segunda-feira, 7 de dezembro de 2015

Homilética: 3º Domingo do Advento - Ano C: "A alegria e a esperança na expectativa do Senhor".


Aproximando-se o dia de Natal, a Liturgia do Terceiro Domingo do Advento inicia com as palavras de S. Paulo: “Alegrai-vos sempre no Senhor. De novo eu vos digo: alegrai-vos! O Senhor está perto” (Fl 4,4ss). Não se trata de uma alegria “subjetiva”, toda íntima e sentimental, que muitas vezes não passa de uma excitação, mas de uma alegria “objetiva” que se fundamenta sobre realidades em si mesmas alegres, algo que já existe e só espera vir a nós. Nem se trata de uma alegria ‘individual” ou privada, mas de uma alegria “comunitária”; é como comunidade cristã que nós somos hoje convidados à alegria: Alegrai-vos!

O Profeta Sofonias recorda ao povo eleito sua missão e procura despertar nele a esperança e a coragem: “Canta de alegria, cidade de Sião; rejubila, povo de Israel! Alegra-te e exulta de todo o coração, cidade de Jerusalém!” ( Sofonias 3, 14-18)

Depois da vinda de Jesus, esse povo, que é sinal de alegria entre as nações, é a comunidade cristã que acolheu o Evangelho, isto é, a alegre notícia de Jesus. Por isso o Apóstolo Paulo (Fl 4, 4-7)  transmite à comunidade cristã o grande mandamento da alegria que antes os profetas tinham dirigido à filha de Sião: Irmãos alegrai-vos!

A alegria do cristão é feita de uma esperança viva, com base na Ressurreição de Cristo e que tem por objeto uma herança conservada nos céus.

Porém, além da esperança, é preciso também outra virtude teologal: a caridade, isto é, mais existencialmente, ser amados e amar.

Devemos, portanto, ser afáveis, amáveis e bons; a este aspecto humano da caridade se refere S. Paulo quando escreve que a caridade é paciente, a caridade é bondosa. Não tem inveja. A caridade não é orgulhosa. Não é arrogante. Nem escandalosa. Não busca os seus próprios interesses, não se irrita, não guarda rancor. Não se alegra com a injustiça, mas se rejubila com a Verdade (1Cor 13, 4-6). São essas delicadezas da caridade que mais vezes faltam nas pessoas boas.

Hoje a Palavra de Deus nos motiva a fazer diversos propósitos. Não se pode ser feliz sozinho; “alegrai-vos” significa também: irradiai alegria. O inimigo da alegria não é o sofrimento; é o egoísmo, o voltar-se sobre si mesmo, a ambição. O homem voltado sobre si mesmo é um porco-espinho que mostra somente espinhos, uma casa fechada.

Poderemos estar alegres se o Senhor estiver verdadeiramente presente na nossa vida, se não o tivermos perdido, se não tivermos os olhos turvados pela tibieza ou pela falta de generosidade. Quando, para encontrar a felicidade, se experimentam outros caminhos fora daquele que leva a Deus, no fim só se acha infelicidade e tristeza. Fora de Deus não há alegria verdadeira. Não pode havê-la. Encontrar Cristo, ou tornar a encontrá-Lo, é fonte de uma alegria profunda e sempre nova.

O cristão deve ser um homem essencialmente alegre. Mas a sua alegria não é uma alegria qualquer, é a alegria de Cristo, que traz a justiça e a paz, e que só Ele pode dar e conservar, porque o mundo não possui o seu segredo.

Fujamos da tristeza! Uma alma triste está à mercê de muitas tentações. Quantos pecados se têm cometido à sombra da tristeza!Por outro lado, quando a alma está alegre, abre-se e é estímulo para os outros; quando está triste obscurece o ambiente e faz mal aos que tem à sua volta.

A tristeza nasce do egoísmo, de pensarmos em nós mesmos esquecendo os outros. Quem anda excessivamente preocupado consigo próprio dificilmente encontrará a alegria da abertura para Deus e para os outros. Em contrapartida, com o cumprimento alegre dos nossos deveres, podemos fazer muito bem à nossa volta, pois essa alegria leva a Deus.

Comentário dos textos bíblicos

Evangelho (Lc 3,10-18)

O texto do evangelho de hoje é parte da pregação de João Batista e concretiza a conversão a que ele chama (v. 3-5: cf. o domingo precedente). Os v. 10-14 tematizam o aspecto ético; os v. 15-17, o messiânico-cristológico.

