quarta-feira, 15 de junho de 2016

Homilética: 12º Domingo do Tempo Comum - Ano C: "A Cruz que salva".





A liturgia do XII Domingo, no Evangelho (Lc. 9, 18-24), mostra o caminho do verdadeiro Messias e de quem quiser seguí-Lo.

No final de sua atividade na Galiléia, Jesus, depois de ter orado, provoca os Apóstolos a dizer o que pensam dele, de sua identidade e missão: “Quem sou Eu no dizer do povo? E vós, quem dizeis que Eu sou?” (Lc 9, 19-20).

Responderam-lhe: “João Batista… Elias… ou um dos antigos profetas…” Reconhecem em Jesus um grande Mestre, um operador de milagres, mas um homem apenas…

Porém, os discípulos deviam ter compreendido algo mais, pois foram testemunhas da seus milagres e destinatários privilegiados de sua doutrina. Por isso Jesus acrescenta: Mas, para vós, quem sou Eu?

Pedro, em nome de todos, responde: “Tu és o Cristo de Deus”. A resposta era exata! E Jesus completa, apontando “o Caminho de Jesus”, falando pela primeira vez de sua Paixão…

Para os discípulos, que esperavam um Messias-Rei, tal afirmação deve ter sido muito dura e decepcionante… Mas Jesus não volta atrás, pelo contrário, reafirma que o Caminho do Discípulo é o mesmo: “Se alguém me quer seguir, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia, e siga-me” (Lc 9, 23).

Ele irá à frente para dar o exemplo: será o primeiro a levar a cruz. Quem quiser ser seu discípulo, há de imitá-Lo. E conclui: “Aquele que quiser salvar a sua vida, vai perdê-la; e quem perder a sua vida por causa de Mim, esse a salvará.” (Lc 9, 24).

O discípulo é chamado a imitar Jesus, não apenas uma vez, mas dia após dia, negando-se a si mesmo, (vontade, inclinação, gostos) para se conformar com o Mestre sofredor e crucificado.

O cristão não pode passar por alto esses ensinamentos de Jesus Cristo. Deve arriscar-se, jogar a vida presente em troca de conseguir a eterna.

A exigência do Senhor inclui renunciar à própria vontade para identificá-la com a de Deus, não aconteça que, como comenta São João da Cruz, tenhamos a sorte de muitos “que queriam que Deus quisesse o que eles querem, e entristecem-se de querer o que Deus quer, e têm repugnância em acomodar a sua vontade à de Deus. Disto vem que muitas vezes, no que não acham a sua vontade e gosto, pensam não ser da vontade de Deus e, pelo contrário, quando se satisfazem, crêem que Deus Se satisfaz, medindo também a Deus por si, e não a si mesmos por Deus” (Noite Escura, liv. I, Cap. 7, nº. 3).

O fim do homem não é ganhar os bens temporais deste mundo, que são apenas meios ou instrumentos; o fim último do homem é o próprio Deus, que é possuído como antecipação aqui na terra pela Graça, e plenamente e para sempre na Glória. Jesus indica qual é o caminho para conseguir esse fim: negar-se a si mesmo (isto é, tudo o que é comodidade, egoísmo, apego aos bens temporais) e levar a cruz. Porque nenhum bem terreno, que é caduco, é comparável à salvação eterna da alma. Diz São Tomás: “O menor bem da Graça é superior a todo o bem do universo” (Suma Teológica, I-II, q.113, a. 9).

A Cruz é sinal do cristão. Está presente em toda parte, com muitos nomes…

Que o Senhor nos conceda a graça de também segui-Lo na Cruz; de perder a vida por causa de Cristo para salvá-la.

O ensinamento de Jesus é claro: é necessário fazer tudo tendo em vista a vida eterna; para ganhar este bem podemos gastar a vida terrena. Em outra ocasião Jesus lembrou: “de que vantagem tem um homem em ganhar o mundo inteiro, se se perder a si mesmo ou causar a própria ruína?” (Lc 9, 25).

E como a paixão do Senhor conduziu à alegria da ressurreição, assim o cristão, que carregue com a cruz até perder a vida por Cristo, salvá-la-a, encontrando-a nEle na glória eterna.

COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

Leituras: Zc 12,10-11;13,1; Gl 3,26-29; Lc 9,18-24

Há palavras da Sagrada Escritura que são muito agradáveis ao ouvido: “O Senhor é o meu pastor, nada me faltará” (Sal 22), “Vinde a mim, vós todos os que estais aflitos sob o fardo, e eu vos aliviarei” (Mt 11,28), “Tudo posso naquele que me conforta” (Fl 4,13), “Tu, que habitas sob a proteção do Altíssimo, que moras à sombra do Onipotente (…)” (Sal 90). Outras, ao contrário, são menos agradáveis: “Não podeis servir a Deus e à riqueza” (Mt 6,24), “Afasta-te de mim, Satanás, porque teus sentimentos não são os de Deus, mas os dos homens” (Mc 8,33), “vai, vende tudo o que tens e dá-os aos pobres, e terás um tesouro no céu. Depois, vem e segue-me” (Mc 10,21). Poderíamos continuar fazendo uma lista, mas já é suficiente. Talvez, uma dessas palavras incômodas do Evangelho é a de hoje: renúncia. Jesus pede como exigência para segui-lo o renegar-se a si mesmo, tomar a cruz de cada dia, perder (doando) a vida pelo Reino (cfr. Lc 9,23-24).

