quarta-feira, 1 de julho de 2015

Homilética: 14º Domingo Comum - Ano B: "Teimosia e incredulidade diante da mensagem de Cristo".



As três leituras deste domingo nos apresentam um panorama nada agradável e consolador: a incredulidade e a teimosia de tantos diante da mensagem de Cristo. Onde não experimentamos isto, sobretudo nessas terras e nações opulentas, materialistas, empanturradas em si mesmas e fechadas à transcendência?

O Evangelho (Mc 6,1-6) mostra o ministério de Jesus junto às multidões. Em vez da adesão, obtém a rejeição em sua terra natal. Nazaré era a sua casa, a sua pátria, onde viviam os seus parentes e Ele era bem conhecido. E foi rejeitado! Cheios de incredulidade dizem os nazarenos: “Não é Ele o carpinteiro, filho de Maria…? E ficaram escandalizados por causa dele” (Mc 6, 3). Um orgulho secreto, baixo, mesquinho, impede-os de admitir que um como eles, criado à vista de todos e de profissão humilde, possa ser um profeta, e nada mais nada menos que o Messias, o Filho de Deus.

Escandalizavam-se porque o carpinteiro, o filho de Maria ensinava com autoridade, com sabedoria. Por outro lado, Jesus deixaria realmente uma impressão muito grata, os que o ouviam ficavam admirados. 

E Jesus não fez ali milagres: não porque Lhe faltasse poder, mas como castigo da incredulidade dos seus concidadãos. Deus quer que o homem use da graça oferecida, de sorte que, ao cooperar com ela, se disponha a receber novas graças. É o que expressa Santo Agostinho: “Deus que te criou sem ti, não te salvará sem ti.”

O que aconteceu em Nazaré pode acontecer também hoje na Igreja e com cada um de nós. É a falta de fé, incapaz de lançar uma luz superior sobre as pessoas e os acontecimentos. Foi com esses olhos da fé que S. Paulo encarava o seu ministério apostólico (2 Cor 12, 7-10). Sentia em si a fraqueza, o pecado. Recebeu, porém, de Deus uma resposta: “Basta-te a minha graça, pois é na fraqueza que a força se manifesta”. Ao contar com a ajuda de Deus, tornava-se mais forte e isso fez que Paulo exclamasse: “Eis porque eu me comprazo nas fraquezas, nas injúrias, nas necessidades, nas perseguições e nas angústias sofridas por amor a Cristo. Pois, quando eu me sinto fraco, é então que sou forte” (2 Cor 12, 10). Na nossa fraqueza, experimentamos constantemente a necessidade de recorrer a Deus e à fortaleza que nos vem dele. Quantas vezes o Senhor nos terá dito na intimidade do nosso coração: Basta-te a minha graça, tens a minha ajuda para venceres nas provas e dificuldades!

Ainda que nem todos ficassem admirados e a dar glória a Deus, nós queremos ser contados entre esses que glorificam a Deus, não entre aqueles para os quais a doutrina de Cristo era motivo de escândalo, de queda. Por quê? Por causa do endurecimento de coração, por causa do comodismo egoísta que não os permitia olhar ao redor de si e para si mesmos de maneira realista.

Quando a tentação, os contratempos ou o cansaço se tornarem maiores, o demônio tratará de insinuar-nos a desconfiança, o desânimo, o descaminho. Por isso, devemos hoje aprender a lição que São Paulo nos dá: nessas situações, Cristo está especialmente presente com a sua ajuda; basta que recorramos a Ele.

Mas, ao mesmo tempo, o Senhor pede que estejamos prevenidos contra a tentação e que lancemos mão dos meios ao nosso alcance para vencê-la: a oração e a mortificação voluntária; a fuga das ocasiões de pecado, pois “aquele que ama o perigo nele perecerá! (Eclo 3, 27); exercer com dedicação o trabalho, pelo cumprimento exemplar dos deveres profissionais; horror a todo o pecado, por pequeno que possa parecer; e, sobretudo, o esforço por crescer no amor a Cristo e a Nossa Senhora.

Podemos tirar muito proveito das provas, tribulações e tentações, pois nelas demonstramos ao Senhor que precisamos dEle e o amamos.

Quanto maior for a resistência do ambiente ou das nossas próprias fraquezas, mais ajudas e graças Deus nos dará. Pois, assim a tentação nos conduzirá à oração, à união com Deus e com Cristo: não será uma perda, mais um lucro; “sabemos que todas as coisas concorrem para o bem daqueles que amam a Deus” (Rm 8, 28).

