segunda-feira, 12 de novembro de 2012

Católicos e evangélicos



Assim como fizeram outras pessoas, eu também cedo à tentação de tecer algumas considerações sobre as eleições municipais ocorridas recentemente no país. E, sendo bispo da Igreja Católica, atenho-me apenas ao aspecto religioso.

Primeiramente, não posso deixar de parabenizar os cristãos – independentemente se católicos ou evangélicos – que participaram do pleito com a maturidade e a lisura que a adesão à fé lhes pede. Quem assim agiu, o fez porque sabe que é impossível encontrar a Deus sem ter os olhos e as mãos voltados para o mundo que nos cerca. «Quem diz: “Eu amo a Deus”, mas detesta o irmão, é mentiroso. Quem não ama o irmão, a quem vê, não pode amar a Deus, a quem não vê. Este é o mandamento que dele recebemos: quem ama a Deus, ame também a seu irmão!» (Jo 4,20-21).

Posto esse princípio fundamental – que pode ser visto como a dimensão social da fé –, permito-me refletir sobre algumas diferenças que percebo entre evangélicos e católicos no que se refere à sua presença e atuação na política partidária.
Começo pelos aspirantes a cargos eletivos. Pelo menos em Dourados, onde resido, nunca escutei queixas de evangélicos contra pastores que se apresentam como candidatos. Em contrapartida, foram inúmeras as vezes em que ouvi católicos declarando: «Padre  não deve se meter em política!». Talvez o façam para obedecer ao Código de Direito Canônico: «Os clérigos são proibidos de assumir cargos públicos que implicam participação no exercício do poder civil» (Cân. 285), ou, mais provavelmente, para que os sacerdotes se atenham à própria vocação, que é «procurar o bem do povo e de suas relações com Deus» (Hb 5,1).

Outra diferença é a unidade que, na época das eleições, vigora entre os evangélicos, mas que parece quase inexistente entre os católicos. São uma multidão os evangélicos que, acreditando que seus candidatos têm condições de levar adiante um projeto de renovação da sociedade brasileira, votam maciçamente neles. Enquanto isso, a maior parte dos católicos – evidentemente, os que o são apenas porque foram batizados – nem sempre alimentam essa preocupação. O pior é que essa apatia se transforma em divisão, que contagia os próprios candidatos. Assim, não poucas vezes, na mesma comunidade, surgem dois ou três candidatos, os quais, dividindo os votos entre si, fazem com que todos saiam perdendo, eles e a população.

Foi-me referido que, em Dourados, dos 19 vereadores eleitos ou reeleitos, seis são evangélicos (dois deles, pastores), dois ou três não têm uma posição definida, e dez seriam católicos. “Seriam”, porque – a não ser que as aparências enganem – há diferenças entre eles: enquanto os evangélicos estariam engajados em suas igrejas, dentre os católicos apenas quatro ou cinco o seriam. Não sei se tais afirmações correspondem à verdade. O que sei é que não foram poucos os católicos que transformaram as eleições num comércio de votos. A própria Rádio Coração – uma emissora católica – viu-se obrigada a transmitir uma programação política onde, não poucas vezes, as agressões superavam as propostas e planos de governo.

Evidentemente, não é suficiente dizer-se evangélico ou católico para ser um bom administrador. François Mitterrand (1916/1996), apesar de descrente, acabou se tornando um político sagaz e competente. Mas, que a fé ajuda, disso não tenho a menor dúvida. Quem está aberto a Deus, obtém as luzes e as forças de que necessita para concretizar ideais que engrandecem e beneficiam a ele e às pessoas que o cercam. Um dos melhores projetos políticos em andamento na atualidade – a União Europeia – nasceu da fé de três grandes estadistas cristãos, cujo processo de beatificação já foi iniciado: Konrad Adenauer (1876/1967), Alcides De Gasperi (1881/1954) e Robert Schuman (1883/1963) .

Quando bem entendida e melhor ainda praticada, a religião não se confina à sacristia. Pelo contrário, mantém acesa a chama do idealismo e proporciona ao cristão a sabedoria e a coragem de que necessita para atuar eficazmente em favor da sociedade. É o que garante São Paulo: «A religião para tudo é útil» (1Tm 4,8). Com ele concorda o Papa Bento XVI, para quem «somente em Cristo Deus revela o homem ao próprio homem e oferece a verdadeira solução de seus problemas e necessidades».

Dom Redovino Rizzardo
Bispo de Dourados (MS)

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