domingo, 20 de agosto de 2017

A Religião Salva?


Em síntese: A Religião, entendida como instituição, não salva. Só Jesus Cristo, segundo o protestantismo, salva… Salva, porém, (dizem os católicos) mediante seu Corpo Místico que é a Igreja-instituição. A Religião, que consiste em aderir à Igreja, vem a ser o sacramento pelo qual passa a salvação que vem de Cristo. A instituição, que goza da assistência de Cristo, resguarda os fiéis contra o subjetivismo, que tende a destruir a mensagem revelada. Está claro, porém, que a fé será sempre o princípio dinamizador da vida do cristão na Igreja.
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No diálogo ecumênico os interlocutores protestantes colocam a pergunta “Religião salva?”, pergunta à qual dão resposta negativa. Esta atitude merece consideração.

1. O problema

Eis a mensagem enviada a PR via internet:

“As palavras de Tiago, irmão do Senhor, líder espiritual da Igreja primitiva em Jerusalém, martirizado pelos judeus no ano 62, nos ensinam o que é religião:

A religião pura e sem mácula, para com o nosso Deus e Pai é esta: ‘visitar os órfãos e as viúvas nas suas tribulações e a si mesmo guardar-se não contaminado do mundo’ (Tg 1, 27).

Religião, portanto, é algo pessoal, algo que se desenvolve em duas dimensões: uma dimensão humana, terrena, na qual movidos por amor ao próximo e compaixão pelos necessitados, nós os auxiliamos em suas ‘tribulações’ (na sociedade judaica da época, por exemplo, os órfãos e viúvas eram os necessitados); a outra dimensão é a espiritual, em que nos relacionamos diretamente com o Deus e Pai, guardando-nos daquilo que este mundo tem a nos oferecer e que pode levar à corrupção do caráter e contaminação da alma. Coisas, enfim, que nos macularão e nos afastarão de Deus.

Vemos, então, que o coração da verdadeira religião não se manifesta na institucionalização de dogmas, credos ou ritos, mas na prática cotidiana do amor, porque Deus é amor e a sua lei é o amor. Como ensinou Jesus Cristo, nosso Salvador, a lei de Deus se resume a:

‘Amarás o Senhor teu Deus, de todo o teu coração, de toda a tua alma, de todas as tuas forças e de todo o teu entendimento; e amarás o teu próximo como a ti mesmo’ (Lc 10, 27).

Porque Deus é único, e cada um de nós somos seres únicos, o que Ele espera de nós é que, por meio de Jesus Cristo, a cada dia vivamos esta religião pura e sem mácula”.

Dizem outros: a Religião é um conjunto de crenças, leis e práticas codificadas, aptas a atrofiar a fé, suscitando a impressão de que a pessoa religiosa pode obter efeitos mágicos.

Em nossos dias é o protestantismo neopentecostal que professa tais idéias, tendo em vista esvaziar os conceitos de Igreja e magistério da Igreja em favor da tese do livre exame da Bíblia: a cada crente se confere o direito de configurar o Cristianismo a seu modo, já que “Religião-lgreja” não salva.

Perguntamos:

2. Que dizer?

Proporemos seis observações a respeito: 

1) Sem dúvida, a fé é o dínamo da vida espiritual; é a fonte de toda prática religiosa. Cf. Rm 1,17: “o justo vive da fé”.

2) O princípio “Somente a fé” acarreta o risco do subjetivismo religioso alimentado pela prática do livre exame da Bíblia; assim vai-se dilacerando cada vez mais o patrimônio da fé ou da Revelação Divina, como acontece nas comunidades dos Mórmons e das Testemunhas de Jeová.

3) Para conter o subjetivismo esvaziador, faz-se necessária uma instância objetiva, que paire acima dos subjetivismos ou dos “achismos (eu acho que…)” que é a Igreja com seu magistério assistido pelo Espírito Santo; cf. Jo 14, 25s. A Igreja é Mãe e Mestra, que tem a promessa da infalibilidade em matéria de fé e de Moral.

4) Mais: o Cristianismo não é simplesmente uma escola, na qual o mestre dá as suas aulas e vai embora. Cristo não é somente um Mestre martirizado; é um tronco de videira, da qual nós somos os ramos (cf. Jo 15,1-5); é Cabeça de um Corpo, do qual somos os membros cf. 1Cor 12, 12-20. Ele continua vivo e atuante na Terra mediante os sacramentos: o Sacramento da Igreja, que prolonga o Sacramento da Encarnação e que se estende a cada cristão através dos sete sacramentos da Liturgia. Em outros termos: Deus se dá aos homens não de maneira meramente privada e individualista, mas mediante sinais, que são a humanidade de Jesus, o Corpo de Cristo que é a Igreja, e os sete sinais sacramentais (água, pão, vinho, gestos, palavras), que perfazem o que se chama uma instituição. Esta é indispensável para que haja ordem numa sociedade.

5) Está claro que somente Jesus Cristo salva, mas Ele quer salvar mediante a Igreja, da qual Ele é Cabeça, Igreja que professa o seu Credo, tem seu Código de Moral e seus ritos sagrados… Este conjunto institucional não sufoca a fé, mas a preserva contra o subjetivismo deteriorante.

6) Para preencher seu papel de instrumento da salvação, a Religião ou a religiosidade do cristão há de ser esclarecida e consolidada mediante a leitura e o estudo, preservando-a de cair na superstição e no sincretismo. Cada fiel católico saberá avaliar as modalidades de aprofundamento da fé de que precisa.

Eis em que termos se pode dizer que, se a Religião não salva, Ela é ao menos indispensável instrumento de salvação.


Dom Estêvão Bettencourt
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Cléofas/ Revista Pergunte e Responderemos. n.518. Ago.2005

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