segunda-feira, 4 de janeiro de 2016

Homilética Festa do Batismo do Senhor* - Ano C: "Somos incorporados a Cristo pelo Batismo".


A Festa do Batismo do Senhor encerra o ciclo das Festas da Manifestação do Senhor, o ciclo de Natal. Comemoramos o Batismo de Jesus por São João Batista nas águas do rio Jordão. Sem ter mancha alguma que purificar, Jesus quis submeter-se a esse rito tal como se submetera às demais observâncias legais que também não o obrigavam.

O Senhor desejou ser batizado, diz Santo Agostinho, “para proclamar com a sua humildade o que para nós era uma necessidade”. Com o batismo de Jesus, ficou preparado o Batismo cristão, diretamente instituído por Jesus Cristo e imposto por Ele como lei universal no dia da sua Ascensão: Todo poder me foi dado no céu e na terra, dirá o Senhor; ide, pois, ensinai a todos os povos, batizando-os em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo (Mt 28, 18-19).

O dia em que fomos batizados foi o mais importante da nossa vida, pois nele recebemos a fé e a graça. Antes de recebermos o batismo, todos nós nos encontrávamos com a porta do Céu fechada e sem nenhuma possibilidade de dar o menor fruto sobrenatural.

Devemos agradecer a Deus a Graça do Batismo. Agradecer que nos tenha purificado a alma da mancha do pecado original, bem como de qualquer outro pecado que tivéssemos naquele momento. A água batismal significa e atualiza de um modo real o que é evocado pela água natural: a limpeza e a purificação de toda a mancha e impureza.

“Graças ao sacramento do Batismo tu te converteste em templo do Espírito Santo: não te passe pela cabeça – exorta São Leão Magno – afugentar com as tuas más ações um hóspede tão nobre, nem voltar a submeter-te à servidão do demônio, porque o teu preço é o sangue de Cristo.”

Na Igreja, ninguém é um cristão isolado. A partir do Batismo, o cristão passa a fazer parte de um povo, e a Igreja apresenta-se como a verdadeira família dos filhos de Deus. O batismo é a porta por onde se entra na Igreja.

“E na Igreja, precisamente pelo Batismo, somo todos chamados à santidade” (LG 11 e 42), cada um no seu próprio estado e condição. A chamada à santidade e a conseqüente exigência de santificação pessoal são universais: todos, sacerdotes e leigos, estamos chamados à santidade; e todos recebemos, com o batismo as primícias dessa vida espiritual que, por sua própria natureza, tende à plenitude. É importante lembrar o caráter sacramental do Batismo “um certo sinal espiritual e indelével” impresso na alma no momento (Dz, 852). É como um selo que exprime o domínio de Cristo sobre a alma do batizado. Cristo tomou posse da nossa alma no momento em que fomos batizados. Ele nos resgatou do pecado com a sua Paixão e Morte.

Com estas considerações é fácil compreender porque é de desejar que as crianças recebam logo o batismo. Desde cedo a Igreja pediu aos pais que batizassem os seus filhos quanto antes. É uma demonstração prática de fé. Não é um atentado contra a liberdade da criança, da mesma forma que não foi uma ofensa dar-lhe a vida natural, nem alimentá-la, limpá-la, curá-la, quando ela própria não podia pedir esses bens. Pelo contrário, a criança tem direito a receber essa graça. No Batismo está em jogo um bem infinitamente maior do que qualquer outro: a graça e a fé; talvez a salvação eterna. Só por ignorância e por uma fé adormecida se pode explicar que muitas crianças sejam privadas pelos seus próprios pais, já cristãos, do maior dom da sua vida.

“Enquanto batizado, o homem deve sentir-se enviado pela Igreja a todos os campos de atividade que constituem sua vocação e missão, para dar testemunho como discípulo e missionário de Jesus Cristo…” (nº 460 do Doc. de Aparecida).

Comentários aos textos bíblicos

Textos: Is 42,1-4.6-7; At 10,34-38; Lc 3,15-16.21-22

Neste domingo, depois da solenidade da Epifania, celebramos a festa do Batismo do Senhor, que conclui o tempo litúrgico do Natal.  É uma oportunidade propícia para que todos os cristãos redescubram a alegria e a beleza do seu Batismo que, vivido com fé, é uma realidade sempre atual: renova em nós a imagem do homem novo, na santidade dos pensamentos e das ações.

