia») em vez do chamado aoristo complexivo como seria de esperar, caso quisesse abranger apenas o tempo até ao parto (Zerwick). De qualquer modo, esta afirmação não significa que depois já não se verificasse o que até este momento acontecera, como é o caso de Jo 9, 18.

Queridos amigos, contemplando a riqueza desta noite Santa nós temos a certeza de que todos nós éramos protagonistas da salvação. Lá estava, no teatro da salvação, os homens e as mulheres de todos os tempos: na simplicidade de um curral estava Maria e José, dois homens simples do povo, a quem coube realizar, por desígnio de Deus, o sonho do humano e do divino: o nascimento do Salvador. Bem no meio da natureza, num ambiente rural como o nosso santo ambiente das Minas, chamadas de Gerais e de Católica, para contemplar o teatro da salvação. Tudo estava representado para o Nascimento do Redentor: as pedras, as plantas, os animais, os homens. O mundo racional e o mundo irracional se ajoelha, reverentemente, diante do Deus Nascido, do Divino Infante.

A humanidade está representada por JOSÉ E MARIA. José, o homem justo, descendente da casa real de Davi, tornado pai adotivo de Jesus, por vontade de Deus, dá ao Menino o estado legal de descendente davídico, como previam os profetas e como esperava o povo eleito. Jesus se torna o “rebento do tronco de Jessé, cheio do Espírito Santo do Senhor”. Maria, a Mãe, pelos mistérios de Cristo, preservada de todo o pecado, a “cheia de graça”, a bendita entre todas as mulheres. Assumindo a carne humana em Maria, Jesus assumiu nossa condição, para que nós entrássemos na condição dEle. Foi na carne de Maria que nós, na expressão de São Pedro: “nos tornamos participantes da natureza divina”. E o sonho de Deus, de todas estas verdades, se realizou nesta noite Santa.

PARA REFLETIR

Hoje celebramos a Vigília que precede o Natal. A Igreja, mestra em humanidade, sabe o quanto o ser humano é distraído e tem dificuldade de entender o valor correto das coisas e, por isso, para ressaltar a importância de um evento, ela faz com que ele seja precedido com uma Vigília, que prepara nossas atenções para algo grandioso que está por vir.

No caso do Natal, poderíamos dizer que além da Vigília de hoje, que mostra a Igreja como que ansiosa para receber o menino Jesus, tivemos não apenas um dia, mas como que um mês inteiro de Vigília, pois desde o começo do Ano Litúrgico a Igreja nada mais fez do que anunciar a vinda daquele que era aguardado ansiosamente por tantos patriarcas e profetas. Nos últimos dias, a ansiedade é tanta que a Igreja no seu Ofício Divino começa a literalmente contar os dias, dizendo: faltam 5 dias, faltam 3 dias e assim por diante.

Para os que tiveram a felicidade de se preparar para o Natal através da Novena de Natal de Santo Afonso de Ligório, vemos que apesar de todas as nossas misérias e infidelidades, Deus faz de tudo para se aproximar de nós. O pecado não é a palavra final da história, Deus existe e interveio nela. Esse evento, o Natal, é algo que foge da compreensão humana sobre Deus, pois em nada Deus era obrigado em se fazer carne e habitar entre nós. Deus faz isso livremente e por pura generosidade para conosco.

A humanidade, que sucumbiu às trevas depois do pecado original, pode agora novamente deslumbrar a luz divina. São Paulo já dizia: “outrora éreis trevas, mas agora sois luz no Senhor: Andai como filhos da luz” (Ef 5, 8). Ora o fruto da luz é bondade, justiça e verdade, procurando o que é agradável ao Senhor.

Devemos ser filhos da luz, e nossa luz deve iluminar os outros, seja pelos bons conselhos advindos da verdadeira fé, seja principalmente pelos bons exemplos, que brilham muito mais que as palavras sem obras.

As trevas do mundo parecem como que crescer a cada dia, tirando a esperança e até mesmo a vida de muitos. Ora, as trevas apenas crescem quando a luz diminui, pois onde há menos iluminação, há mais trevas. O ódio à escuridão, tomado no seu sentido simbólico, deve ser tanto quanto maior quanto maior for nossa vontade de afastá-la.

Em primeiro lugar devemos ter a luz, isto é, a fé que tudo ilumina e mostra claramente o caminho a seguir. Para crescer essa luz, é preciso crescer na compreensão do catecismo e da Bíblia, através de meditação e oração.

Em segundo lugar devemos ter a esperança, pois sem ela não temos coragem de enfrentar as trevas do mundo e perderemos o combate antes mesmo dele começar. Por causa de todas as nossas misérias, nossa esperança não deve estar em nós, mas sim em Deus que é a garantia de que podemos vencer esse combate. Da nossa parte consiste o não desistir e lutar até o último suspiro, mesmo com a impressão humana de termos fracassado em nossas vidas.

Em terceiro lugar nossa luz não deve ser como a luz fria da geladeira, mas sim uma luz que abrasa e nos mantém vivos na vida da graça através da caridade sempre operante. Operante não apenas em fazer o bem, mas também em suportar com paciência o mal.

É difícil não ver hoje como a vida católica é um notável diferencial daquilo que se vê comumente no mundo. O homem moderno não sabe para que vive, age de modo impulsivo e irracional, e se desespera diante da realidade, principalmente ao ver quão grande são as próprias misérias, mesmo tentando escondê-las a todo custo.

Nós, católicos, possuidores da luz, temos a certeza da nossa razão de existir e temos a força em Deus para vencer todo e qualquer obstáculo. Por isso, ao invés de lamentarmos nossas misérias e as misérias do mundo moderno, o católico deve estar confiante em Deus que tudo podemos superar. Quanto mais pensarmos nas nossas forças e menos em Deus, mais triste ficamos. Por isso, como ensina o “fazer o contrário” de Santo Inácio, devemos pensar mais em Deus e menos em nossas forças quando nos deparamos com algo triste.

Quanto mais forte a luz da fé brilhar em nós, tanto mais não devemos temer o que os outros pensam de nós. Estamos convictos, não há lei humana, livros ou maus exemplos que podem nos convencer do contrário. Os maus nos perseguirão, mas não devemos temê-los, mas ajudá-los a ver a luz da verdade. Nosso único real inimigo e único motivo de tristeza é o pecado, mas o Natal lembra justamente Aquele que veio para nos salvar.

No deserto deste mundo, Jesus virá no Natal como o maná que caiu do Céu.


Peçamos no presépio ao menino Jesus a graça de não sermos indiferentes à sua vinda, mas que Ele nos auxilie aumentando em nós a fé, esperança e caridade, para podermos levar essa luz a tantos quantos ainda vivem nas trevas.
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* Esta liturgia é celebrada na tarde do dia 24 e representa a preparação para o dia de Natal.

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