Nos v. 10-14, as exigências da conversão não consistem no oferecimento de sacrifícios ou na realização de rituais (jejuar, vestir-se de saco, cobrir-se de cinzas), que foram já criticados pelos profetas, caso não correspondessem ao amor realizado em atitudes de justiça (cf. Is 58,1-12; Jl 2,12-14). Também não é mencionada nenhuma conduta ascética. São apresentados três aspectos da vida diária como resposta à pergunta, típica de Lucas, que manifesta a conversão: “Que devemos fazer?” (v. 10.12.14; cf. At 2,37; 16,30; 22,10).

O primeiro refere-se à pergunta das multidões. Mesmo os elementos fundamentais à vida – a túnica para vestir-se, o alimento para a própria subsistência – devem ser repartidos com aqueles que deles carecem.

O segundo e o terceiro dizem respeito a duas profissões específicas, conhecidas pela facilidade com que podem ser exercidas de modo corrupto. São os coletores de impostos e os soldados judeus empregados no serviço de Herodes Antipas, tetrarca da Galileia (que a atividade do Batista seja ali especialmente desenvolvida, cf. 3,19-20). Não se trata de deixar de exercer tais ofícios, mas de exercê-los com honestidade. No contexto da pregação de João, situada entre os v. 7-9 e 15-17, essas palavras carregam o mesmo tom escatológico. A maneira de conduzir a vida atual, na justiça e no amor, tem consequências escatológicas.

Os v. 15-17 apresentam, como resposta à reação do povo ao seu anúncio, a pregação de João sobre a identidade do Messias. Desde o tempo do exílio babilônico, quando cessou a monarquia em Jerusalém, desenvolveu-se, à luz da promessa de Natan a Davi (cf. 2Sm 7,14-17), a esperança de que Deus restauraria a dinastia davídica. No livro de Daniel (meados do século II a.C.), fala-se explicitamente de um “príncipe ungido” que virá (Dn 9,25). Nos últimos séculos antes de Cristo, desenvolveram-se muito as expectativas messiânicas em Israel. Isso permite compreender a interpretação que a multidão faz da pregação de João. Este, no entanto, deixa entrever em suas palavras não ser ele o Messias. E indica suas características. Ele é:

– Aquele que vem. Lucas não diz que vem “depois” (cf. Mc 1,7), para que Jesus não seja confundido com um discípulo do Batista;

– O mais forte. João nem é digno de lhe prestar o serviço humilde de um escravo;

– O que batiza com o Espírito Santo e com o fogo, enquanto o batismo de João é com água.

Definindo Jesus, João apresenta-se como o profeta que anuncia imediatamente a vinda do Messias escatológico.

A água no batismo de João é sinal da conversão em vista da purificação (a remissão dos pecados). O batismo de Jesus é caracterizado pelo fogo, que também purifica, mas o faz porque comunica o Espírito Santo. Fogo e Espírito estão associados na cena do dia de Pentecostes (cf. At 2,3-4). O fogo destrói aquilo que, diante de Deus, não tem valor (a palha: v. 17). A imagem do v. 17 expressa o julgamento escatológico, discernindo bons e maus: Jesus limpará a sua eira e recolherá o trigo: imagem da purificação dos fiéis e sua salvação; e queimará a palha no fogo sem fim. No batismo trazido por Jesus, antecipa-se o julgamento final de Deus, com a eliminação do que não se coaduna com o evangelho e com a salvação para aqueles que o acolhem.

O v. 18 conclui o texto, retomando a missão de João Batista como anunciador da Palavra. 

I leitura (Sf 3,14-18a)

O texto de Sofonias é um oráculo de salvação que se inicia com um convite à alegria (v. 14), ao qual se segue sua motivação: Deus agiu em favor de Jerusalém (v. 15), de modo que nova realidade terá lugar (v. 16-18a).

O convite à alegria é enfático, ao ser apresentado quatro vezes (rejubila-te, grita de alegria, alegra-te, exulta). Trata-se de uma alegria que brota do interior, mas se manifesta também exteriormente, pela voz e outros sinais (cf. Is 55,12; Jr 50,11).

O motivo para tanto é primeiramente que Deus revogou a sentença que pesava contra Jerusalém, aquela com que ele a ameaçara (cf. 3,1-2). E o fez retirando de seu meio os responsáveis pelos desvios da cidade santa (cf. 3,3-4.11: príncipes, juízes, profetas e sacerdotes iníquos, ou seja, os orgulhosos aproveitadores, os dirigentes que se transformaram em inimigos).