A liturgia da Palavra nos apresenta para esta celebração um texto evangélico que nos faz voltar o olhar para Jesus com a idade de trinta anos, fazendo-se batizar por João no rio Jordão. João Batista tinha o costume de administrar um batismo de penitência e utilizava o símbolo da água para expressar a purificação do coração e da vida.  Ele era chamado de João, o “Batista”, ou seja, o que batizava, e pregava este batismo a Israel, para preparar a eminente vinda do Messias. Dizia a todos que depois dele viria outro, maior que ele, que não batizaria com água, mas com o Espírito Santo (cf. Mc 1,7-8).

Jesus se une àquela multidão e se direciona ao encontro de João, para ser batizado por ele, embora não necessitasse deste símbolo de purificação.  Jesus quis ser batizado porque ainda não se manifestara como o Messias.  Não convinha, pois, que fosse diferente dos outros.  Jesus faz-se batizar não por necessidade, mas para dar um grande exemplo de humildade.

No momento do batismo de Jesus, o Espírito Santo desce sobre ele em forma de pomba, de maneira visível.  E uma grande luz brilha no céu, como se o céu se abrisse. A pomba era o símbolo da paz, do amor puro, da inocência e da simplicidade (cf. Ct 2,14).  O Espírito Santo ilumina os corações, transmite a luz divina, restaura a paz.  Nos relata o evangelista São Lucas: “O céu se abriu e o Espírito Santo desceu” (Lc 3,21-22). E todos puderam ouvir as palavras: “Tu és o Meu Filho muito amado; em Ti eu ponho toda a minha complacência ” (v. 22).  O Pai, o Filho e o Espírito Santo descem e temos a própria voz do Pai a indicar a presença de Jesus Cristo, seu Filho unigênito, no mundo.

A cena do batismo de Jesus, de algum modo acontece no batismo de cada catecúmeno.  Não se vê o céu se abrir, mas a nossa fé nos garante que o Pai do céu está dizendo: “Este é o meu filho querido”.  Como de fato, no dia do nosso batismo a voz do Pai nos chamou para sermos seus filhos em Cristo e sermos membros da Igreja, local onde iremos encontrar os meios necessários para o desenvolvimento do dom sublime da fé. E a Igreja, desde Pentecostes, vem celebrando o Sacramento do Batismo. Em sua pregação, São Pedro já dizia: “Convertei-vos e peça cada um de vós o Batismo…  Recebereis o dom do Espírito Santo” (At 2,38).  Jesus, no dia do seu batismo recebeu o Espírito, como nós o recebemos. Muito embora, o Espírito Santo já habitasse nele, em plenitude, desde o instante da sua concepção divina.

É o Espírito Santo que nos impulsiona a viver a vida nova conferida pelo Batismo.  A água derramada sobre a cabeça de cada batizado não significa apenas ablução, purificação, significa vida, e vida nova, mas é também um “renascer”, um nascer de novo: “Quem não renascer pela água e pelo Espírito Santo, não pode entrar no Reino de Deus” (Jo 3,5).

É importante lembrarmos as palavras pronunciadas por João Batista no Evangelho: “Eu vos batizo com água, mas vai chegar alguém mais forte do que eu… Ele há de vos batizar no Espírito Santo e no fogo” (Lc 3,16). E podemos perguntar o significado deste fogo a que João Batista se refere. Antes, devemos lembrar que o Batismo administrado por João era um ato de penitência, com a finalidade de pedir perdão pelos pecados e a possibilidade de começar uma nova existência. No Batismo instituído por Cristo é o próprio Deus que age, é Jesus que age através do Espírito Santo. Neste Batismo está presente o fogo do Espírito Santo. É Deus que age em nós, para sermos seus filhos.

Pelo batismo, com o derramamento da água sobre as nossas cabeças fomos assinalados em nome do Pai e do Filho e do Espírito Santo, fomos mergulhados nesta “fonte” de vida que é o próprio Deus e que nos constituiu seus verdadeiros filhos.  A água é o elemento da fecundidade. Sem água não há vida. E assim, em todas as grandes religiões a água é vista como símbolo da purificação, da fecundidade, símbolo da vida.