Essa tendência de selecionar o que mais gostamos na Bíblia, deixando de lado o que nos incomoda, poderia aplicar-se à doutrina da Igreja, expressão fiel do Evangelho. Pode-se até aceitar que Deus é uno e trino, que Jesus Cristo é Salvador, que Maria é Mãe de Deus e sempre Virgem; mas a dificuldade se mostra quando se fala da doutrina da Igreja sobre o respeito à vida desde a sua concepção natural até o seu término natural, da doutrina católica sobre a castidade, ou ainda, da obrigatoriedade de participar da Missa todos os domingos e dias santos. Como é importante aceitar toda a doutrina cristã e influenciar na sociedade, desde o cargo profissional que se ocupa, para que haja um ambiente mais humano e cristão nesse mundo!

Fazer uma seleção dentro da Sagrada Escritura e da Doutrina da Igreja não está bem! Seguir a Cristo é uma decisão com muitas conseqüências e que conforma toda a existência. Nós não podemos criar o nosso próprio código doutrinal e ético e depois apresentá-lo como se fosse doutrina de Cristo e de sua Igreja. Não! Ou se aceita ou não se aceita!

Outra coisa bem diferente é dispor-se a caminhar com Cristo aceitando tudo o que ele pede, mas, ao mesmo tempo, encontrar dificuldades à hora de realizar essa doutrina na própria vida. Ter dificuldades, e até mesmo pecar, é a pura realidade, dura realidade, do ser humano nesta terra. No entanto, se depois de um pecado seja ele qual for, nos arrependemos de coração, procuramos fazer uma boa confissão e um bom propósito de lutar para ser santos, para agradar o nosso bom Deus, fiquemos tranqüilos. Isso não é hipocrisia, é simplesmente o conhecimento de si mesmo unido à confiança no amor e no perdão de Deus. O que não pode acontecer é que por não conseguirmos fazer as coisas bem, digamos que o bem está mal e que o mal está bem.

Há um ditado que diz que quem não vive como pensa, acaba pensando como vive. Que Deus nos livre dessa ruptura nas nossas vidas. É preciso ser coerentes! A partir do momento que decidimos seguir a Cristo, aceitemos tudo o que ele nos propõe. Digamos-lhe que é difícil e que cairemos se ele não nos ajudar. Jesus nos entenderá. Não podemos seguir a Cristo mantendo as nossas próprias idéias, quando essas são errôneas. Além do mais, Jesus Cristo não é uma idéia, é uma Pessoa.

Isso pode ser duro para escutar e para pregar no mundo atual, mas é preciso acreditar que as pessoas desejam a verdade, o bem e a autêntica beleza. Jesus Cristo não muda a sua doutrina! Quando Jesus falou da Eucaristia, os seus ouvintes acharam que era uma doutrina muito dura e inadmissível. Qual foi a resposta de Jesus? Não retirou nenhuma só letra daquilo que tinha dito (cfr. Jo 6,60-67). A Igreja não pode falsificar o Evangelho porque nós somos fracos e nem sempre conseguimos vivê-lo, é o Evangelho quem tem que fortalecer-nos e modificar-nos.

PARA REFLETIR

A Palavra que hoje escutamos coloca-nos diante da questão fundamental de nossa fé: quem é Jesus de Nazaré? Sejamos espertos; estejamos atentos a um detalhe importantíssimo: Jesus distingue a pergunta sobre a opinião do mundo daquela outra, sobre a fé dos discípulos. “Quem diz o povo que eu sou?” E as opiniões são humanas e, portanto, incompletas, parciais, superficiais: “Uns dizem que és João Batista; outros, que és Elias; mas outros acham que és algum dos antigos profetas que ressuscitou”. Ainda hoje é assim: o mundo não poderá jamais compreender Jesus em sua profundidade e verdade última. Uns acham-no um sábio; outros, um iluminado, ou um filósofo, ou um humanista, ou um revolucionário romântico, do tipo Che Guevara; outros acham-no, sinceramente um alienado ou um falso profeta… Em geral, o mundo atual, vê-lo quase como um mito, bonzinho, romântico, mas sem muita serventia prática…

