sábado, 4 de março de 2017

Por que os padres não podem se casar?


Será oportuno, antes do mais, reconstituir brevemente a histórico da questão.

Na Era Apostólica, São Paulo recomendava que o bispo fosse “marido de uma só esposa” (1Timóteo 3,3; Tito 1,6). Com isto, certamente não queria afirmar que todo bispo tinha a obrigação de ser casado, pois nesta hipótese contradiria à palavra do Senhor, que reconhece e preza “aqueles que se castraram (=se conservaram virgens) por causa do reino dos céus” (Mateus 19,12); contradiria também a si mesmo, visto que Paulo desejava aos fiéis “fossem todos como ele mesmo era” (1Coríntios 7,7), isto é, celibatários, a fim de se entregarem sem divisão ao serviço do Senhor (cf. 1Coríntios 7,32-34). Na verdade, o Apóstolo queria inculcar que, no século I da nossa era, quando as comunidades cristãs constavam de muitos adultos e casados recém-convertidos, não se escolhesse para o episcopado algum varão casado em segundas núpcias (bígamo em sentido lato); estas [segundas núpcias], com efeito, eram geralmente desaconselhadas (não, porém, condenadas) pela antiga Igreja, por parecerem uma expressão de incontinência.

Houve, pois, nos tempos iniciais do Cristianismo, bispos, sacerdotes e diáconos legitimamente casados; nenhuma lei lhes proibia o uso do matrimônio.

Mais frequentes, porém, desde os primórdios eram os clérigos que espontaneamente abraçavam o celibato. A razão disto era o conselho do Senhor que exortava à continência (“quem o pode entender, entenda” – Mateus 19,12); eram também os dizeres de São Paulo que, sem derrogar a santidade do matrimônio, afirmava ser a virgindade um estado superior, estado no qual se pode servir ao Senhor sem solicitude supérflua (cf. 1Coríntios 7,32-34).

No século IV esta praxe espontânea começou a ser sancionada por leis de concílios regionais, que visavam assegurar aos eclesiásticos os benefícios do celibato. Diversas, porém, foram as prescrições promulgadas no Oriente e no Ocidente.



No Oriente, a legislação chegou ao seu termo definitivo em 692 (Concilio Trulano II ou Quinissexto); foi então proibido aos sacerdotes, diáconos e subdiáconos contrair matrimônio após receberem a respectiva ordem sacra; caso, porém um leigo casado desejasse ordenar-se, as núpcias anteriormente contraídas não lhe seriam empecilho, nem se exigiria que, depois de ordenado, deixasse de viver maritalmente com a esposa; apenas se lhe pedia que se abstivesse do consórcio conjugal quando estivesse para celebrar as funções do altar (que não eram cotidianas); ao sacerdote viúvo ficaria vedado casar-se em segundas núpcias. Quanto aos bispos, o Concilio lhes prescrevia continência absoluta, de sorte que, se um futuro bispo estivesse casado, a esposa, depois de sua sagração, deveria recolher-se a um mosteiro distante, ficando o marido obrigado apenas a prover às despesas de sua subsistência. São estas as determinações ainda hoje vigentes entre os cristãos orientais, quer cismáticos (com poucas exceções), quer unidos a Roma; o Direito Canônico não lhes impõe o celibato, que nunca foi obrigatório na tradição oriental. Em vista da cláusula um pouco-mais rigorosa imposta aos bispos, estes no Oriente são de preferência nomeados dentre os monges, que por profissão abraçam a castidade perfeita.No Ocidente, o primeiro decreto restritivo se deve ao Concílio de Elvira (Espanha) reunido por volta do ano de 300: proibia aos bispos, sacerdotes e diáconos, sob pena de degradação, uso do matrimônio e o desejo de ter prole (cânon 33). Esta determinação, que a princípio só visava a Espanha, em menos de um século estava em vigor (às vezes sob forma de conselho apenas) em todo o Ocidente. A fórmula definitiva de tal disciplina foi promulgada pelo Concílio Ecumênico do Latrão I em 1123: a todos os clérigos, a partir do subdiaconato, foi prescrito de maneira peremptória o celibato; em consequência, o matrimônio contraído por um eclesiástico depois da respectiva ordenação era declarado inválido. O Concilio de Trento promulgou de novo tal lei no século XVI, época em que os Imperadores Ferdinando I (1556-1564) e Maximiliano II (1564-1576), da Alemanha, exerciam pressão sobre o Papa Pio IV (1559-1565) a fim de obterem o casamento dos sacerdotes de seu reino, ameaçados pela rebordosa luterana.


Sucessivas determinações da autoridade da Igreja têm corroborado frequentemente até nossos dias a obrigação celibato clerical. No início do século XX, violenta campanha se desencadeou contra essa praxe; na Tchecoslováquia, por exemplo, vários sacerdotes, reivindicando o direito de se casar, aderiram à “Iednota”, associação de tendências cismáticas, à qual o Papa Bento XV resistiu energicamente, declarando numa alocução consistorial de 16 de dezembro de 1920:



– “Veneráveis Irmãos: o que várias vezes já afirmamos ocasionalmente, Nós agora o atestamos solene e categoricamente: nunca esta Sé Apostólica atenuará ou mitigará essa lei profundamente santa e salutar do celibato eclesiástico; muito menos ainda a abolirá” (Acta Apostolicae Sedis XII [1920], p.585). 
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Front Católico

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