Uma vez limpada a eira (cf. Lc 3,17), Deus se estabelece no seio do povo. Já não haverá um rei davídico, mas o próprio Senhor será o rei de Jerusalém. Eliminando as classes dirigentes corruptas e tendo anulado o juízo contra Sião, chegou para ela o tempo de salvação. Ela não deverá mais temer o mal, isto é, tudo o que anteriormente ocorreu em virtude dos desmandos de seus chefes.

Descreve-se então o novo estado de Jerusalém em virtude da intervenção de Deus. Agora não há mais lugar para o temor, só para a alegria. Aqueles que se encontram desencorajados, sem força, por efeito do medo, são chamados a recobrar o ânimo. A garantia é dada por Deus, que, forte, está no meio do povo como um guerreiro que o liberta. Mas não só: não é somente Sião que se alegra (v. 14); o próprio Deus se alegra por causa da cidade santa. Mostra, assim, a grandeza de seu amor por Jerusalém, causa última de sua renovação.

O evangelho de hoje apresenta Jesus como o mais forte que vem. Ele é o Senhor que purifica e renova seu povo e que “está no meio de nós”.

II leitura (Fl 4,4-7)

O Apóstolo convida a alegrar-se sempre, em todos os momentos e situações. O motivo da alegria não são os acontecimentos exteriores que motivam (ou não), em última instância, a alegria cristã, mas o Senhor e o que, em nosso favor, ele realizou e realiza (v. 4).

Tal alegria manifesta-se exteriormente em gestos de bondade. A perspectiva da próxima vinda do Senhor corrobora o convite à alegria e lhe dá nova motivação (v. 5). Se essa é a alegria cristã, então todas as adversidades se tornam relativas. Em vez de se deixar dominar pela inquietação, o cristão as expõe a Deus na oração (v. 6).

Essa entrega confiante nas mãos do Pai é então portadora da paz que vem de Deus. A paz é um modo de falar da salvação em sua realização concreta (cf. 2Cor 13,11; 1Ts 5,23). Mesmo sem compreender tudo, crendo no amor providente de Deus, o fiel se sabe guardado da inquietude e da angústia. Na paz-salvação que vem de Deus encontra forças (v. 7).

A vinda do Senhor – sua primeira vinda, como também a segunda – é motivo de alegria e paz e é capaz de vencer todas as ameaças desta história.

Para Refletir

“Gaudete in Domino semper: iterum dico vobis, gaudete. Dominus enim prope est”. O tom da liturgia deste terceiro domingo do Advento é a alegria. A cor rosácea, usada como opção ao roxo, sinaliza para esta exultação que perpassa toda a liturgia hodierna. “Alegrai-vos!” – diz São Paulo na segunda leitura; “Canta de alegria, rejubila, alegra-te e exulta de todo o coração” – convida o Profeta Sofonias na primeira; “Exultai cantando alegres” – exorta o Salmo de meditação.

Mas, qual o motivo de tamanha alegria? Para um cristão, para alguém responsável, e realmente consciente, é possível alegrar-se, quando há tanta dor no mundo, tanto fracasso, tristeza, solidão e morte? Alegrar-se num mundo assim, não seria uma insuportável falta de solidariedade, uma falta de compaixão para com quem sofre e geme? E, no entanto, a Palavra santa insiste: Alegrai-vos! Mas, “alegrai-vos sempre no Senhor!” Eis o modo de alegrar-se, no Senhor, porque ele pode sustentar nossa existência, ele pode dar sentido às nossas dores e nos consolar depois da pena! E a Palavra santa prossegue: “Alegrai-vos: o Senhor está perto”. O motivo da nossa alegria é a certeza que Deus não nos abandonou, a convicção que ele é um Deus presente e que no seu Filho Jesus, ele veio pessoalmente ao nosso encontro. Então, irmãos, alegrai-vos, pois ainda que haja tantas realidades dolorosas e sombrias, o Senhor está perto com seu amor, sua misericórdia, sua salvação. E o nome dessa salvação é Jesus!