Mas, Jesus, pergunta aos discípulos, pergunta a nós: “E vós, quem dizeis que eu sou?” A resposta de Pedro é perfeita, é completa: “Tu és o Cristo, o Ungido, o Messias de Deus”. Esta resposta não veio da lógica humana, da inteligência ou da esperteza de Pedro. Em Mateus, Jesus afirma-o claramente: “Bem-aventurado és tu, Simão, filho de Jonas, porque não foi carne ou sangue que te revelaram isso, e sim o meu Pai que está no céu” (Mt 16,17). A afirmação do Senhor é clara, direta e gravíssima: carne e sangue, isto é, a só inteligência humana, não pode alcançar quem é Jesus! Somente na revelação do Pai, isto é, somente na experiência da fé da Igreja, nós podemos ter acesso ao mistério de Cristo, à sua realidade profunda. Portanto, não nos deve surpreender se o mundo tem dificuldade de crer realmente, de aceitar seriamente o Cristo e as exigências do seu Evangelho! Não devemos nos importar muito com o que as revistas e as ciências (história, sociologia, antropologia…) dizem a respeito de Jesus. Elas não conseguem penetrar no núcleo do seu mistério; ficam sempre no limiar, na soleira. Então, é na escuta fiel e devota da Palavra, na oração pessoal, na vida da comunidade eclesial, no empenho sincero e sacrificado de viver o Evangelho com suas exigências e, sobretudo, na celebração dos santos mistérios que podemos fazer uma experiência autêntica de quem é Jesus. Não cremos simplesmente no Jesus que a ciência ou a história podem apreender; cremos no Cristo crido, adorado, experimentado e anunciado pela Igreja, a partir do testemunho dos apóstolos!

Mas, tem mais! O núcleo do mistério de Cristo é o mistério de sua cruz. Observe-se bem: assim que Pedro afirma que Jesus é o Messias, ele precisa, esclarece que tipo de Messias ele é: “O Filho do homem deve sofrer muito, ser rejeitado… deve ser morto e ressuscitar ao terceiro dia”. Somente na cruz o discípulo pode reconhecer em profundidade o seu Senhor. Mas, a cruz não é um teoria; é uma realidade em nossa vida e na vida do mundo: a cruz da solidão, do fracasso, da doença, das lágrimas, da pobreza, da morte… Somente quando abraçamos na nossa cruz a cruz de Cristo, podemos, então, compreendê-lo: “Se alguém me quer seguir, quer ser meu discípulo, renuncie a si mesmo, tome sua cruz cada dia, e siga-me!” Fora da cruz, fora do seguimento de Cristo até o fim, não há verdadeiro conhecimento do Senhor, não há a mínima possibilidade de uma verdadeira comunhão com ele. São Paulo nos emociona, quando afirmou: “O que era para mim lucro eu o tive como perda, por amor de Cristo. Mais ainda: tudo eu considero perda, pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor. Por ele, eu perdi tudo e tudo tenho como esterco, para ganhar a Cristo e ser achado nele.. para conhecê-lo, conhecer o poder da sua ressurreição e a participação nos seus sofrimentos, conformando-me com ele na sua morte, para ver se alcanço a ressurreição” (Fl 3,7-11). É preciso que rejeitemos claramente um cristianismo bonzinho, almofadinha, burguês, bem comportadinho, que agrade ao mundo! O cristianismo é radical, é escandaloso, na sua essência, é incompreensível ao mundo “A linguagem da cruz é loucura para aqueles que se perdem!” (1Cor 1,18) – Será que não andamos meio esquecidos disso? E, no entanto, “para aqueles que se salvam, para nós, é poder de Deus” (1Cor 1,19). Na fé, contemplamos a cruz do Senhor, tão dura para ele e para nós, e vemos nela a fonte de purificação e de vida de que fala a primeira leitura da missa de hoje. Do coração amoroso e ferido do Cristo, brota a vida do mundo e o sentido último da nossa existência. As palavras são impressionantes: “Derramarei um Espírito de graça e de oração… Eles olharão para mim. Quanto ao que traspassaram, haverão de chorá-lo, como se chora a perda de um filho único, e hão de sentir por ele o que se sente pela morte de um primogênito. Naquele dia, haverá uma fonte acessível para a ablução e a purificação”.

Eis o escândalo: não cremos na tocha olímpica, não cremos que a globalização trará a salvação, não cremos que a ciência salve o ser humano dos demônios e monstros do seu coração, não cremos que a tecnologia nos faça mais felizes, não cremos que o esporte traga a paz universal, não esperamos que o prazer e o poder nos saciem o coração! Não somos idólatras para a perdição! Cremos que Jesus é o Cristo; cremos que pela sua encarnação, cruz e ressurreição ele nos deu uma vida nova, uma torrente de vida na potência do seu Espírito Santo. Cremos que Jesus é a nossa verdade, o nosso caminho e o sentido último da realidade. Por isso nele fomos batizados, dele nos alimentamos e nele queremos viver.

Quando levarmos isso a sério, seremos cristãos e iluminaremos o mundo. Que o Senhor no-lo conceda por sua misericórdia. Amém.

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