É preciso que nos identifiquemos com Cristo também na maneira de expressar-nos, isto é, as nossas palavras irão, pouco a pouco, sendo verdadeiros veículos da doutrina de Cristo explicita e implicitamente: a calma e a paz ao falar, a sinceridade, a humildade ao dirigirmo-nos aos demais, todos esses são traços de uma personalidade que se identificou com Cristo nas suas palavras. É um discípulo que ama o seu Mestre. Não se trata de ser fanático, o fanatismo é um desvio da religiosidade; trata-se de apaixonar-se por Jesus Cristo. Toda a nossa vida cristã em todos os seus aspectos será um desenrolar-se do seguimento de uma Pessoa, a de Jesus. O nosso seguimento de Jesus leva-nos a uma entrega da própria vida, de toda a vida! Se tivéssemos mais vidas, mais felizes estaríamos pela ajuda que prestaríamos ao próprio Deus que quer fazer de nós verdadeira placas de sinalização para que os outros dele se aproximem.

COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

Textos: Ez 2, 2-5; 2 Co 12, 7-10; Mc 6, 1-6

Caros irmãos, o pobre profeta Ezequiel (1ª leitura) experimentou a teimosia e rejeição diante da mensagem de Deus que ele devia pregar. É enviado aos israelitas, aos rebeldes de Israel, teimosos e obstinados. Rebeldes pela sua apostasia e idolatria e também pela sua oposição contra Nabucodonosor, feita realidade na atitude de Jecomias e Sedecias na dos seus súditos contra o rei de Babilônia. Mas Ezequiel é fiel à sua missão e ele transmite as palavras de Deus, especialmente palavras de juízo, que Deus lhe entrega num rolo e que ele há de comer e assumir para fazê-las próprias. O resultado destas palavras de juízo será para o povo de Israel, lamentações, gemidos e ameaças (Ez 2,10), mas para o profeta será algo doce como o mel (Ez 3,3). Isto manifesta o implícito contraste da obediência de Ezequiel à voz divina com a rebeldia do povo de Israel. Ezequiel é um autêntico mártir no duplo sentido da palavra: testemunha e vítima. Mas ele se manterá firme na hostilidade e no isolamento que experimenta.  

Também nós experimentamos esta teimosia. Paulo assim o experimentou (2ª leitura): açoites, cárcere, ameaças, perseguições. Quantas humilhações sofrem os pais de família por parte dos seus filhos ingratos! Quantas humilhações podem sofrer os trabalhadores dos seus chefes! E nas paróquias, quanta teimosia e pretensões de soberba de alguns que estão na frente dos grupos. Deus seguirá dizendo o que disse a Ezequiel: continua falando, embora não te deem bola. Se não te dão atenção, será responsabilidade deles. Devemos cuidar e acrescentar a nossa própria fé, e ao mesmo tempo não abrandar no nosso empenho de ajudar os demais também nesse crescimento da própria fé, sem esperar necessariamente frutos à curto prazo.

O mesmo Jesus sofreu também essa teimosia na sua própria terra (evangelho); essa solidão e hostilidade. Que humilhação! Ele mesmo se estranhou porque não esperava isso e nem merecia. Prega na Sinagoga, mas a única coisa que consegue é que os seus paisanos se perguntem de onde lhe veem essa sabedoria e esses milagres que dizem fazer. Felizes deveriam estar e festejar que um grande profeta tenha saído do seu povoado! Mas não, não foi assim. Os seus conterrâneos sofrem de miopia espiritual; não veem nada da grandeza de Jesus, cegados pelas suas mesquinhezes e preocupações diárias. Por isso, não realizou muitos milagres entre eles, pois não são números de circo para sugestionar os curiosos e fazer gritar os exaltados. Não os fez, não porque não pudesse, já que era onipotente, mas porque esse povo não estava disposto para receber a fé que lhe oferecia. Esse povo não aceitou Deus com roupagem humano: detrás desse filho do carpinteiro se escondia o Verbo de Deus e o Salvador da humanidade. Pedra de escândalo foi Jesus para esses homens incrédulos! Se alguém pensa que na vida tudo são aplausos e saúde, é bom ler de novo o evangelho de hoje, para não se enganar.

