quinta-feira, 16 de outubro de 2014

Muçulmanos protestam contra uso do nome 'Estado Islâmico' por terroristas



Depois da decapitação do guia de montanhismo francês Hervé Gourdel, no mês passado, por um grupo jihadista argelino alinhado com o Estado Islâmico (EI), centenas de muçulmanos se reuniram diante da Grande Mesquita de Paris para expressar seu repúdio à brutalidade de um grupo cujo nome e ideologia, disseram, representam um insulto a muçulmanos de todo o mundo.



Ahmet Ogras, vice-presidente do Conselho Francês da Fé Muçulmana, a entidade que convocou o protesto, disse que o uso do nome Estado Islâmico, agora comum, ameaça estigmatizar os muçulmanos da França, a maior comunidade muçulmana da Europa. Ele disse também que o nome confere legitimidade injustificada a um grupo que promove matanças em nome do islã. "Este não é um Estado -é uma organização terrorista", afirmou Ogras. "Não se pode brincar com as palavras."



Enquanto a batalha liderada pelos EUA contra forças radicais segue adiante no Iraque e na Síria, uma nova frente de guerra linguística se delineia.



Grupos muçulmanos estão criticando o Estado Islâmico em protestos e nas mídias sociais, defendendo nomes alternativos para descrever a facção, hoje conhecida por várias siglas, incluindo EIIS (Estado Islâmico no Iraque e na Síria), EIIL (Estado Islâmico no Iraque e no Levante), ECI (Estado do Califado Islâmico) e EI (Estado Islâmico).



Ban Ki-moon, secretário-geral da ONU, descreveu o grupo como "Un-Islamic Nonstate" (Não Estado Anti-islâmico), mas poucos preveem que a sigla UINS/NEAI ganhe grande aceitação.



Membros da Sociedade Islâmica Britânica e da Associação de Muçulmanos Britânicos escreveram ao premiê David Cameron no mês passado sugerindo que o uso contínuo do nome Estado Islâmico pode servir para radicalizar mais jovens muçulmanos.



A França, que participa dos ataques aéreos contra o grupo no Iraque, lidera o esforço de mudança de nome. No mês passado, o chanceler Laurent Fabius anunciou que o governo francês vai evitar o termo Estado Islâmico ou suas alternativas, EIIS e EIIL. Em vez disso, vai aludir à milícia como Daesh, acrônimo usado por muitas pessoas que falam árabe e que soa como a palavra que significa "esmagar".



Falando perante a Assembleia Nacional, Fabius declarou que o fato de o Estado Islâmico afirmar que representa um califado -um Estado governado por princípios islâmicos- na Síria e no Iraque é uma falsidade geopolítica e linguística. "Trata-se de um grupo terrorista, não de um Estado", declarou. "Eu os vou chamar de Facínoras Daesh."



Nos Estados Unidos, Nihad Awad, do Conselho de Relações Americano-Islâmicas, disse que seu grupo decidiu pela sigla EIIS, mas que ele pessoalmente descreve o EI como "Daesh" -"se bem que às vezes eu diga 'o Estado Perverso'". Vários representantes de associações islâmicas nos EUA disseram que qualquer dos nomes usados para aludir ao grupo é aceitável, desde que não inclua o termo "islâmico".



O presidente Obama já deixou claro que rejeita o rótulo "Estado Islâmico". "O EIIL não é islâmico", afirmou na televisão em setembro, acrescentando depois: "O EIIL não é um Estado".



Peter Neumann, do Centro Internacional para o Estudo da Radicalização, no King's College London, disse que o termo Daesh dificilmente encontrará ressonância internacional, porque o acrônimo EIIL é mais fácil de pronunciar.



Mas, para ele, "o simples fato de dizer as palavras 'Estado Islâmico' não quer dizer que você reconheça o grupo como um Estado. As pessoas entendem que eles são impostores e que um nome é apenas um nome."
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Disponível em: Folha de S. Paulo

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