quinta-feira, 14 de fevereiro de 2013

História da Igreja: Papas que renunciaram ao Pontificado


Na manhã de 11 de fevereiro de 2013, memória de Nossa Senhora de Lourdes, fomos colhidos pela notícia espantosa de que o Santo Padre, o Papa Bento XVI, renunciou ao ministério de Bispo de Roma, Sucessor de São Pedro.

Em discurso ao Consistório dos Cardeais reunidos diante dele, o Papa declarou que o faz "bem consciente da gravidade deste ato" e "com plena liberdade".

É evidente que a renúncia de um Papa é algo inaudito nos tempos modernos. A última renúncia foi de Gregório XII em 1415. A notícia nos deixa a todos perplexos e com um grande sentimento de perda. Mas este sentimento é um bom sinal. É sinal de que amamos o Papa, e, porque o amamos, estamos chocados com a sua decisão.

Diante da novidade do gesto, no entanto, já começam a surgir teorias fabulosas de que o Papa estaria renunciando por causa das dificuldades de seu pontificado ou que até mesmo estaria sofrendo pressões não se sabe de que espécie.

O fato, porém, é que, conhecendo a personalidade e o pensamento de Bento XVI, nada nos autoriza a arriscar esta hipótese. No seu livro Luz do mundo
 (p. 48-49), o Santo Padre já previa esta possibilidade da renúncia. 


Durante a entrevista, o Santo Padre falava com o jornalista Peter Seewald a respeito dos escândalos de pedofilia e as pressões:

PERGUNTA:
 Pensou, alguma vez, em pedir demissão?

RESPOSTA:
 Quando o perigo é grande, não é possível escapar. Eis por que este, certamente, não é o momento de demitir-se. Precisamente em momentos como estes é que se faz necessário resistir e superar as situações difíceis. Este é o meu pensamento. É possível demitir-se em um momento de serenidade, ou quando simplesmente já não se aguenta. Não é possível, porém, fugir justamente no momento do perigo e dizer: "Que outro cuide disso!"

PERGUNTA:
 Por conseguinte, é imaginável uma situação na qual o senhor considere oportuno que o Papa se demita?

RESPOSTA:
 Sim. Quando um Papa chega à clara consciência de já não se encontrar em condições físicas, mentais e espirituais de exercer o encargo que lhe foi confiado, então tem o direito – e, em algumas circunstâncias, também o dever – de pedir demissão.

Ou seja, o próprio Papa reconhece que a renúncia diante de crises e pressões seria uma imoralidade. Seria a fuga do pastor e o abandono das ovelhas, como ele sabiamente nos exortava em sua homilia de início de ministério:
 "Rezai por mim, para que eu não fuja, por receio, diante dos lobos" (24/04/2005).

Se hoje o Papa renuncia, podemos deduzir destas suas palavras programáticas, é porque vê que seja um momento de serenidade, em que os vagalhões das grandes crises parecem ter dado uma trégua, ao menos temporária, à barca de Pedro.

Podemos também deduzir que o Santo Padre escolheu o timing mais oportuno para sua renúncia, considerando dois aspectos:

Ele está plenamente lúcido. Seria realmente bastante inquietante que a notícia da renúncia viesse num momento em que, por razões de senilidade ou por alguma outra circunstância, pudéssemos legitimamente duvidar que o Santo Padre não estivesse compos sui (dono de si).

Estamos no início da quaresma. Com a quaresma a Igreja entra num grande retiro espiritual e não há momento mais oportuno para prepararmos um conclave através de nossas orações e sacrifícios espirituais. O novo Pontífice irá inaugurar seu ministério na proximidade da Páscoa do Senhor.

Por isto, apesar do grande sentimento de vazio e de perplexidade deste momento solene de nossa história, nada nos autoriza moralmente a duvidar do gesto do Santo Padre e nem deixar de depositar em Deus nossa confiança.

Peçamos com a Virgem de Lourdes que o Senhor, mais uma vez, derrame o dom do Espírito Santo sobre a sua Igreja e que o Colégio dos Cardeais escolha com sabedoria um novo Vigário de Cristo.

Nosso coração, cheio de gratidão pelo ministério de Bento XVI, gostaria que esta notícia não fosse verdade. Mas, se confiamos no Papa até aqui, porque agora negar-lhe a nossa confiança? Como filhos, nos vem a vontade de dizer: "não se vá, não nos deixe, não nos abandone!"

Mas não estamos sendo abandonados. A Igreja de Cristo permanecerá eternamente. O que o gesto do Papa então pede de nós, é mais do que confiança. É fé!

Fé naquelas palavras ditas por Nosso Senhor a São Pedro e a seus sucessores:
 "As portas do inferno não prevalecerão!" (Mt 16, 18).

Estas palavras permanecem inabaláveis através dos séculos!

Conheça os Papas que renunciaram*

Papa São Clemente I
(88-96)
Exiliado em "O Ponto", Asia Menor, pelo Imperador Nerva. Renunciou ao Pontificado porém não sem antes indicar o nome de Evaristo para sucedê-lo. Clemente padeceu o martírio no ano 97. Foi lançado ao Mar Negro preso à uma âncora.

Papa São Ponciano
(230-235)
O Papa Ponciano foi o primeiro Bispo de Roma, na história da Igreja que não permaneceu no trono de São Pedro até seu falecimento, já que abdicou em 28 de setembro de 235.

Confirmou a condenação que Demétrio de Alexandria lançou sobre os textos de Orígenes sobre a Ressurreição e ordenou que os Salmos fossem cantados nas igrejas, além da recitação do Confiteorantes de morrer e o uso da saudação Dóminus vobiscum (‘o Senhor esteja convosco’).