O evangelho deste domingo traz o conhecido trecho onde Jesus afirma: “Nenhum profeta é bem aceito pelo seu povo” (Mc 6,4). Com efeito, com quase trinta anos, após ter deixado Nazaré e após pregar e fazer curas em muitos lugares, Jesus regressou à sua terra e pôs-se a ensinar na sinagoga, lugar do culto e da adoração. Os seus concidadãos ficaram admirados pela sua sabedoria e, conhecendo-o como o “filho de Maria”, o “carpinteiro” que viveu no meio deles, ficaram escandalizados com seus feitos (cf. Mc 6,2-3). Devido a este fechamento espiritual, Jesus não pôde realizar em Nazaré milagre algum. Apenas “curou alguns enfermos, impondo-lhes as mãos” (Mc 6,5). Com efeito, os milagres de Cristo não são uma exibição do seu poder, mas sinais do amor de Deus, que se realizam com a reciprocidade da fé das pessoas. Os contemporâneos de Jesus pareciam conceder-lhe escassa consideração (cf. Jo 1,46). Nazaré é, no entanto, a cidade onde Jesus cresceu e onde residia sua família. 

A cena principal que nos é apresentada tem lugar na sinagoga de Nazaré, em um dia de sábado. Jesus, como qualquer outro membro da comunidade judaica, foi à sinagoga para participar do ofício sinagogal; e, fazendo uso do direito que todo israelita adulto tinha, leu e comentou as Escrituras. 

Os ensinamentos de Jesus na sinagoga, naquele sábado, deixaram impressionados os habitantes de Nazaré. Depois de o escutarem, os seus conterrâneos traduzem a sua perplexidade através de várias perguntas.  Duas perguntas apresentadas dizem respeito à sua origem e à qualidade dos seus ensinamentos: “De onde lhe vem tudo isto? Que sabedoria é esta que lhe foi dada?” (v.2); uma outra questão se refere à qualificação das ações de Jesus: “E os prodigiosos milagres feitos por suas mãos?” (v.2). Recordam também o trabalho executado e a sua família (v.3).  Para eles, Jesus é “o carpinteiro”; não é um “rabi” e não tem qualificações para ensinar como ensina. Por outro lado, eles conhecem a identidade da família de Jesus e não descobrem nada de extraordinário. Ele é o “filho de Maria” e os seus irmãos e irmãs são pessoas comuns, sem qualificações excepcionais. 

Portanto, parece claro que o papel assumido por Jesus e as ações que ele realizou são humanamente inexplicáveis. A questão será saber se estas capacidades extraordinárias que Jesus revela, não vindas dos conhecimentos adquiridos no contato com famosos mestres, nem do ambiente familiar, viriam de Deus. Desde o primeiro momento, os comentários dos habitantes de Nazaré deixam transparecer uma atitude negativa e um tom depreciativo na análise de Jesus. Nem sequer se referem a Jesus pelo próprio nome, mas usam sempre um pronome para falar dele: Jesus é “este” ou “ele”. Depois, o chamam depreciativamente “o filho de Maria”. O costume era o filho ser conhecido em referência ao pai e não à mãe. Os conterrâneos de Jesus não conseguem reconhecer a presença de Deus naquilo que Jesus diz e faz. 

Na resposta aos seus conterrâneos, Jesus se coloca como um enviado de Deus, que atua em nome de Deus e que tem uma mensagem para oferecer aos homens. Como, de fato, os ensinamentos que Jesus propõe não vêm dos mestres judaicos, mas do próprio Deus; a vida que ele oferece é a vida plena e verdadeira que Deus quer propor aos homens. O povo teve sempre dificuldades em reconhecer o Deus que vinha ao seu encontro na Palavra e nos gestos proféticos. O fato de as propostas apresentadas por Jesus serem rejeitadas pelos líderes, pelo povo da sua terra e até pelos seus familiares, não invalida a verdade por ele transmitida e a sua procedência divina. Jesus não realizou ali nenhum milagre porque estavam eles fechados à sua mensagem de salvação. 

Jesus assume-se como um profeta, isto é, alguém a quem Deus confiou uma missão. A nossa identificação com Jesus nos faz continuadores desse mesmo ministério que Deus o confiou. O testemunho que Deus nos chama a dar cumpre-se, muitas vezes, no meio das incompreensões e oposições. Frequentemente, os discípulos de Jesus se sentem desanimados e frustrados porque o seu testemunho não é entendido e nem acolhido.  A atitude de Jesus nos convida a perseverar sempre.  Deus tem os seus projetos e sabe como transformar um fracasso em êxito. 

