domingo, 24 de dezembro de 2017

Síria: Apesar de livres de minas, igrejas de Raqa ficarão vazias no Natal


Duas igrejas históricas de Raqa ficaram livres das minas a tempo para o Natal, mas nenhum cristão ficou para as festas neste que foi o principal reduto dos extremistas islâmicos na Síria. Todos fugiram dos combates.

Antes de perder Raqa, em outubro, os extremistas do grupo Estado Islâmico (EI) plantaram minas em toda a cidade, transformada em ruínas pelos bombardeios aéreos da coalizão liderada pelos Estados Unidos.

Seis sapadores (militares especializados em trabalhos diversos, como a retirada de minas) da organização especializada ROJ concluem a espinhosa tarefa em dois edifícios desfigurados: a Igreja dos Mártires e a da Anunciação. Eles levam detectores consigo e usam uniformes beges e uma braçadeiras vermelhas adornadas com caveiras.

Os dois prédios em ruínas estão livres de minas, mas não haverá missa de Natal, afirmam líderes religiosos. A imensa maioria dos moradores partiu de Raqa, tanto cristãos quanto muçulmanos.

“Como as festas se aproximam, nosso objetivo é permitir aos nossos irmãos cristãos que voltem para praticar seus ritos religiosos”, afirma o assessor técnico da ROJ, Abdelhamid Ayo.

Da igreja armênia católica dos Mártires, no centro da cidade, restou apenas o esqueleto de cimento. Os extremistas derrubaram a cruz no topo e transformaram o templo em uma prisão, após conquistarem a cidade, em 2014. Também cavaram um túnel subterrâneo para se deslocarem.

“Há milhares de minas. Terminamos a metade de Raqa e até agora retiramos 1.300”, reforça Ayo, de 33 anos.

As Forças Democráticas Sírias (FDS), uma coalizão curdo-árabe, apoiada pelos Estados Unidos, expulsaram o EI de Raqa. Mas apenas uns poucos moradores se arriscaram a voltar.

“Não há absolutamente nada previsto em Raqa”, afirma Butros Mariati, da diocese armênia católica de Aleppo (norte), à qual a igreja dos Mártires é subordinada.

“A igreja está em ruínas”, lamenta.

Os milhares de cristãos armênios e sírios que viviam em Raqa representam cerca de 1% da população local, muçulmana sunita em sua grande maioria.

Quando o EI chegou, em 2014, os cristãos e outras minorias religiosas fugiram por medo do terror imposto pelos extremistas, com os quais tinham três opções: se converter, pagar um imposto ou morrer.

Entre os poucos civis que decidiram voltar, um ou vários morrem diariamente na explosão acidental de minas. Uma mensagem nos muros de Raqa adverte: “Perigo! Minas”.

Nayef al Madfaa é um dos poucos que se aventurou. Ele o fez para checar o estado de sua casa, situada atrás da igreja dos Mártires.

“Em Raqa não havia diferença entre muçulmanos e cristãos. Todos vivíamos juntos, felizes”, garante este muçulmano, que suspira apontando para várias casas abandonadas.

“Todos os cristãos fugiram de Raqa. Antes, havia alegria em todas as partes, mas expulsaram a todos nós”, lamenta.

“O pinheiro de Natal era colocado neste canto e as crianças entravam na igreja com seus pais”, lembra o sexagenário. “Quando vejo apenas destruição ao meu redor, fico triste”. 

– ‘Partiram’ –

O panorama da igreja da Anunciação, incendiada pelo EI, é igualmente desolador.

Um nicho que antes abrigava uma estátua da virgem Maria agora está vazio. “Deus é maior. Glória a Deus”, escreveram os jihadistas. Os muros semidestruídos estão cobertos de pichações similares.

“O EI transformou a igreja em um armazém de armas. Queimaram livros e bíblias”, lembra Mahmud al Jumaa, de 23 anos.

“Quando os combates se intensificaram, o fizeram explodir, enquanto gritavam ‘Deus é maior que todos os infiéis e vamos fazer explodir esta igreja para que (o presidente americano Donald) Trump não possa rezar’” nela, conta, em frente ao prédio em ruínas.

Ele também lembra e época de coexistência pacífica entre cristãos e muçulmanos. “Nós éramos vizinhos da igreja, celebrávamos com nossos irmãos, cristãos, suas festas e eles faziam o mesmo conosco”.

“Agora não há mais cristãos. Todos partiram, e com eles, as celebrações e as bonitas festas de Natal”.
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Aleteia/ AFP 

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