Pouco depois de sua renúncia ao Pontificado, Ponciano foi martirizado sendo açoitado até a morte, tendo seu corpo trasladado à Roma onde foi depositado nas Catacumbas de São Calixto.

Papa São Silverio
(536-537)
Ele próprio, filho do Papa Hormisdas,  chegou a ser Papa graças ao ostrogodo Teodato. Teve que enfrentar a oposição dos monofisitas (que negam as duas naturezas de Cristo: humana e divina) professando ter Jesus apenas a natureza divina e da Imperatriz Teodora. Deposto pelo general bizantino Belisário, que elevou Vigílio ao trono pontifício  Silvério preferiu renunciar pelo bem da paz e da Igreja. Vigílio foi então legitimado.

Papa São Martinho I
(649-654)
Deposto e deportado a Quersoneso Táurico, em 653, pelo Imperador Constante II, amigo dos monotelitas, que o fizeram eleger em seu lugar a Eugênio, em 10 de agosto de 654. O Papa Martinho não se opôs a essa designação, atitude que foi considerada como uma renúncia, o que permitiu que seu sucessor reinasse de maneira legítima.

Papa Bento IX
(Reinou de maneira intermitente em três oportunidades entre os anos de 1032 e 1048).
Descendente dos poderosos Teofilactes e Crecencios, e sobrinho de seus predecessores Bento VIII e João XIX, foi eleito aos 12 anos em 1032. Rejeitado pelo povo em 1036 e reestabelecido pelo Imperador Conrado, foi deposto, mais uma vez em 1044 e substituído pelo anti-papa Silvestre III. Para contrariá-lo, Bento IX renunciou em favor de seu padrinho Jean Gratien, a quem vendeu o Pontificado. Em 1047, retomou a cátedra, porém um ano depois devido à intervenção do Imperador Enrique III entregou a Tiara e se retirou ao mosteiro de Grottaferrata para fazer penitência, atitude que permitiu a eleição do Papa Dâmaso II.

Papa São Celestino V
(1294)
Entrou para a Ordem beneditina e, com licença do abade, voltou para a vida de eremita. Assumiu, então, o nome de Pedro de Morrone, pois foi viver no sopé do morro do mesmo nome, onde levantou uma cela, vivendo de penitências e orações contemplativas. 

Em 1251, fundou, com a colaboração de dois companheiros, um convento. Rapidamente, sob a direção de Pedro, o convento abrigava cada vez mais seguidores. Assim, ele fundou uma nova Ordem, mais tarde chamada "dos Celestinos", conseguindo, pessoalmente, a aprovação do papa Leão IX, em 1273. 

Em 1292, morreu o papa Nicolau V e, após um conclave que durou dois anos, ainda não se tinha chegado a um consenso para sua sucessão. Nessa ocasião, receberam uma carta contendo uma dura reprovação por esse comportamento, pois a Igreja precisava logo de um chefe. A carta era de Pedro de Morrone e os cardeais decidiram que ele seria o novo papa, sendo eleito em 1294 com o nome de Celestino V. Entretanto, a sua escolha foi política e por pressão de Carlos II, rei de Nápoles. Com temperamento para a vida contemplativa e não para a de governança, o erro de estratégia logo foi percebido pelos cardeais. 

Pedro Celestino exerceu o papado durante um período cheio de intrigas, crises e momentos difíceis. Reconhecendo-se deslocado, e não sentindo apto para o cargo, renunciou à cátedra de São Pedro.Foi sucedido pelo Papa Bonifácio VIII. Isso gerou nova crise, com o poder civil ameaçando não reconhecer nem a renúncia, nem o novo sumo pontífice. Para não gerar um cisma na Igreja, Pedro Celestino aceitou, humildemente, ficar prisioneiro no castelo Fumone. Ali permaneceu até sua morte.

Papa Gregório XII
(1406-1415)
Foi eleito Papa em 19 de dezembro de 1406, aos oitenta anos de idade. Viveu o período do Grande Cisma do Ocidente quando chegou a haver "três Papas" (na verdade apenas UM Papa e 2 anti-papas). Após ter sido confirmado  legítimo sucessor de Pedro, o Santo Padre Gregório XII, tempos depois, renunciou à cátedra no dia 14 de julho de 1415.

Papa Bento XVI
(2005-2013)
Foi eleito como o 265º Papa, com a idade de 78 anos, sendo o atual Sumo Pontífice da Igreja Católica. Foi eleito em 19 de abril de 2005 para suceder ao Papa João Paulo II.

Bento XVI comunicou sua renúncia em discurso pronunciado, em latim, durante um consistório convocado para anunciar três canonizações. "No mundo de hoje", disse, "sujeito a rápidas mudanças e agitado por questões de grande relevância para a vida e para a fé, para governar a barca de Pedro e anunciar o Evangelho, é necessário vigor, tanto do corpo como do espírito, vigor que, nos últimos meses, diminuiu de tal modo em mim que devo reconhecer a minha incapacidade de administrar bem o ministério a mim confiado. (...) Deverá ser convocado, por quem de direito, o Conclave para eleição do novo Sumo Pontífice".

O Papa deixará o Vaticano às 17h de Roma (3 horas antes da formalização da Renúncia) e irá para a Residência de Verão de Castel Gandolfo. Depois de eleito o seu sucessor, o Papa retirar-se-á para um mosteiro de clausura dentro dos muros do Vaticano.
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Historiadores ainda divergem sobre o número de papas que renunciaram aos seus postos, mas há unanimidade em três casos: Ponciano, Celestino V e Gregório XII.
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Fontes: "Morro" por Cristo, Wikipédia e Canção Nova.

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