É importante lembrar que o termo ‘profeta’ recebeu diversas interpretações ao longo dos anos. Inicialmente, identificava-se o profeta à pessoa que via o futuro e, posteriormente, passou a ser chamado de “rabi”, ou seja, o homem que anuncia. Contudo, a etimologia grega da palavra ‘profeta’, derivada de “pro-femi”, quer dizer, falar em lugar de outro. Daí o sentido do vocábulo profecia: algo dito antes que suceda. Em todo caso, o profeta tem uma missão a cumprir: transmitir a mensagem de alguém superior a ele. A Sagrada Escritura faz referência a muitos profetas, e alguns são conhecidos pelos seus próprios nomes.  Alguns deles nos deixaram uma mensagem por escrito, que chamamos na Sagrada Escritura de livros proféticos. Dentre estes profetas, pode-se destacar quatro, conhecidos como profetas maiores, são eles: Isaías, Jeremias, Ezequiel e Daniel. 

Mas todo esse profetismo, presente no texto bíblico está orientado para Jesus de Nazaré e nele culmina.  Chegada a plenitude dos tempos, Deus já não nos transmitiu sua palavra por meio de intermediários, mas por seu próprio Filho que é sua Palavra pessoal feita homem (cf. Hb 1,1s).  Jesus testifica a autenticidade de sua palavra mediante os sinais que são seus milagres.  Assim, aparece diante do povo como profeta enviado por Deus e falando com autoridade própria.  Contudo, como todos os profetas que o precederam, Jesus teve que sofrer a desconfiança e a recusa dos homens, inclusive de seus concidadãos, como nos relata o texto evangélico deste domingo. 

A perícope evangélica ainda nos fala em irmãos de Jesus. Isto porque, na linguagem usada naquele tempo eram também chamados irmãos os primos e os parentes, tanto próximos como afastados. Abraão, por exemplo, disse a Lot, seu sobrinho: “Peço-te que não haja contendas entre mim e ti, nem entre os meus pastores e os teus pastores, porque somos irmãos” (Gn 13,8). Do mesmo modo Labão disse a Jacó: “Acaso, porque és meu irmão, me servirás de graça?” (Gn 29,15). Jacó era, no entanto, filho da irmã de Labão. Nos tempos atuais usamos também esta mesma linguagem.  Falamos que somos todos irmãos. E, com razão, não somos irmãos de sangue. Mas, somos irmãos porque temos Deus como Pai comum, pela fé e pelo Batismo e somos santificados pelo mesmo Espírito Santo, em Cristo Jesus. 

A cena evangélica deste domingo nos remete ainda a uma outra referência que o Evangelista João relata, referindo-se a Jesus Cristo: “Ele veio para o que era seu, mas os seus não o receberam” (Jo 1,11).  É a cada um de nós que, mais uma vez, se dirige a Palavra de Deus.  Podemos admitir que, também entre nós, Jesus não realiza “muitos milagres” e que sua Palavra nem sempre tem eficácia, talvez por falta de confiança e fé da nossa parte no poder do Espírito Santo que sempre faz novas todas as coisas. 

PARA REFLETIR

O Evangelho deste Domingo apresenta-nos Jesus na sua Nazaré. Ali mesmo, na sua própria cidade, onde nascera e fora criado, os seus o rejeitam: “’Este homem não é o carpinteiro, filho de Maria e irmão de Tiago, de Joset, de Judas e de Simão? Suas irmãs não moram aqui conosco?’ E ficaram escandalizados por causa dele”. Assim, cumpre-se mais uma vez a Escritura: “Veio para o que era seu e os seus não o receberam” (Jo 1,11). E a falta de fé foi tão grande, a dureza de coração, tão intensa, a teimosia, tão pertinaz, que São Marcos afirma, de modo surpreendente: “Ali não pôde fazer milagre algum!”, tão grande era a falta de fé daquele povo.

Meus caros, pensemos bem na advertência que esta Palavra de Deus nos faz! O próprio Filho do Pai, em pessoa, esteve no meio do seu povo, conviveu com ele, falou-lhe, sorriu-lhe, abraçou-lhe e, no entanto, não foi reconhecido pelos seus. E por quê? Pela dureza de coração, pela insistência teimosa em esperar um messias de encomenda, sob medida, a seu bel prazer… Valia bem para Israel a censura da primeira leitura de hoje, na qual o Senhor Deus se dirige a seu servo: “Filho do homem, eu te envio aos israelitas, nação de rebeldes, que se afastaram de mim. A estes filhos de cabeça dura e coração de pedra, vou-te enviar, e tu lhes dirás: ‘Assim fala o Senhor Deus’. Quer escutem, quer não, ficarão sabendo que houve entre eles um profeta!” Que coisa tremenda, meus caros: houve entre os israelitas um profeta, e mais que um profeta: o Filho de Deus, o Eterno, o Filho amado… E Israel o rejeitou!