Na cena evangélica está presente uma eloquente manifestação da Santíssima Trindade: O Pai do Céu que fala das nuvens entreabertas; o Espírito Santo em forma de pomba; e o Filho unigênito, saindo das águas do rio Jordão.  Esta é uma viva referência ao batismo cristão, que é ministrado, segundo a ordem de Jesus, em nome do Pai, e do Filho, e do Espírito Santo”.

O Catecismo da Igreja Católica nos ensina que o Batismo é o fundamento de toda a vida cristã, o pórtico da vida no Espírito e a porta que dá acesso aos outros sacramentos. Pelo Batismo somos libertos do pecado e regenerados como filhos de Deus: tornamo-nos membros de Cristo e somos incorporados na Igreja e tornados participantes na sua missão (cf. CIgC 1213).  Quando recebemos o Batismo, todos os pecados são perdoados: o pecado original e todos os pecados pessoais, bem como todas as penas do pecado.  Com efeito, naqueles que foram regenerados, não resta nada que os impeça de entrar no Reino de Deus.  Porém, certas consequências temporais do pecado permanecem, tais como os sofrimentos, a doença, a morte ou as fragilidades inerentes à vida, como as fraquezas do caráter (cf. CIgC, n. 1264).

O Batismo também aparece sempre ligado à fé (cf. At 16,31-33). Segundo o apóstolo São Paulo, pelo Batismo o crente comunga na morte de Cristo; é sepultado e ressuscita com Ele (cf. Rm 6,3-4). E, em nossos dias, a fé é um dom que se deve redescobrir, cultivar e testemunhar.

Somos incorporados a Cristo pelo Batismo e com este sacramento o cristão recebe um sinal espiritual indelével da sua pertença a Cristo. É um sacramento que imprime caráter, ou seja, uma marca que nunca apaga, nem mesmo mediante o pecado, embora esta fragilidade possa impedir o Batismo de produzir os frutos de salvação.  Assim, todo o organismo da vida sobrenatural do cristão tem a sua raiz no santo Batismo.

Com esta festa em que recordamos o Batismo do Senhor, peçamos a Ele que nos conceda a graça de viver a beleza e a alegria de sermos bons cristãos e que aprendamos a conhecê-lo e a amá-lo com todas as forças e a servi-lo fielmente e sendo portadores de uma vida cristã coerente.

Peçamos também a Virgem de Nazaré, a filha predileta do Senhor, para que nós, já revestidos com a veste branca do batismo, sinal da nova dignidade de filhos de Deus, durante toda a nossa vida, sejamos discípulos fiéis de Cristo e corajosas testemunhas do Evangelho. Assim seja.

Para Refletir

A Festa de hoje encerra o sagrado tempo do Natal: o Pai apresenta, manifesta a Israel o Salvador que ele nos deu, o Menino que nasceu para nós: “Tu és o meu Filho amado; em ti ponho o meu bem-querer”, ou, segundo a versão de Mateus: “Este é o meu Filho amado, em quem me comprazo!” (3,17).

Estas palavras contêm um significado muito profundo: o Pai apresenta Jesus usando as palavras do profeta Isaías, que ouvimos na primeira leitura da missa. Mas, note-se: Jesus não é somente o Servo; ele é o Filho, o Filho amado! O Servo que o Antigo Testamento anunciava é também o Filho amado eternamente! No entanto, é Filho que sofrerá como o Servo, que deverá exercer sua missão de modo humilde e doloroso!

Hoje, às margens do Jordão, Jesus foi ungido com o Espírito Santo como o Messias, o Cristo, aquele que as Escrituras prometiam e Israel esperava. Agora, ele pode começar publicamente a missão de anunciar e inaugurar o Reino de Deus. Esta missão, ele começou desde que se fez homem por nós; agora, no entanto, vai manifestar-se publicamente, primeiro a Israel e, após a ressurreição, a toda a humanidade. É na força do Espírito Santo que ele pregará, fará seus milagres, expulsará Satanás e inaugurará o Reino; é na força do Espírito que ele viverá uma vida de total e amorosa obediência ao Pai e doação aos irmãos até a morte e morte de cruz.