Já no Antigo Testamento, Deus consolava o seu povo, sustentava-lhe a esperança, prometia-lhe uma bênção no futuro. Ele mesmo haveria de ser essa bênção, um Deus no meio de sua gente, um Deus próximo: “O rei de Israel é o Senhor, ele está no meio de ti, nunca mais temerás o mal. O Senhor, teu Deus, está no meio de ti, o valente guerreiro que te salva!” Israel nunca poderia imaginar que essas palavras haveriam de cumprir-se ao pé da letra. Como Deus poderia vir habitar pessoalmente no meio do seu povo, se ele é o Infinito, Santo e abarca tudo quanto existe no céu e na terra? Para nós, cristãos, no entanto, de modo maravilhoso, esta promessa cumpriu-se em Jesus: ele é o Deus-conosco, Deus entre nós, Deus para nós, Deus como nós: com nosso semblante e com nossos gestos! Ninguém poderia imaginar algo assim! A surpresa foi tanta, é tanta, que Santo Irineu exclamava, a respeito de Cristo: “Ele trouxe toda a novidade quando se trouxe a si mesmo!” Por isso São Paulo nos convida a que nos alegremos no Senhor; não em qualquer alegria! Somente no Senhor que se dá a nós, a nossa alegria pode ser autêntica, porque brota da certeza que não estamos sós, que o pecado e a morte foram vencidos!

Alegrai-vos, pois, mas na alegria de saber que, mesmo com tanta dor e sofrimento no mundo, o amor e a graça de Deus triunfam em Jesus Cristo. Alegremo-nos porque o Senhor está próximo: ele está próximo o seu Natal, ele está próximo no nosso cotidiano, ele está próximo na sua Vinda final… próximo, porque é urgente que nos decidamos por ele, que o acolhamos, que lhe abramos as portas do coração!

Por isso, ao lado da alegria, o evangelho de hoje, ao apresentar-nos o ministério de João Batista, coloca-nos uma questão fundamental: “Que devemos fazer?” – é a questão de levar a sério o Cristo que vem; a questão de abrir espaço para ele na nossa vida, a questão de decidir-se realmente por ele! Como devemos viver para acolher sua vinda no dia-a-dia, para bem celebrar o seu Natal, para estar diante dele quando vier na sua glória? Que devemos fazer? A resposta somente pode ser uma: convertei-vos, abri vosso coração para que o Rei da glória possa entrar! Entrar no vosso modo de viver, entrar nas vossas opções, entrar no vosso coração, entrar em todas as dimensões da vossa existência! Não recebais em vão a graça de Deus, o dom do Cristo que nos vem sempre! Não torneis inútil a salvação que Cristo vos concedeu.

É importante observar o apelo de João, o Batista, precursor do Messias. A cada grupo de pessoas que perguntavam o que fazer, o Batista responde de modo muito concreto, indicando uma direção a partir do modo de vida e da atividade de quem perguntava… e sempre relacionando com o respeito e o amor aos outros: “Quem tiver duas túnicas, dê uma a quem não tem; quem tiver comida, faça o mesmo; não cobreis mais que o estabelecido; não tomeis à força dinheiro de ninguém; não façais falsa acusação”.

Ainda hoje este é o critério para acolher Jesus: um coração em disposto à conversão… e uma conversão que passe pelo relacionamento com os irmãos, sobretudo os mais necessitados.

Pois bem: “alegrai-vos no Senhor!” Que vossa alegria no Senhor que vem, vos faça bondosos para com todos, sem excluir ninguém, pois o Senhor a todos nos acolheu! Que vossa alegria no Senhor vos faça serenos ante os problemas e desafios do mundo e da vida! Que vossa alegria no Senhor guarde vossos corações e pensamentos em Cristo Jesus!

É isto que nos é pedido neste santo Advento! É esta a condição para um Natal verdadeiramente cristão, verdadeiramente no Senhor!

Ó Santo Emanuel, tu que assumiste nossa humana condição, tu que não te envergonhaste de ser um de nós, um como nós, um conosco, acolhe nossa súplica, alegra o nosso coração com a alegria da tua chegada… a mesma que alegrou a Virgem, a José, a João no ventre materno… a mesma que fez Isabel exultar e Zacarias cantar… a mesma que alegrou os pastores e o magos…

Santo Emanuel, que nossa alegria esteja numa vida vivida na tua presença, fazendo a tua vontade, cumprindo o teu mandamento!

Vem, Senhor Jesus, que precisamos de ti! Vem e renova o nosso coração e o coração do mundo… até a tua Vinda na glória. Amém.

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