quarta-feira, 8 de fevereiro de 2017

Somos herdeiros de Deus e herdeiros com Cristo


Como diz o Apóstolo, aquele que pelo Espírito faz morrer as obras da carne viverá. E não é para estranhar que viva, pois quem tem o Espírito de Deus torna-se filho de Deus. Como filho de Deus, não recebe o espírito de escravidão mas o espírito de adoção filial, e é o Espírito Santo que dá testemunho ao nosso espírito de que somos filhos de Deus. Este testemunho é do Espírito Santo, pois é Ele que clama em nossos corações: Abá, Pai, como vem escrito na Epístola aos Gálatas. Verdadeiramente grande é também o testemunho de que somos filhos de Deus, porque somos herdeiros de Deus e herdeiros com Cristo. É herdeiro com Cristo aquele que participa da sua glória; mas só participa da sua glória aquele que toma parte na sua paixão, sofrendo com Ele.

Para nos animar a tomar parte na paixão de Cristo, acrescenta que todos os nossos sofrimentos são inferiores e desproporcionados à recompensa dos bens futuros que havemos de receber pelas nossas fadigas, quando, renovada plenamente em nós a imagem de Deus, merecermos contemplar a sua glória face a face.

Para exaltar a magnificência da revelação futura, acrescenta ainda que toda a criação – agora submetida à caducidade deste mundo, não por sua vontade, mas na esperança de ser libertada – aguarda ansiosamente a manifestação dos filhos de Deus; e espera de Cristo a graça de ser ajudada a cumprir a sua função, até ser também ela liberta da corrupção e admitida a tomar parte na liberdade gloriosa dos filhos de Deus, de modo que, ao revelar-se esta glória, seja uma e a mesma liberdade, a das criaturas e a dos filhos de Deus. Entretanto, enquanto esta manifestação é adiada, toda a criação geme na expectativa da glória da nossa adoção e redenção, e sofre as dores da maternidade, ansiosa por dar à luz aquele espírito de salvação e ser libertada da escravidão da caducidade presente.

No seu sentido imediato, isto quer dizer que os que têm as primícias do Espírito gemem na expectativa da adoção filial, que é a redenção de todo o homem. Esta adoção filial terá a sua realização perfeita quando todo aquele que tem as primícias do Espírito, como filho adotivo de Deus, chegar a ver finalmente face a face o bem divino e eterno. De fato, a Igreja do Senhor possui desde já a adoção filial, por meio do Espírito que nela clama: Abá, Pai, como se pode ler na Epístola aos Gálatas. Mas só será perfeita quando ressuscitarem para a vida incorruptível e gloriosa todos aqueles que mereceram ver a face de Deus; então sim, a natureza humana terá alcançado a verdadeira e plena redenção. Por isso afirma o Apóstolo, cheio de confiança: Fomos salvos na esperança. De facto, a esperança também nos salva, como a fé, da qual se disse: A tua fé te salvou.


Das Cartas de Santo Ambrósio, bispo

(Ep. 35, 4-6, 13: PL 16 [ed. 1845], 1078-1079.1081) (Sec. IV)

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