Mas, atenção: como já dissemos, esse Jesus que é o Filho, é também o Servo sofredor, anunciado por Isaías. Hoje, o Pai revela a Jesus qual o modo, qual o caminho que ele deve seguir para ser o Messias como Deus quer: na pobreza, na humildade, no despojamento, no serviço! É assim que o Reino de Deus será anunciado no mundo. Jesus deverá ser manso: “Ele não clama nem levanta a voz, nem se faz ouvir pelas ruas”. Deve ser cheio de misericórdia para com os pecadores, os fracos, os pobres, os sem esperança: “Não quebra a cana rachada nem apaga um pavio que ainda fumega”. Ele irá sofrer, ser tentado ao desânimo, mas colocará no seu Deus e Pai toda a sua esperança, toda a sua confiança: “Não esmorecerá nem se deixará abater, enquanto não estabelecer a justiça na terra”. O Senhor Deus estará sempre com ele e ele veio não somente para Israel, mas para todas as nações da terra: “Eu, o Senhor, te chamei para a justiça e te tomei pela mão; eu te formei e te constituí como aliança do povo, luz das nações, para abrires os olhos aos cegos, tirar os cativos da prisão, livrar do cárcere os que vivem nas trevas”.

E Jesus já começa cumprindo sua missão na humildade: ele entra na fila dos pecadores, para ser batizado por João. Ele, que não tinha pecado, assume os nossos pecados, faz-se solidário conosco; ele, o Cordeiro de Deus que tira os pecados do mundo! “João tentava dissuadi-lo, dizendo: ‘Eu é que tenho necessidade de ser batizado por ti e tu vens a mim?’ Jesus, porém, respondeu-lhe: ‘Deixa estar, pois assim nos convém cumprir toda a justiça’” (Mt 3,14s). Assim convinha, no plano do Pai, que Jesus se humilhasse, se fizesse Servo e assumisse os nossos pecados! Ele veio não na glória, mas na humildade, não na força, mas na fraqueza, não para impor, mas para propor, não para ser servido, mas para servir. Eis o caminho que o Pai indica a Jesus, eis o caminho que Jesus escolhe livremente em obediência ao Pai, eis o caminho dos cristãos, e não há outro!

Uma última observação, muito importante: João diz: “Eu vos batizo com água, mas virá aquele que é mais forte do que eu. Ele vos batizará no Espírito Santo e no fogo”. O batismo de João não é o sacramento do Batismo: era somente um sinal exterior de que alguém se reconhecia pecador e queria preparar-se para receber o Messias. Ao ser batizado no Jordão, Jesus é ungido com o Espírito Santo para a missão. Esta unção será plena na ressurreição, quando o Pai derramará sobre ele o Espírito como vida da sua vida. Então – e só então – ele, pleno do Espírito Santo que o ressuscitou, derramará este Espírito, que será também seu Espírito, sobre nós, dando-nos uma nova vida! Para os cristãos, não há batismo nas águas, mas somente Batismo no Espírito, simbolizado pela água (cf. Jo 3,5; 7,37-39). Ao sermos batizados, recebemos o Espírito Santo de Jesus e, por isso, somos participantes de sua missão de viver, testemunhar e anunciar o Reino de Deus, a Vida eterna, a Vida no amor a Deus e aos irmãos, que Jesus veio anunciar ao se fazer homem igual a nós! Mas este testemunho não é festivo, não é de oba-oba, mas um testemunho dado na simplicidade, na pobreza e na humildade do dia a dia!

Eis! O Menino que nasceu para nós, a Criança admirável que cresceu em sabedoria, idade e graça, submisso aos seus pais na família de Nazaré, o Deus perfeito, filho da Toda Santa Mãe de Deus, Aquele que com o brilho de sua Estrela atraiu a si todos os povos, hoje é apresentado pelo Pai: ele é o Filho querido, ele é o Servo sofredor, ele é o Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo, ele é o Messias, o Ungido de Deus! Acolhamo-lo na nossa existência e no nosso coração e nossa vida terá um novo sentido. Seguindo-o, chegaremos ao coração do Pai que o enviou e é Deus com ele e o Espírito Santo pelos séculos dos séculos. Amém.
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No Brasil a festa do Batismo do Senhor é celebrada no domingo entre 9 e 13 de janeiro. Quando a solenidade da Epifania ocorrer no Domingo 7 ou 8 de janeiro, a festa do Batismo do Senhor é celebrada na segunda-feira seguinte.

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