Mas, deixemos Israel. E nós? Acolhemos o Senhor que nos vem? Escutamos com fé sua Palavra, quando ele se dirige a nós na Escritura, aquecendo nosso coração? Acolhemo-lo na obediência da fé, quando ele se nos dirige pela boca da sua Igreja católica, ensinando-nos o caminho da vida? Acolhemo-lo, quando nos fala pela boca de seus profetas? Não tenhamos tanta certeza de que somos melhores que aqueles de Nazaré! Aliás, é bom que nos perguntemos: por que os nazarenos não foram capazes de reconhecer Jesus como Messias? Já lhes disse: porque o Senhor não era um messias do jeito que eles esperavam: um simples fazedor de milagres, um resolvedor de problemas… Jesus, pobre, manso, humilde, era também exigente e pedia do povo a conversão de coração. Mas, há também uma outra razão para os nazarenos rejeitarem Jesus: eles foram incapazes de ver além das aparências. De fato, enxergaram em Jesus somente o filho de José, aquele que correra e brincara nas suas praças, aquele ao qual eles haviam visto crescer. Assim, sem conseguir olhar com mais profundidade, empacaram na descrença. Mas, nós, conseguimos olhar com profundidade? Somos capazes de escutar na voz dos ministros de Cristo a própria voz do Senhor? Somos sábios o bastante para ouvir na voz da Igreja a voz de Cristo?

É exatamente pela tendência nossa, tremenda, de sermos surdos ao Senhor, que Jesus tanto sofreu e que Paulo se queixava das dificuldades do seu ministério. O Apóstolo fala de um anjo de Satanás que o esbofeteava. Que anjo era esse? Ele mesmo explica: suas “fraquezas, injúrias, necessidades, perseguições e angústias sofridas por amor de Cristo”. O drama de Paulo é uma forte exortação aos pregadores do Evangelho e a todos os cristãos. Aos pregadores do Evangelho essa palavra do Apóstolo recorda que o anúncio será sempre numa situação de pobreza humana, de apertos e contradições. A evangelização, caríssimos, não é um trabalho de marketing televisivo como vemos algumas vezes nos “missionários” dos meios de comunicação. O Evangelho do Cristo crucificado e ressuscitado, é proclamado não somente pela palavra do pregador, mas também pela carne de sua vida. Como proclamar a Palavra sem sofrer por ela? Como anunciar o Crucificado que ressuscitou sem participar da sua cruz na esperança firme da sua ressurreição? O Evangelho não é uma teoria, não é um sistema filosófico. O Evangelho é Cristo Jesus encarnado na nossa vida, de modo que possamos dizer como São Paulo: “Eu trago no meu corpo as marcas de Jesus” (Gl 6,17) Triste do pregador que pensar em anunciar Jesus conservando-se para si mesmo. Um diácono, um padre, um bispo, que quisessem se poupar, que separasse a pregação do seu modo de viver, que fosse pregador de ocasião, tornar-se-ia um falso profeta, transformar-se-ia em marketeiro do Evangelho, portanto, inútil e estéril. É toda a vida do pregador que deve ser envolvida na pregação: seu modo de viver, de agir, de vestir, de relacionar-se com os bens materiais, sua vida afetiva, seu modo de divertir-se, seu tipo de amizade… Tudo nele dever ser comprometido com o Senhor e para o Senhor!

Mas, essa palavra de São Paulo na liturgia de hoje vale também para cada cristão. Hoje, somos minoria. O mundo não-crente, secularizado zomba de nós e já não crê no anúncio de Cristo que lhe fazemos. Sentimos isso na pela! Pois bem, quando experimentarmos a frieza e a dura rejeição, quando em casa, no trabalho, nos círculos de amizades, formos ignorados ou ridicularizados por sermos de Cristo, recordemos do Evangelho de hoje, recordemo-nos dos sofrimentos dos apóstolos e retomemos a esperança: o caminho de Cristo é também o nosso; se sofrermos com ele, com ele reinaremos; se morrermos com ele, com ele viveremos (cf. 2Tm 2,11-12) Não tenhamos medo: nós somos as testemunhas, os profetas, os sinais de luz que Deus envia ao mundo de hoje! Sejamos fiéis: o Senhor está conosco, hoje e sempre. Amém.

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